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Carol Neves
Publicado em 5 de novembro de 2025 às 06:01
Mais de quatro séculos separam a prisão de Guy Fawkes - capturado em 5 de novembro de 1605 - da popularização de sua máscara como emblema global de resistência. A figura do conspirador inglês ganhou nova vida com o filme *V de Vingança*, dirigido pelas irmãs Wachowski e inspirado nos quadrinhos de Alan Moore. >
O longa transformou o rosto estilizado de Fawkes, até então símbolo de traição, em representação de luta contra governos autoritários. A imagem foi adotada por protestos no mundo todo, especialmente após 2008, quando o grupo Anonymous, surgido no fórum 4Chan, a usou em manifestações contra a Igreja da Cientologia.>
Guy Fawkes
O homem por trás da máscara >
Nascido em abril de 1570, em York, Fawkes foi descrito por seu amigo de escola Oswald Tesimond como “agradável e alegre, averso a brigas e conflitos e leal aos amigos”. O mesmo Tesimond afirmou que ele era “um homem altamente qualificado em matéria de guerra”. >
Apesar de vir de uma família anglicana, Fawkes teve contato desde cedo com o catolicismo, fé de seus avós maternos e de seu padrasto, Dionis Baynbrigge. Convertido, ele passou a sonhar com a restauração da religião católica na Inglaterra, dominada então pelo protestantismo do rei James I.>
O soldado que virou conspirador >
Aos 21 anos, depois de vender suas propriedades, Fawkes partiu para lutar pela Espanha católica na Guerra dos Oitenta Anos, conflito contra a Holanda protestante, o que já configurava traição ao seu próprio país. Em 1603, os espanhóis chegaram a recomendá-lo como comandante, e ele tentou convencer o rei Felipe III a apoiar uma rebelião inglesa. A resposta foi negativa, já que a Espanha buscava paz com a Inglaterra. >
Durante a guerra, Fawkes conheceu Thomas Wintour, com quem se uniria à famosa Conspiração da Pólvora.>
O plano que quase destruiu Londres >
Em julho de 1605, sob liderança de Robert Catesby, um grupo de católicos perseguidos planejou explodir o Parlamento britânico. Eles esconderam 36 barris de pólvora - cerca de 2,5 toneladas - nos porões do Palácio de Westminster. >
Um estudo da Universidade do País de Gales, feito no início dos anos 2000, mostrou que essa carga teria destruído tudo num raio de 490 metros, reduzindo o centro de Londres a ruínas. O ataque estava marcado para 5 de novembro, data em que o rei e o Parlamento se reuniriam. >
Mas o adiamento da sessão por causa de um surto de peste bubônica deu tempo para o plano ser descoberto. Na madrugada do mesmo dia, Fawkes foi capturado enquanto vigiava os explosivos. Sob tortura, revelou os nomes dos conspiradores. Meses depois, oito deles foram executados - incluindo Fawkes, transformado em bode expiatório e lembrado, assim como Tiradentes no Brasil, como o rosto de uma rebelião fracassada.>
De terrorista a símbolo da liberdade >
A trajetória de Fawkes, um católico que tentou reinstaurar sua fé pela força, parece destoar do ideal libertário que sua imagem representa hoje. Alan Moore, autor de *V de Vingança*, refletiu sobre essa contradição: “Quando os pais explicavam aos filhos a respeito de Guy Fawkes e sua tentativa de explodir o Parlamento, sempre havia certo tom de admiração em suas vozes.”>
No início dos anos 1980, durante as revoltas anti-Thatcher e uma preocupante subida da ultradireita do National Front, o status de Guy Fawkes como um potencial revolucionário parecia estranhamente confirmado.>
De vilão histórico a símbolo moderno de resistência, a figura de Guy Fawkes sobrevive como lembrança de que o poder das ideias - e das máscaras - pode atravessar séculos. >