A ameaça do Natal: prometer o reino aos pobres

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  • Da Redação

Publicado em 20 de dezembro de 2021 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Mais uma vez estamos no período do ano em que todos os brasileiros, de qualquer religião ou de nenhuma delas, unem-se na vontade da bondade. Independente da fé e apesar dos que a distorcem, a mensagem do principal aniversariante de dezembro é de proteção aos oprimidos. O tema da festa, portanto, devia ser respeito, autonomia, liberdade, priorização e empoderamento. Chamo atenção de todos esses aspectos para evitar a confusão que resume um apelo tão forte à simples e esporádica caridade.

Estamos tratando de alguém que enfrentou os fariseus, foi acusado, preso, julgado e condenado à pena máxima, com trânsito em julgado. Certamente foi chamado de bandido e marginal. Os “cidadãos de bem” exigiram punição exemplar para ele. Ninguém enfrentaria os fariseus e tamanha repressão apenas por desejar que as pessoas fizessem uma ou outra doação no fim do ano. Os poderosos não se indignariam tanto só por alguém defender que os ricos dessem esmolas de vez em quando.

Esmolas são inofensivas. O que indigna o poder é o oprimido ter voz para dizer “não aceito”, “não me contento”. O que indigna o poder é que se mexa em opressões tão arraigadas que se transformam em tradições e são vistas como direitos pelos que oprimem. O que indigna o poder é a cidadania, é o combate à desigualdade, é a transformação social. A generosidade só incomoda quando possibilita libertação. Aí incomoda muito. Era assim no ano 1. É assim em 2021.

A verdadeira ameaça do Natal, aquilo que causa medo, está na promessa de que o reino será dos pobres. A reação ao medo é um festival de “quem ele pensa que é?”.  Quem esse pobre pensa que é para ir na justiça exigir saúde, educação ou alimentos? Quem essa mulher pensa que é para não aceitar obedecer ao marido? Quem esse negro pensa que é para querer estar nas universidades, ter sua religião e ter orgulho da sua cor? Quem esse homossexual pensa que é para querer amar e ter família? O amor ameaça...

Alguém imagina Jesus falando em “porrada nos vagabundos” ou defendendo tortura? Alguém imagina Jesus, tão preocupado com o próximo, andando por aí sem máscara durante uma pandemia de covid-19? Alguém imagina Jesus defendendo que os pobres devem ter serviços de qualidade inferior? Alguém imagina Jesus atacando terreiros de candomblé? Alguém imagina Jesus indiferente à fome?

Ninguém morreu para que fôssemos rezar. Jesus foi crucificado lutando para que os pobres tivessem seus direitos respeitados como direitos deles e não como favores ou benevolências dos outros. O verdadeiro espírito natalino está no combate à desigualdade e aos preconceitos, está na luta pelo amor, pela tolerância, pelo respeito. Então, é Natal... E o que você fez para transformar essa vontade de bondade em algo concreto e permanente?

Rafson Ximenes é defensor público geral da Bahia