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Vinicius Nascimento
Publicado em 25 de julho de 2022 às 05:30
- Atualizado há 2 anos
O dia de hoje, 25 de Julho, é tão ou mais importante para mulheres negras do que o 8 de Março, quando é comemorado o Dia Internacional da Mulher. Isso porque há 30 anos, mulheres negras de todo o Caribe e América Latina se reuniram na República Dominicana para discutir suas agendas, pautas, trocar informações sobre suas próprias vivências e pensar em ações de combate ao racismo e machismo que atravessam suas vidas.>
Várias mulheres baianas estavam presentes naquela mobilização que aconteceu há exatas 3 décadas. Casos de Valdecir Nascimento, Cristina Rodrigues, Cátia Melo e Dora Dias. Criadora do Instituto Odara, Valdecir Nascimento coordena a Rede de Mulheres que nasceu ali. Há 10 anos, o Instituto organiza o Julho das Pretas, que, nesta edição, conta com 427 atividades realizadas por mais de 200 organizações de mulheres negras em 18 estados brasileiros, além de uma atividade em Paris.>
Coordenadora do programa de Comunicação do Instituto, Alane Reis explica que a data é importante para mulheres negras, mais até do que o 8 de Julho, por lhes dar protagonismo. Nessa oportunidade, elas se unem para denunciar as condições do racismo, violência e machismo que atravessam suas vidas. Além disso, também é um momento de celebração própria, valorização de suas origens e atividades.>
"Esse encontro aconteceu em 1992 porque estavam fazendo 500 anos de invasão do continente pelos colonizadores europeus, o que demarca o início do genocídio, exploração e escravização de povos nativos, indígenas e originários do continente americano, além da escravização, tráfico e exploração dos povos africanos e seus descendentes. A República Dominicana foi o primeiro país da América a ser invadido por colonizadores e por isso foi eleito para sediar o evento", explica Alane. Dayse Sacramento, pesquisadora criou Os Diálogos Insubmissos das Mulheres Negras (Foto: Luma Femiani/Divulgação) Coordenadora executiva do Odara, Naiara Leite afirma que os movimentos feministas, de mulheres como um todo, não dão conta de falar especificamente das vivências e experiências das mulheres negras. "Falar de mulheres no 8 de Março não dá conta da representação política e da grande agenda e vozes de mulheres negras no Brasil. Existe no 25 de julho um debate importante em torno da centralidade de pensar mulheres a partir do combate ao racismo. O racismo é uma violência que afeta a vida de mulheres negras e essa data tem um papel que atravessa um debate sobre apenas ser mulher", detalha Naiara.>
Na esteira desse encontro, em 2013, o Instituto Odara criou o Julho das Pretas para ampliar as possibilidades de atividades relacionadas ao Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. >
A ideia do Julho das Pretas é unificar uma agenda comum entre diversas organizações e grupos de mulheres negras para fortalecê-los. No primeiro ano, foram 17 atividades na Bahia, que foram crescendo. Nesta, que é a 10ª edição e marca o retorno às atividades presenciais, foram 425 atividades confirmadas em 18 estados.>
"Ao longo dessas 10 edições, as atividades, sempre diversas que dialogam com o contexto que a Bahia, Brasil e Nordeste vivem, e implicam a vida de mulheres negras de um modo geral. Nessa perspectiva, a gente faz ocupações, seminários, debates, música, poesia, ocupações que, de maneira organizada, chamam atenção para a vida de mulheres negras e os desafios de direitos humanos vivos", explicou Naiara.>
A maior dessas atividades é a Marcha das Mulheres Negras. Em Salvador, a manifestação começa na Praça da Piedade e sai em direção ao Pelourinho, onde um festival de atividades culturais acontece até o final da noite desta segunda-feira (25).>
Professora, socióloga e ativista, Vilma Reis explica que o tema do 25 de Julho no Brasil em 2022 é muito caro por destacar a importância da tomada de espaços de poder por mulheres negras. "Este é um ano emblemático, é um ano em que a gente faz um balanço destes 30 anos, a gente olha pra América Latina e o Caribe e reposiciona a partir dessa nossa ação de incidência por ocupar os espaços de poder com a presença das mulheres negras, com a determinação da nossa agenda política de uma forma que evidencia que sem as mulheres negras o Brasil não vai", afirmou ao CORREIO.>
Segundo Vilma Reis, é necessário que a data fomente iniciativas que transformem a realidade dos parlamentos em todo o Brasil e a representação de mulheres negras nesses espaços seja ampliada: "Nosso esforço de ocupar os Parlamentos tem muito sentido sobre essa agenda e a nossa conexão e desdobramento da Marcha de Mulheres Negras contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver, realizada em 2015”, reforça.>
No Brasil, a data ainda homenageia a líder quilombola Tereza de Benguela, um símbolo do movimento negro. Ter esse tipo de marco é importante para mulheres de todas as idades: desde Valdecir Nascimento com seus mais de 40 anos de militância até novas gerações como Lis Dórea, de 5 anos, modelo mirim. Lis, de 5 anos, modelo mirim já aprende sobre o empoderamento das pretas desde pequenininha (Foto: Thiago Rosarii/Divulgação) Crescer conhecendo sua identidade e sem vergonha de ser uma menina negra, faz parte da luta e conquista das mulheres negras que vêm alcançando diversos espaços ao longo dos últimos anos.>
“Acredito que o empoderamento das meninas negras é de suma importância para o desenvolvimento de uma vida mais digna, sem preconceitos e por uma igualdade racial e de gênero”, afirma Zuleide, a mãe de Lis.>
Uma outra atividade cultural que já virou marco na esteira do Julho das Pretas é o Diálogos Insubmissos de Mulheres Negras, iniciativa da professora e pesquisadora Dayse Sacramento que que desde 2017 produz eventos literários de mulheres negras, com participação em feiras nacionais e internacionais, com o objetivo de promover debates e atividades que têm como mote a produção literária feminina negra, que dialogam com outras linguagens artísticas-culturais e políticas-sociais. >
A plataforma esteve presente em uma série de festivais literários do Brasil: FLIP - Festa Literária Internacional de Paraty; FLIPELÔ- Festa Literária Internacional do Pelourinho; FLIC - Feira Literária de Campina Grande; FLICA – Festa Literária Internacional de Cachoeira, FLIGÊ- Feira Literária de Mucugê, além de ter participado de atividades como o Fórum Social Mundial (2018); o Giro pela Vida – AVON (2019); e a Virada Sustentável Salvador (2019).>
Neste ano, a iniciativa realizou oficinas de escrita, lançou o livro Performances do Tempo Espiralar, da poeta Leda Maria Martins e realizou a Conferência Insubmissão e Insurgência da Memória de Mulheres Negras no Brasil, além de fazer uma campanha de arrecadação de absorventes para distribuir a mulheres em situação de pobreza menstrual.>