Afroempreendedorismo: marcas baianas lideradas por negros alcançam sucesso e inspiram  

Sebrae aposta em capacitação e planejamento como ferramentas fundamentais para contornar obstáculos  

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  • Do Estúdio

Publicado em 20 de novembro de 2021 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Fotos: Dario Neto/ASN Ba
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Durante a infância em Salvador, a designer de produto Geo Nunes sempre estranhou a dificuldade de encontrar uma boneca com a “cor de pele” parecida com a sua: negra. Com o passar dos anos, já adulta e consciente do que é racismo estrutural - porém num contexto de mais ampla discussão sobre a representatividade negra -, a profissional voltou a se deparar com o mesmo problema do passado. “Estava participando de um projeto social que doava brinquedos para crianças, como a maioria era negra, mais uma vez tive grande dificuldade de achar bonecas com tom de pele parecido”, relata. 

Percebendo a carência do produto no mercado, Geo começou a confeccionar as bonecas que viriam a ser os principais produtos da Amora Brinquedos Afirmativos. “Eu não tinha a intenção de criar uma empresa, mas a Amora só existe porque as grandes marcas de brinquedos não têm bonecos e bonecas representativas para as crianças negras”, diz. “Hoje, nosso trabalho cresceu, só que mais importante que o nosso lucro é a nossa missão: cada boneca que vendemos, uma outra é doada para crianças que estudam em escolas públicas”, completa.  Ausência de bonecas negras no mercado motivou a designer de produtos Geo Nunes a criar a Amora Brinquedos Afirmativos (Foto: Darío Neto/ASN ba) Através a Amora, Geo Nunes se tornou um dos principais exemplos de sucesso do afroempreendedorismo na capital baiana. O termo é considerado novo pelos estudiosos do mercado mas, na prática, é uma realidade que já faz parte do DNA de Salvador, segundo a analista de Negócios Inovadores no Sebrae Bahia, Fau Ferreira. “Nada mais é do que o empreendimento realizado por pessoas negras”, explica. “Porém, o empreendedor negro tem um perfil e características no seu negócio que são bem específicas, que vão desde um faturamento 50% menor do que as empresas não negras, além de um acesso mais difícil ao suporte para crescer, tanto no conhecimento como nos investimentos, além do crédito”, aponta. De acordo com a analista do Sebrae, em Salvador, os principais ramos de atuação dos afroempreendedores são beleza e alimentação e os principais desafios são a falta de conhecimento em termos de educação financeira, gestão administrativa, além do planejamento a longo prazo. “São pessoas que chegam ao Sebrae com a necessidade do conhecimento e, a partir dos cursos e da formalização, encontram as ferramentas para crescer, melhorar o faturamento, ter acesso a crédito, pontos que são verdadeiros obstáculos”, diz.  A analista de Negócios Inovadores no Sebrae Bahia, Fau Ferreira diz que o afroempreendedorismo está no DNA de Salvador. (Foto: Darío G Neto/ASN BA) Confeiteira dedicada Uma outra afroempreendedora que encontrou no Sebrae régua e compasso para tirar as ideias e transformar a atividade que um dia não passava de composição de renda em um negócio de sucesso foi a publicitária Daniela Bastos, da Dani Brigadeiro, que em 2011 aproveitou a tendência dos brigadeiros gourmet para fazer um dinheiro extra e, com o tempo, viu a demanda crescer a ponto de motivá-la a pedir demissão do seu emprego formal para se dedicar à confeitaria. “Quando comecei, a onda estava só no início. De repente, a procura foi crescendo e precisei de dedicação integral”, relata. 

Os primeiros tempos foram desafiadores, entre pesquisas na internet e cursos gratuitos, até chegar ao Sebrae, quando o aprimoramento das ideias foi constante. “Ao fazer o Empretec, do Sebrae, minha mente se abriu e consegui realizar diversas coisas que sequer imaginava. Comecei sozinha e hoje tenho quatro funcionários. Temos uma variedade de produtos de confeitaria”, conta.“Empreender traz muitos desafios que passam pelo próprio aprimoramento pessoal, como saber deixar de executar e passar a delegar funções, gerir pessoas, vender, competências que nem temos, mas que são importantes para o sucesso”, diz Daniela

Dores e delícias  Para Fau Ferreira, a compreensão do afroempreendedorismo e o efeito econômico e social de um trabalho dedicado às características desses empreendedores são fundamentais para a cadeia de negócios. “Nos últimos 10 anos, o entendimento das características, obstáculos e potenciais deste conceito contribuiu para que pudéssemos ajudar diversos negócios que se tornaram exemplo de sucesso e isso é muito positivo, pois gera uma reação em cadeia e outros empreendedores negros se sentem encorajados por perceber que é possível”, afirma.  Pedro Batalha e Hisan Silva: de "empreendedores de bairro" à referência nacional com a Dendezeiro (Foto: Darío Neto/ASN BA) A oportunidade de alcançar os objetivos e servir como referência para outras pessoas, segundo Hisan Silva, proprietário da Dendezeiro ao lado do sócio Pedro Batalha, uma das grifes de destaque na moda negra brasileira atualmente, é uma das maiores recompensas de apostar no empreendedorismo. “Às vezes sinto que as pessoas, mesmo aquelas que já alcançaram o sucesso, focam demais em falar dos obstáculos e deixam de lado a delícia que é o aprendizado e a trajetória. Sair do patamar de um empreendedor de bairro e me tornar referência para pessoas que estão fora da minha bolha de Salvador e da Bahia é muito gratificante”, conta. “Grande parte do aprendizado está na prática, mas buscar conhecimento e se manter leal a quem você é te fazem mais do que uma marca, te dão propósito”, completa Hisan Silva. 

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