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Millena Marques
Publicado em 18 de abril de 2025 às 05:40
Abster-se de carne vermelha na Semana Santa, data litúrgica do calendário cristão católico, é uma das tradições mais antigas dos fiéis. A prática possui origem bíblica e pode ser encontrada em diversos versículos, como em Mateus 9:15. Bom, o jejum neste período tornou-se cultural até mesmo para aqueles que não vivem a fé católica. Mas tem muita gente que come carne, incluindo na Sexta-Feira da Paixão, que é o dia em que o jejum é orientado com maior rigor pela Igreja. >
Caso do jornalista Gabriel Oliveira, 28. Natural de Salvador, a moqueca é o prato principal no almoço da Sexta-Feira Santa na casa dele - embora os pais não sejam religiosos. No entanto, a janta do comunicador é um hambúrguer de carne bovina. "Eu sou ateu. Então, não tenho limitação", diz.>
Há quem sinta 'peso' na consciência, mesmo sem ser religioso, ao comer carne no dia em que a Igreja rememora a crucificação de Jesus. A estudante Luciana Ferreira, 23, foi criada em uma família católica. Todo ano, somente uma proteína estava nas refeições: o peixe. "Eu fui influenciada por meus pais. Quando era mais nova, não tinha jeito, tinha que comer peixe. Isso mudou depois que eu cresci", conta.>
Hoje, se tiver vontade, Luciana come carne vermelha, mas com um sentimento de culpa. "Eu sei que isso não faz mal algum, mas sabe quando o inconsciente fica martelando? Isso acontece comigo minutos depois de eu comer, mas passa", explica. Embora sinta uma inquietação, a estudante não se considera católica. "Eu sou teísta, mas ainda carrego traços de ensinamentos católicos", diz. >
Diferente de Luciano, Gabriel Oliveira vive tranquilo com as escolhas feitas durante o período. O jornalista, na verdade, aproveita o fluxo reduzido nas unidades de fast-food durante o período. "Eu acho delicioso porque o Méqui ainda fica sem fila. Só vantagens", afirma. >
Existe outro grupo que come carne vermelha na Sexta-Feira da Paixão: religiosos que não são católicos. "No contexto bíblico, não tem nada escrito, no Velho ou no Novo Testamento, que proíba a pessoa de comer carne vermelha, em especial neste período. Nós levamos a sério aquilo que a Bíblia ensina e o modelo apostólico lá do primeiro século", diz Israel Maia, porta-voz das Testemunhas de Jeová de Bahia e Sergipe.>
Maia diz, no entanto, que a prática é respeitada pelas Testemunhas de Jeová. "Nossa religião respeita. É o direito de cada um escolher o que vai comer nesta época. Nós não criticamos ninguém e tampouco nos interessamos em embates envolvendo o costume de comer peixe ou carne neste período", afirma. >
O jornalista Carlos Emanoel dos Santos, 33 anos, também é cristão, mas sem denominação específica. Ele conta que nunca fez jejum de carne, exceto quando almoçava na casa da avó, uma católica fervorosa. "Para ela, era um pecado. Mas como a gente nunca morou na casa dela, não tinha problema. Agora, na casa dela, antes de ela morar com a gente, era obrigatório o frango ou o peixe na Semana Santa", diz. >
Para os religiosos católicos, a Semana Santa é considerada a 'semana maior' da Quaresma, período de quarenta dias que antecedem à Páscoa do Senhor e é reservado para oração, penitência e caridade. Neste período, muitas pessoas realizam sacrifícios por meio das abstinências, como é orientado pela Igreja. Na verdade, estas penitências começam, geralmente, na Quarta-Feira de Cinzas, primeiro dia da Quaresma.>
Este é um período experienciado por algumas igrejas cristãs, como a Católica e a Ortodoxa. “Na verdade, as penitências são recomendadas sempre. A igreja orienta uma penitência que é uma forma de se reconciliar com Deus”, explica frei Lorrane Clementino, frade franciscano da Ordem dos Frades Menores (OFM).“Durante a Quaresma, a Igreja sempre recomenda fazer jejum, fazer penitências, a caridade, sobretudo. Então, é utilizar desse tempo para praticar a reconciliação com Deus”, continua.>
As penitências variam entre abstinência de carne vermelha, alimentos que são consumidos com certa frequência na rotina, como café e chocolate, e, até mesmo, a ausência de redes sociais. O jejum de carne é uma prática desde os primórdios da Igreja Católica. "É uma forma de respeito a Morte de Jesus e moderação dos instintos", finaliza.>