“Achei que ele estivesse encenando”, diz segurança que espancou homem no Carrefour

Grupo Carrefour anunciou hoje (4) fim da terceirização dos serviços de segurança

Publicado em 4 de dezembro de 2020 às 22:26

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Reprodução

Um dos seguranças que espancou João Alberto até a morte no supermercado Carrefour, na cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, em novembro, afirmou que pensava que ele fingia um desmaio pouco antes de falecer. A informação foi veiculada pelo Jornal Nacional, nesta sexta-feira (4), após o JN ter acesso a uma gravação de áudio do depoimento do segurança. 

Segundo a reportagem, Giovane Gaspar da Silva disse que não trabalhava para a empresa Vector. Afirmou que, no dia 19 de novembro, foi contratado por um colega para cobrir as folgas dele. A Vector informou que Giovane era contratado e que era o primeiro dia de trabalho dele para a empresa. No depoimento à polícia, Giovane disse que foi chamado por rádio para ir ver um problema em um caixa envolvendo um cliente e uma fiscal. “Eu simplesmente, quando cheguei, cheguei caminhando, tranquilo vi que ele estava encarando muito a fiscal”, contou.

Gaspar disse que João Alberto Silveira Freitas decidiu por conta própria sair da loja e que o acompanhou. Giovane afirmou que não houve provocação, de nenhum dos lados, antes que João Alberto desse um soco nele. Na sequência, Giovane e o segurança Magno Braz espancaram João Alberto. “A minha primeira reação foi tentar pegar ele. Em nenhum momento eu quis dar soco nele. Eu ia imobilizar ele e deu, sabe? Não tive outra opção naquele momento se não golpear, eu não tive opção”, continuou Giovane.

Depois de desferir socos e chutes em João Alberto, os dois seguranças o mantiveram no chão. Giovane afirmou que uma terceira pessoa participou das agressões. “Eu segurei as pernas dele e pedi para esse fiscal segurar o braço dele e imobilizar um braço dele direito. É o momento em que chega outra pessoa, que eu não sei quem é, não vi, só vi que estava de branco, chega outra pessoa e dá um chute nele”.

Giovane disse que, quando João Alberto gritava e pedia para que eles parassem, achou que era encenação. “Depois chegou um outro senhor que estava falando comigo, e ele falou: ‘Cara, eu acho que ele está morto’. Eu falei: ‘Bah, senhor, não faz isso’. Porque eu, sinceramente, naquele momento achei que ele estivesse encenando, fingindo um desatento meu para me pegar”.

Giovane disse que a fiscal Adriana Alves Dutra não deu nenhuma ordem para eles liberarem João. Em depoimento, Adriana afirmou que pediu para os seguranças pararem de bater no homem. 

A polícia aguarda os laudos de necropsia e o toxicológico para concluir o inquérito. A fase de depoimento já foi encerrada. Foram ouvidas 40 pessoas, entre testemunhas e investigados. 

Segundo a polícia, Giovane, Magno Braz e a fiscal Adriana Dutra vão responder por homicídio doloso. Uma das hipóteses é de preconceito racial. “Ainda estamos analisando as imagens, individualizando as condutas desde o início do fato até o final, com a morte de João Alberto, para verificarmos se, no conjunto probatório, conseguimos identificar a motivação racial”, disse Vanessa Pitrez, diretora do Departamento de Homicídios.

Giovane está preso e foi expulso da Brigada Militar porque estava de folga como PM temporário e participou das ações que culminaram com a morte de João Alberto. “Ele estava cobrindo a folga de outro colega, era o primeiro dia e ele já tinha decidido que não ia permanecer nessa função”, disse o advogado David Leal, que representa Giovane.

O Carrefour anunciou nesta sexta-feira (4) que não vai mais terceirizar a segurança e que empreendedores negros vão treinar o pessoal do setor, começando pelo Rio Grande do Sul. Os funcionários vão receber treinamento sobre práticas antirracistas e respeito aos direitos humanos. O Carrefour afirmou que vai considerar a representatividade de mulheres e de cidadãos negros na população brasileira ao contratar seguranças.

Veja a nota divulgada pela empresa:

“O processo de internalização começará pelos quatro hipermercados no Rio Grande do Sul, em um projeto piloto, incluindo a loja Passo D’Areia, em Porto Alegre. O novo modelo é o ponto inicial para transformação do seu modelo de segurança e faz parte dos compromissos anunciados pela rede. O processo de recrutamento e o treinamento dos profissionais para as lojas contará com associação que reúne empreendedores negros da região de Porto Alegre.

Todo o processo de internalização da segurança terá como foco a implementação de práticas antirracistas e de uma cultura de respeito aos direitos humanos, além de considerar a representatividade da população brasileira (50% de mulheres e 56% de negros) como um compromisso. A data de admissão dos novos colaboradores está prevista para o dia 14 de dezembro em todas as lojas Carrefour da região, seguindo as etapas de contratação”