A violência como alternativa intragável

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  • Gabriel Galo

Publicado em 2 de junho de 2020 às 13:45

- Atualizado há um ano

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Este domingo que fechou o mês de maio do ano de 2020 deve representar uma virada definitiva no entrelace narrativo da política nacional. Chega-se, provavelmente, ao ponto inevitável da ruptura da possibilidade de entendimento, consequência alardeada há tempos e ignorada por muitos em nome de uma pretensa força das instituições.

Quando manifestantes pró e a favor de um governo per e controverso se chocaram, principalmente nas ruas de São Paulo e do Rio de Janeiro, viu-se o encontro de forças que não apenas não vão recuar, mas que ocupam as ruas, território primordial para controle das mensagens políticas, com sede de sangue.

A sucessão de crises agrava os ânimos. Aos impactos sanitário e econômico de uma pandemia agressiva e mortífera, adicionaram-se crises política, judiciária, civilizatória e estética. A patética cavalgadura galopante em dog whistles que flertam com regimes extremistas do começo do século XX desnorteia os sentidos. Estamos todos desorientados, conduzidos à cegueira. Na impossibilidade de visão qualquer, Saramago como testemunha, o caos é regra.

Enterrou-se o raciocínio. O diálogo travado, destruído no estampido do tiro de bala de borracha e das bombas de efeito moral, é resultado da construção incansável da guinada incivilizada. De uma gente que faz da grita sua tática única, porque são ausentes de profundidade. Abusam de frases feitas, vazias de sentido efetivo e que chamam a horda ignara para perto, que substituíram as palavras de compreensão que pincelam temas complexos, reduzindo o debate a um infame duelo de ofensas.

Quem tropeça na própria incompetência, arrumando inimigos constantes para justificar seus malfeitos, por fim, encontra o embate que sempre desejou. Obtém-se, assim, a materialização das ameaças que fazia, incitando a batalha inevitável. Acrescentar poder a ignorantes com iniciativa é a receita ideal para o colapso.

A coesão de um lado, debaixo do manto supremo do líder inconteste, é confrontada pela incoerência evidente natural de quem contra o braço da tirania. Mas enquanto o lado uniforme lida contra paranoias que só existem em suas mentes, como globalismo e o comunismo, levada a cabo pelas tais instituições, o outro tem um nome para apontar o dedo. Esta diferença é fundamental. Enquanto um opera no difuso, e com isso se esconde na neblina que democraticamente pede o fim da democracia, o outro tem alvo específico, alimentando a profecia autorrealizável do primeiro de se dizer e ser contra tudo e contra todos.

Não se discute mais projeto de país, de nação. A esta altura, buscar uma saída construtiva é desatar um nó enquanto os lados puxam o cabo de guerra, apertando-o ainda mais. Mesmo assim, faz-se urgente fortalecer as instituições. Faz-se urgente diminuir o volume do tom de voz, para restabelecer a racionalidade.

Mas quando se chega ao ponto em que talvez a única forma de empurrar o obscurantismo para o esgoto de onde nunca deveria ter saído é pela via intragável da violência, a batalha está perdida. Mas ainda não a guerra. E o desconforto vem pela incerteza: o quanto ainda veremos ruir a democracia? Quanto mais sangue será visto jorrar?

Gabriel Galo é escritor.