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Flavia Azevedo
Publicado em 20 de maio de 2021 às 06:00
- Atualizado há 2 anos
A queda de braço é dura, mas também conta com Cristina Souto. Formada em História, pela Ufba, há 19 anos, desde então, ensina em renomadas escolas particulares de Salvador e isso é parte da conversa. Na outra parte, há a atuação sindical que a levou à Diretoria Executiva do Sinpro (Sindicato dos Professores do Estado da Bahia), desde 2011. Há 14 meses, vive a saudade tanto das salas de aula cheias de adolescentes quanto das mesas de bar divididas com amigos. Mas é isso: agora, não dá.>
De repente, professores/as passaram a ser chamados de "preguiçosos/as", porque "não querem" retomar as aulas presenciais. Você pode me contar um pouco da sua rotina?>
O discurso de luta contra o trabalho presencial antes da nossa completa imunização tem sido manipulado por alguns segmentos da sociedade. A acusação de que não estamos trabalhando, além de mentirosa, é extremamente desrespeitosa com essa categoria, principalmente com as mulheres, e em especial com as mães, que não é o meu caso. Eu dou aula todos os dias das 7h às 12h30, só então vou dar conta de almoço e quando acabo as funções domésticas já estou no meio da tarde correndo para atender as demandas do Sinpro, que aumentaram muito diante da situação.>
Com a volta parcial das aulas presencias, há relatos de que algumas escolas particulares estão descumprindo normas sanitárias e escondendo casos de covid-19, entre alunos/as e funcionários/as. O Sinpro tem isso documentado e pretende alguma ação?>
Infelizmente, isto está acontecendo. O Sinpro criou um formulário de denúncias para que os professores nos enviem. Essa é a única maneira que temos de denunciar as escolas e solicitar fiscalização das autoridades competentes, já que o sindicato não tem o poder de autuar.>
A adequação de prédios escolares aos "protocolos de segurança" não é um processo barato, pelo contrário. Pelo que você conhece da realidade de diferentes escolas da rede privada, é possível dizer que uma parte considerável pode funcionar dentro dos novos critérios sanitários?>
Existe um imaginário coletivo de que escola particular é sinônimo de escola rica, o que não é verdade. As escolas ricas em toda a Bahia não representam 10% das escolas particulares no estado. Se já recebemos denúncias de escolas de grande porte violando protocolos, as escolas de médio e pequeno porte, localizadas, na sua maioria, em bairros periféricos, definitivamente não conseguirão garantir critérios sanitários. >
Supondo escolas muito bem equipadas, há como garantir afastamento físico seguro (dois metros, com máscara) entre crianças e adolescentes, em ambiente escolar?>
Não há como garantir. Além do fato de que crianças não conseguem ter a real dimensão da pandemia e de que adolescentes são, na sua essência, transgressores, muitos deles não praticam distanciamento social no seu ambiente familiar, portanto, não vêm sentido nesses protocolos.>
Se, ainda assim, todas as escolas estivessem adaptadas e todas as regras fossem cumpridas, esse ambiente "protocolar" seria um ambiente emocionalmente saudável para crianças e adolescentes?>
Eu acredito que não. O que ouço de alunos e de filhos de amigos é um desejo de voltar para escola no sentido de voltar para a normalidade. Essa normalidade para eles está muito mais ligada ao convívio social do que ao processo de ensino/aprendizagem. Voltar para a escola de forma "segura", ao meu ver, seria frustrante para eles. >
Com a retomada das aulas presenciais em modelo híbrido, professores/as passarão a lidar com duas "categorias" de alunos/as: os/as do ensino híbrido e aqueles/as que permaneceram apenas no online. É possível atender, de forma igualitária, quem está presencialmente e quem não está?>
Em primeiro lugar, o que as escolas estão oferecendo como "ensino híbrido" não representa essa abordagem pedagógica. O que agora eles estão chamando de ensino semipresencial é simplesmente colocar um professor dentro da sala dando aula ao mesmo tempo para quem está presente e para quem está em casa. É impossível atender de forma igualitária as duas realidades porque as estratégias pedagógicas de sala de aula são completamente diferentes das estratégias de "vídeoconferência". Os dois segmentos de alunos ficarão insatisfeitos e a competência do professor será questionada, apesar de estar fazendo dois trabalhos ao mesmo tempo pela mesma remuneração. A categoria já está enfrentando essa realidade.>
Quais as atuais reivindicações do SINPRO, em relação à volta às aulas presenciais, e qual o prazo que o sindicato imagina ser seguro para a retomada?>
A pauta única do Sinpro é que o retorno aconteça só após a completa imunização das trabalhadoras e dos trabalhadores em educação.>
De quem vocês sofrem maior pressão para o retorno: famílias ou escolas?>
De todos os lados! Mais uma vez somos as vilãs e os vilões de uma sociedade que não valoriza essa profissão.>
Existe um recorte social possível das famílias que mais pressionam pela volta às aulas?>
A tirar pelas escolas que encabeçam a campanha de retorno às aulas, sem dúvida a pressão vem das classes média e alta.>