Ações por não pagamento de tributos são 'vilãs' em congestionamento do TJ-BA

Com mais de 1 milhão de processos parados, 11 varas mais congestionadas são da Fazenda Pública

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  • Da Redação

Publicado em 13 de setembro de 2017 às 01:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Marina Silva/Arquivo CORREIO

As 11 unidades judiciárias de primeiro grau que mais possuem processos estocados do Tribunal de Justiça do Estado (TJ-BA) são varas da Fazenda Pública. Só elas somam 1.098.880 ações paradas, sendo maior parte de execuções fiscais. O TJ-BA possui 135 unidades judiciárias.

As execuções fiscais são cobranças judiciais de dívidas com tributos como IPTU (imóveis), IPVA (carros), ICMS (mercadorias), ISS (serviços) e multas que não foram pagas pelo cidadão ao Estado e, por conta disso, o débito foi inscrito no cadastro de dívida ativa. Foto: Marina Silva/Arquivo CORREIO As 11 varas campeãs de processos emperrados são: 1ª Vara da Fazenda Pública de Camaçari, com 185.760 processos (87% de taxa de congestionamento); 2ª Vara do Sistema dos Juizados Especiais da Fazenda (Salvador), somando 171.744 ações (99%); 1ª Vara do Sistema dos Juizados Especiais da Fazenda (Salvador), somando 158.703 ações (98%); 1ª Vara da Fazenda Pública de Feira de Santana, com 80.663 processos (95%); 1ª Vara da Fazenda Pública de Salvador, com 75.936 (90%); 9ª Vara da Fazenda Pública de Salvador, totalizando 74.594 (94%); 3ª Vara da Fazenda Pública de Salvador, com 73.988 (96%); 4ª Vara da Fazenda Pública de Salvador, com 73.335 processos (95%); 2ª Vara da Fazenda Pública de Salvador, com o total de 73.322 autos (90%); 10ª Vara da Fazenda Pública de Salvador, com 72.976 autos (92%); 13ª Vara da Fazenda Pública de Salvador, com 57.859 processos (97%). A Corte baiana é a maior em taxa de congestionamento do Brasil, com 83,9%, de acordo com o relatório Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). A taxa mede o percentual de casos que ficam sem solução no fim do ano, em relação aos processos que estão pendentes e os que foram solucionados. Do total de mais de 4 milhões de processos do TJ-BA, em 2016, 1.250.178 ações eram de execuções fiscais.

O TJ-BA é o terceiro tribunal com mais execuções fiscais pendentes, estando atrás da corte paulista, que possui 11.494.305 processos, e do TJ-RJ, com 6.390.552. A taxa de congestionamento das execuções fiscais da corte é de 91%, acima da média nacional de 90%. Mesmo com o número alto, sete tribunais estaduais têm congestionamento maior.

Justificativa O assessor chefe da Diretoria de Primeiro Grau do TJ-BA, João Felipe Menezes, explica que o número alto de execuções fiscais e de congestionamento nessa área ocorre em todo o país, e não só na Bahia. “O problema é que esse tipo de ação só pode ser finalizada após o pagamento da dívida ativa. Se não conseguimos achar o devedor para finalizar o processo através do pagamento, o processo fica paralisado e sem ter condição de dar uma outra solução a esse tipo de ação”, ilustrou.

De acordo com o CNJ, o total das execuções fiscais na Justiça Estadual representa 53% do total de processos do ramo. “De cada 100 processos de execução fiscal que tramitaram no ano de 2016 (nacionalmente), apenas 9 foram baixados”, diz o relatório.

“A lei de execuções fiscais em vigor é do ano de 1980. Ela é antiga e não acompanhou a atualização em termos de execução do novo código de execução civil e impede que o magistrado consiga trazer maior efetividade a esses casos”, afirmou Menezes, que ressaltou que não há uma ação considerada mais extrema para garantir o pagamento da dívida, como prisão, por exemplo.

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Alternativas Para tratar do montante, a presidente do TJ-BA, Maria do Socorro Barreto Santiago, estabeleceu a especialização das Varas da Fazenda. Do total de Varas da Fazenda, oito trabalham exclusivamente com as execuções fiscais: a 1ª, 2ª, 3ª, 4ª, 9ª, 10ª, 11ª e 13ª varas. Cerca de 90% das execuções fiscais da Bahia são municipais. Por conta disso, a 4ª e 11ª varas são especializadas e recebem executivos fiscais do Estado. Todas as outras recebem os processos do Município.

Para evitar o congestionamento e diminuir o impacto das execuções fiscais, o TJ-BA também conta com formas alternativas. O Programa de Governança Colaborativa de Execuções Fiscais foi instalado pela corte em maio de 2016, e busca instruir os atores relacionados nas execuções fiscais. “A gente insere o Município, o Estado, o Ministério Público, a Defensoria Pública para que todos consigam enxergar a questão como um problema de Estado”, explicou Menezes.O programa busca reduzir o congestionamento de processos e, para isso, realiza mutirões de acordo para baixar os processos, realiza educação fiscal, digitaliza as execuções fiscais.Desde maio de 2016, o programa de governança realizou a baixa de 68.891 processos de execução fiscal nas comarcas de entrância final.

“Desde o início do projeto, foram mais de 2.888.947 movimentações de processos de execução fiscal no acervo, seja conclusão, despacho, sentença, entre outros movimentos realizados pelo juiz. Desse total, só em Salvador foram 1.915.752 movimentações”, explicou Menezes, que ressaltou que cada processo custa cerca de R$ 8 mil para os atores.

Outra medida alternativa tomada pelo TJ-BA foi a implantação do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania Fazendário (Cejusc), medida extrajudicial em que se tenta evitar que Estado e Município entrem com execução a partir de uma conciliação com o contribuinte.

Procuradorias Fiscais A dívida por tributo só se torna uma execução fiscal após todas as ações administrativas terem sido frustradas. O processo judicial repete etapas, como localização do devedor e do patrimônio, que já haviam sido feitas pela administração fazendária. “Acabam chegando ao Judiciário títulos cujas dívidas já são antigas e, por consequência, mais difíceis de serem recuperadas”, explica o CNJ.

Os responsáveis por ajuizar essas execuções fiscais são os procuradores, tanto do Estado, como dos municípios, que são os responsáveis pelos débitos inscritos em dívida ativa. O procurador fiscal do Estado, Fernando Telles, ressaltou que apenas 10% dos executivos fiscais são oriundos do Estado.“Antes da especialização das varas, o volume de processos do Município impactava na demanda que o Estado tinha, já que eram 9 do Município para 1 do Estado. Acabava que os juízes naturalmente despachavam mais os processos do Município”, afirmou Telles.Para diminuir a quantidade de ações, o Estado realiza o protesto extrajudicial, conciliação como contribuinte para que não seja necessário judicializar a dívida. A lei 13.729 foi instituída pelo Estado em julho deste ano, autorizando que a administração estadual não ajuíze execuções fiscais abaixo de R$ 20 mil. “Criamos essa linha de corte autorizando a não ajuizar ações. Não quer dizer que não iremos rever esse valor, mas que iremos buscar outras formas de cobrança de crédito que não a judicialização”, explicou o procurador.

Ainda de acordo com Telles, foi realizado um estudo que apontou que não vale, para o Estado, ajuizar ações com dívidas menores do que esse valor, por conta do custo. “Tem sido uma constante a Procuradoria tentar realizar ações concretas para reduzir esses quantitativos sem abrir mão da cobrança do crédito público. Apenas realizamos uma racionalização dessa cobrança”, disse.

O procurador fiscal do Município de Salvador, David Luduvice, explica que a maior quantidade de executivos fiscais - e o maior valor a receber - é advindo do IPTU.“É um imposto (IPTU) muito pulverizado, são muitos contribuintes e no mínimo cinco exercícios de cobrança, o que gera uma quantidade grande de ações”, disse Luduvice, que afirmou que a grande quantidade de executivos municipais se dá por conta de um “acúmulo histórico”.A solução extrajudicial também é buscada pelo Executivo municipal. “O Município vem desde 2016 realizando protestos extrajudiciais das dívidas para evitar que a cobrança chegue à Justiça. Nós imaginamos que em até três anos já tenha um efeito concreto. Atualmente, já sentimos resultados, mas é algo gradativo”, disse.