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Carol Neves
Agência Einstein
Publicado em 15 de outubro de 2025 às 07:21
A catalã Maria Branyas, que morreu em 2024 aos 117 anos, foi reconhecida como a pessoa mais idosa do planeta. Um de seus últimos desejos foi ser estudada pela equipe médica que a acompanhava. A vontade virou realidade: seu DNA e microbiota se tornaram objeto de um estudo internacional que busca entender os segredos da chamada “superlongevidade”. >
Os resultados, divulgados em setembro na revista Cell Reports Medicine, revelaram que o corpo de Branyas parecia até 20 anos mais jovem do que sua idade real. “Em nosso estudo, descobrimos que a supercentenária apresentava uma idade biológica geral que era até 20 anos mais jovem do que sua idade cronológica”, contou à Agência Einstein o pesquisador Eloy Santos, do Instituto Josep Carreras, responsável pela investigação.>
A catalã Maria Branyas viveu até os 117 anos
Ao analisar suas células, a equipe notou um contraste curioso: o genoma mostrava sinais típicos do envelhecimento avançado, como o desgaste dos telômeros, mas também características de um organismo muito mais jovem, com sistema imunológico ativo e eficiente. Segundo Santos, essa combinação pode ter origem em variantes genéticas específicas da população europeia que ofereceriam proteção contra doenças relacionadas à idade, como as cardiovasculares e neurodegenerativas.
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Outro achado relevante veio do intestino. A microbiota de Maria era rica em bifidobactérias, microrganismos associados à baixa inflamação e à prevenção do crescimento de bactérias nocivas. Os cientistas acreditam que isso pode estar ligado ao consumo frequente de iogurte, hábito que ela manteve por toda a vida.>
Branyas nasceu em 1907, na Catalunha, e teve uma vida ativa: foi dona de casa, enfermeira e costureira. Viveu sozinha até os 94 anos e, mesmo após mudar para uma casa de repouso, continuou tocando piano até os 112. Teve três filhos, dois deles ainda vivos, com 92 e 94 anos, outro sinal de que a longevidade talvez corresse na família.>
A geriatra Daniela Lima de Souza Galati, do Hospital Israelita Albert Einstein, explica que o envelhecimento mais lento é resultado tanto da genética quanto do estilo de vida. “Não existe um único gene que nos leve a envelhecer ou que desacelere o processo. Há um conjunto de processos do DNA que são impactados e, como resultado, uma pessoa pode ter maior ou menor propensão a uma vida mais longeva. Mas os genes sozinhos não fazem o trabalho”, diz.>
Ela reforça a importância da epigenética - ou seja, de como os hábitos influenciam a expressão dos genes. Fatores como alimentação, sono e exposição a toxinas podem acelerar ou retardar o envelhecimento. “Como geriatra, meu principal conselho é para que as pessoas busquem viver e envelhecer bem. É claro que ninguém terá uma alimentação controlada todo o tempo ou vai viver sem estresse, mas buscar o equilíbrio, focando em ter mais anos úteis de vida no futuro, é fundamental”, afirma.>
Para os especialistas, estudos como o de Maria Branyas ajudam a reforçar o conceito de healthspan, o período de vida em que o indivíduo mantém boa saúde. “Não foi o caso da paciente, mas se ela tivesse vivido 117 anos sendo que, desses, mais de 20 fossem acamada e com demências, não estaríamos tão entusiasmados em entender seu envelhecimento como estamos agora”, observa Galati.>
Apesar de o estudo se basear em uma única pessoa, os pesquisadores acreditam que ele abre caminho para identificar novos marcadores do envelhecimento. “Temos a esperança de um dia poder usar o que aprendemos neste estudo para prever a proteção de uma pessoa contra uma doença ou sua predisposição à longevidade prolongada”, conclui Eloy Santos. “Mas isso vai depender de pesquisas mais amplas, com muitos genomas analisados ao longo do tempo.”>