A nova escola pós-pandemia: Conselho começa a montar o protocolo de retorno

Volta quando? Apesar de não ter data prevista para a reabertura das escolas, diretrizes como adoção de ciclos e turmas menores devem entrar no documento

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  • Priscila Natividade

Publicado em 13 de junho de 2020 às 06:59

- Atualizado há um ano

. Crédito: Imagem: Shutterstock

Maria Beatriz Furiatt, 15 anos, é aluna do 1º ano do Ensino Médio de uma escola da rede pública, localizada no subúrbio de Salvador. Na sala de Bia, são 32 alunos. Sua avó é diabética, a mãe é hipertensa e o irmão, recém-nascido. “Bia não volta mais para a escola este ano. Falei que se ela voltasse, teria que usar máscara, proteção transparente, luva e passar álcool na carteira e ela disse que eu estava ficando louca. Se surgir uma vacina, possa ser que ela volte”, afirma Mariele Furiatt, mãe de Bia.  Mãe de Maria Beatriz, de 15 anos, Mariele Furiatt decidiu que a filha não volta mais para a escola este ano (Foto: Acervo pessoal) Após quase três meses sem aula, muitos pais compartilham do mesmo receio de Mariele e da dúvida sobre quando as escolas vão retornar. Apesar de não ter nenhuma previsão de data para a reabertura efetiva, o Conselho Estadual de Educação (CEE) iniciou a elaboração de um documento que irá direcionar como será o retorno das aulas presenciais em todas as instituições de ensino público e privado, instaladas na Bahia.

O protocolo deve ficar pronto até o final do mês de junho, como explica o líder do grupo que está organizando a resolução do CEE, Nildon Pitombo. “As variáveis epidemiológicas serão as definidoras das dinâmicas de retorno para orientar as redes e as escolas”, pontua.

Entre as principais medidas para o pós-pandemia previstas no documento estão as questões relacionadas à não-reprovação do estudante, adoção do ciclo 2020/ 2021, que poderá valer para a conclusão de duas séries no período do retorno às aulas presenciais até o final do ano que vem. Entra na minuta, a reorganização do calendário escolar com a definição dos conteúdos essenciais, a reorganização das salas em turmas menores, o escalonamento do fluxo de estudantes, mais a qualificação, do porteiro ao professor (veja abaixo). 

A Secretaria de Educação do Estado e Secretaria Municipal de Educação de Salvador confirmaram em nota a definição destes protocolos. “Estamos considerando o que o mundo está dizendo que dá para fazer. Não pode ter aglomeração sob nenhuma hipótese”, reforça Pitombo. 

Novo ‘normal Mesmo com o protocolo em fase de elaboração, as escolas particulares de Salvador já começaram a se planejar. No Colégio Marizia Maior, em Stella Maris, a direção investiu em uma higienização geral como as que são feitas em hospitais e adquiriu totens de álcool em gel. As turmas que antes eram formadas por 30 alunos passam a ter, no máximo, 15 estudantes por sala.   Diretor do colégio Marízia Maior, Carlos Maior, adquiriu totens de álcool em gel sem contato (Foto: Acervo pessoal) “Vamos capacitar todos os funcionários e elaborar um plano de assistência psicológica. Não é só cuidar do contágio via ouvido, boca e nariz, mas tem que olhar o lado emocional neste retorno”, diz o diretor  da instituição, Carlos Maior. 

O Colégio Antônio Vieira, no Garcia, criou um grupo de trabalho (GT) para tratar das adaptações que a escola precisa fazer. “O GT já deu passos concretos, como a contratação da consultoria do infectologista, Claudilson Bastos, que está nos assessorando na elaboração do protocolo de saúde e segurança”, adianta o diretor de Gestão de Pessoas do colégio, Sérgio Silveira.

Mudanças também estão acontecendo no Colégio Montessoriano, na Boca do Rio, que deve manter as aulas online por mais um mês, após a reabertura. “Além de todas as medidas de segurança sanitária estamos investindo em tecnologia de gravação para ofertar a transmissão online das aulas que acontecem em sala nesta retomada”, ressalta a diretora, Lúcia Matos.

Representante do coletivo que reúne 61 escolas, Wilson Abdon, do Grupo de Valorização pela Educação (GVE), chama a atenção para a elaboração de um protocolo viável, tanto para a rede pública como para a privada. “Não estávamos preparados para a pandemia. Agora estamos mais atentos e num movimento constante de mudanças” diz. 

Cautela Ainda que as escolas adotem estas medidas, o empresário Climério Júnior não está totalmente seguro de que a filha Geovanna, de 2 anos, vá retornar este ano. “A escola já até comentou algo sobre o protocolo de retorno, porém o nosso medo de contaminação é grande, principalmente pela a idade dela”.

A infecto pediatra do Departamento de Infectologia da Sociedade Baiana de Pediatria (Sobape), Anne Galastri, entende a preocupação do pai de Geovanna. A segurança sobre o retorno das aulas presenciais necessita de uma redução de casos, como defende a especialista. “Precisamos aguardar a circulação viral, porque nós não chegamos a uma regressão na curva das infecções”.

 Desafios Mas será que o sistema de educação está mesmo pronto para o retorno? A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) divulgou no último mês, uma nota informativa e um marco de ação e recomendação para reabertura das escolas. Entre os principais desafios estão o aumento do risco de abandono escolar e o agravamento das desigualdades.

Leia também: Aulas online na pandemia - veja por que a escola não vai ser mais a mesma

“As escolas brasileiras ainda não estão preparadas para o pós-pandemia. Com união, participação da comunidade e responsabilidade dos governos podemos oferecer uma educação com segurança e saúde”, avalia a coordenadora de Educação da Unesco no Brasil, Rebeca Otero. 

Para o coordenador de projetos da organização sem fins lucrativos Todos Pela Educação, Ivan Gontijo, não será um retorno comum. “As escolas não vão conseguir resolver isso sozinhas. Os alunos não estão voltando de férias, voltam com uma série de tensões visto que famílias perderam renda e entes queridos. O acolhimento emocional é essencial, assim como as questões de segurança sanitária e de aprendizagem”, acrescenta Gontijo.

PRINCIPAIS PONTOS DO DOCUMENTO

Adoção do ciclo 2020/ 2021 Nesse esquema, o estudante poderá concluir duas séries entre os meses que ainda restam de 2020 e o ano de 2021 com a junção das atividades pedagógicas. A medida vai servir também como alternativa para os alunos que não alcançaram a aprovação por conta da pandemia. Com o ciclo, o ano letivo não será perdido. 

Calendário escolar Com esse planejamento, o documento do CEE vai destacar ainda, a definição dos conteúdos essenciais, que não podem ficar de fora do currículo. 

Reorganização das salas em turmas menores e o escalonamento do fluxo São mais algumas medidas para evitar qualquer aglomeração nas escolas, que também precisarão rever, não só a quantidade de alunos em sala de aula, mas de áreas comuns e até mesmo da cantina. 

Qualificação de toda equipe escolar  É outra exigência que deve constar no protocolo. A qualificação sobre normas de segurança e higiene deve atender desde o professor até os funcionários operacionais, como o de serviços gerais e de portaria, por exemplo.  

EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS

Uruguai Na América Latina, somente o Uruguai retornou às aulas e desenvolveu um protocolo de aplicação para a reintegração dos estudantes aos centros educativos, com medidas de segurança, saúde e distanciamento social. 

Holanda,  Bélgica, Áustria, Alemanha e Dinamarca Países europeus também retomaram as aulas por fases e estão desenvolvendo protocolos específicos dependo da situação de cada país. No caso da França e da Bélgica, por exemplo, foram adotados o uso obrigatório de máscaras, higienização  das mãos e a distância  entre as carteiras escolares. 

China O país retornou as aulas por etapas, inicialmente, pelos alunos do nível médio. Em uma escola da capital chinesa, os alunos precisaram passar por uma tenda de desinfecção, com funcionários vestidos com roupas de proteção completas.