Santo Antônio Além do Carmo: comerciantes viram alvo de golpe de supostos traficantes

Criminosos tentam extorquir empresários alegando que integram facções

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Publicado em 25 de abril de 2024 às 05:00

Santo Antônio Além do Carmo na mira dos crimnosos
Santo Antônio Além do Carmo na mira dos criminosos Crédito: Marina Silva/ CORREIO

Atender uma ligação no Santo Antônio Além do Carmo pode dar o pontapé inicial para minutos de pavor para comerciantes do bairro. Por lá, empresários viraram alvos de um golpe aplicado por pessoas que se passam por traficantes. Através de ligações, os criminosos afirmam que estabelecimentos do bairro, assim como ocorre em Cosme de Farias e no Engenho Velho da Federação - onde há de fato cobrança de pedágio por facções -, precisam pagar por uma ‘taxa de proteção’ para traficantes. No caso específico do Carmo, porém, a investida não passa de um blefe. 

Nas ligações, os criminosos não identificam a facção da qual fazem parte, mas garantem que são líderes do tráfico na área, como conta um comerciante que terá a identidade preservada. “Ele fala que quer um valor de R$ 2 mil porque estão fazendo rota [segurança] para nada acontecer com o restaurante. Diz que é Gordo, um traficante da ‘comunidade’ do Santo Antônio Além do Carmo. Eu nunca me pronuncio como sócio ou dono, sempre como funcionário e retorno a dizer a ele que, no momento, o dono não está e eu não tenho como te ajudar”, conta.

Nesse restaurante em específico, as ligações dos ‘falsos traficantes’ começaram a acontecer há três meses. “[Acontece] três vezes no mês, isso tem ocorrido desde janeiro. Como eu vejo muito, fico muito atento sobre isso de ligações e dessa cobrança toda, eu não levo a sério porque eu sei que ali do Santo Antônio eu nunca ouvi falar nisso” completa o comerciante, explicando que, em todas as ligações, enrola os criminosos até que desistam e desliguem o telefone.

Procurada para informar se tem ciência do golpe e investiga o caso, a Polícia Civil da Bahia (PC-BA) respondeu que não localizou registro do tipo. Uma fonte da polícia, que prefere não se identificar, confirma a hipótese do comerciante. “Não há cobrança de taxa nenhuma no Santo Antônio Além do Carmo. No bairro, não há nem uma presença robusta de facção. Nem nas ruas escondidas, por exemplo, há inscrições em referência a qualquer grupo”, garante a fonte.

Mesmo assim, os golpistas tentaram extorquir mais empresários, como um comerciante antigo do bairro que recebe as ligações há meses. Ele, inclusive, tem medo de que o caso não se trate apenas de um golpe. “Quando me ligam, eu sempre desligo na cara deles por pavor mesmo. Começou há dois meses mais ou menos e ligaram aqui três vezes. Eles não chegam a identificar a qual facção pertencem, mas não acho que seja golpe ou alguém brincando porque sabiam tudo do meu local e eu já vi ações do tráfico aqui, mesmo que não tenha aparecido”, fala ele, sem entrar em detalhes.

Um outro comerciante diz que nunca chegou a ser vítima, mas ouviu de colegas o mesmo relato. “Já ouvi de colegas que têm estabelecimentos na região e passaram pelo problema. Um deles recebeu a cobrança da taxa por Whatsapp, através de mensagens. Ele me mostrou o conteúdo e eles afirmam que têm o ‘controle das áreas’, que vão passar a fazer uma cobrança de taxa de proteção e quem não pagar vai acabar tendo problemas”, relata.

Walter Capanema, professor de Direito Digital, afirma que o crime descrito pelos comerciantes é uma prática de extorsão comum. “Os golpistas se passam por membros de organizações criminosas e exigem dinheiro das vítimas sob ameaças de violência ou danos. Este tipo de golpe tem sido particularmente comum, com registros de ser orquestrado inclusive por criminosos dentro de presídios. Os criminosos contatam as vitimas por aplicativos de mensagem e exigem pagamentos por meio de PIX”, explica.

Os comerciantes ouvidos pela reportagem afirmam que os valores exigidos pelos golpistas nas ligações variam entre R$ 500 e R$ 2 mil. A maioria, entretanto, não fez qualquer tipo de transferência aos golpistas.