'Acordou revirando os olhos, cuspindo água', narra jovem que salvou idoso no Dique

Rapazes contam ao CORREIO que cena não sai da cabeça deles

  • Foto do(a) author(a) Fernanda Varela
  • Fernanda Varela

Publicado em 19 de junho de 2019 às 20:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: João Galdea/CORREIO

Nem todo herói usa capa. No caso mais recente, ocorrido nessa terça-feira (18), eles usavam apenas bermudas vermelhas e azuis e não titubearam para salvar a vida de Vilson Almeida Batista, 72 anos, que teve um mal-estar dentro do carro que dirigia, capotou e caiu dentro do Dique do Tororó.

Breno Nascimento, 18, Luan Dias Nascimento, 19, Lázaro Vinícius de Araújo, 15, Genilson Nascimento, 24, e Alexandro Ribeiro, 17, foram os responsáveis pelo resgate do idoso. Moradores da região, eles estavam batendo o baba sagrado de toda semana na pista da região, que estava fechada para a passagem de carros. Isso porque, a poucos metros de lá, na Fonte Nova, craques como Daniel Alves e Philippe Coutinho entrariam em campo com a camisa da Seleção Brasileira, para um jogo contra  a Venezuela, pela Copa América.

O baba dos meninos, que costuma acontecer em dia de quinta, na quadra dos Barris, excepcionalmente aconteceu naquele dia e horário. O movimento era intenso, com torcedores que planejavam curtir o jogo do Brasil. De repente, um carro desgovernado desceu a Ladeira da União, capotou e foi arremessado na água.

"A gente estava jogando bola a uns 20 metros de onde o carro desceu da ladeira. Ele passou mal, então meteu a cara no volante e já desceu buzinando, sem controle. Uma mulher começou a gritar falando que tinha gente dentro, aí fomos ajudar. Foi muita sorte não pegar em ninguém, porque uns 20 segundos antes tinha muita gente atravessando ali na pista, muita gente mesmo, por causa do jogo", contou o motoboy Genilson, que é nascido e criado na região e conhece bem as águas do Dique, onde já nadou. Hoje, segundo ele, não faz mais, pois "já passou dessa fase".

Alexsandro, que é estudante, também é nascido e criado no bairro. No entanto, não fazia planos de ter contato com as águas escuras do Dique."Foi a primeira vez que eu caí nessa água, porque eu tenho nojo. Jogam muita porcaria aí. Além disso, eu tenho medo, porque eu já vi  muita gente morrendo afogada ali. Eu não pensei em nada, só pulei. Eu queria ajudar a salvar", disse.Os cinco amigos moram na mesma região, bem pertinho do Dique e alguns deles são parentes, como Genilson, Luan e Breno, que são primos. Já o idoso que sofreu o acidente é vizinho deles e mora a alguns metros de distância, na própria ladeira onde ocorreu o acidente. Ele estacionava o carro na porta de casa quando passou mal e perdeu o controle. Segundo os garotos, eles e o motorista se conheciam de vista e sempre trocavam cumprimentos. Foto: Linda Bezerra/CORREIO O socorro a Vilson demorou pelo menos sete minutos, estimam os garotos. O processo foi demorado porque, segundo contam, o idoso não usava cinto de segurança e, por isso, foi parar no banco de trás do carro.

"Foi muito difícil abrir a porta do carro, porque fazer isso debaixo da água exige muita força. Fizemos muito esforço para abrir a porta da frente, achando que ele estava lá, mas ele foi jogado para o banco de trás. Foi difícil, porque como o carro estava de cabeça para baixo, a maçaneta ficou ainda mais para baixo", explicou Genilson.

Alexsandro lembra que, quando finalmente conseguiram tirar o idoso do carro, ele estava desmaiado."Ele engoliu muita água. Puxamos ele e colocamos na grama, aí um rapaz que ia para o jogo do Brasil e é médico parou para socorrer, fez respiração boca-a-boca. Foi aí que ele acordou revirando os olhos e cuspindo água", narrou.Pouco depois, uma viatura do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) prestou socorro e levou Vilson para o Hospital Geral do Estado (HGE), onde segue internado. A unidade de saúde não fornece informações sobre o estado de saúde, mas vizinhos relatam que a vítima está entubada e em estado grave.

A cena não sai da cabeça de Luan, que também estava no resgate. "Ficou passando um filme na cabeça, repetindo a cena, porque não é todo dia que a gente vê um negócio desses, né? Mas graças a Deus a gente conseguiu salvar ele", disse.

Preocupação e orgulho Genilson, que mora com a mãe, conta que ela tomou um susto quando soube do acidente. Como sabia que ele estava jogando bola, pensou que o rapaz podia ter sido atingido pelo veículo. "Ela ouviu o barulho e, quando viu onde era, começou a se tremer toda, pensando que o carro tinha pego eu e Luan. O pessoal da vizinhança viu a gente na água, aí tranquilizou ela", explica.

Quando viu que o filho estava bem, ela ficou bastante orgulhosa. "Ela gostou, ficou feliz de me ver ajudando a salvar uma vida, né? Muita gente tem falado que fomos heróis, mas isso nem importa. A gente só quer que ele sobreviva mesmo. O importante agora é ele, não a gente", completa Genilson.

Relembre o caso Um idoso de 72 anos perdeu o controle do carro quando descia a ladeira da União, atravessou a via e caiu no Dique do Tororó na noite desta terça-feira (18). O motorista Vilson Almeida Batista estava sozinho no carro. Jovens que jogavam futebol nas proximidades ajudaram no resgate. Depois, chegaram o Corpo de Bombeiros e o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).

"Chegamos logo após a comunicação do acidente e auxiliamos no que foi preciso. Fizemos uma varredura inical no local para verificar se havia mais vítimas, mas nada foi encontrado. Testemunhas também informaram que ele estava sozinho no momento do ocorrido", diz o comandante do 3° GBM, major Ramon Dieggo.

"Segundo populares, ele (o motorista) saiu inconsciente, devido à questão até do direcionamento que foi dado ao veículo, e logo após ele saiu e as pessoas que retiraram ele fizeram o procedimento em solo", acrescentou o major, afirmando que o motorista estava recebendo socorro médico.

"Voou e caiu lá dentro", se limitou a dizer a aposentada Lucidalva Ribeiro, vizinha do idoso acidentado, que mora na região da Ladeira da União, nas proximidades do Dique.

Também vizinha de Vilson, a dona de casa Maria José acredita que ele tenha perdido o controle após se sentir mal. "Eu estava na minha varanda quando vi o carro descendo. Ele tem família, mora duas casas depois da minha", contou ela.

Apesar da grande movimentação na região, por conta da partida entre Brasil x Venezuela na Arena Fonte Nova, o carro não atingiu ninguém. Segundo o major, "tudo indica que a vítima teve algum mal-estar no volante".