Ainda não é lockdown: Centro, Boca do Rio e Plataforma terão bloqueios a partir de sábado (9)

Veja locais que terão restrições mais rigorosas em Salvador; medida poderá ser estendida a toda capital

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  • Hilza Cordeiro

Publicado em 7 de maio de 2020 às 17:15

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/CORREIO

Em conjunto com o Governo do Estado, a Prefeitura de Salvador divulgou, nesta quinta-feira (7), que o Centro da capital baiana e os bairros da Boca do Rio e Plataforma terão medidas restritivas mais duras a partir deste sábado (9). Alguns bloqueios de acesso e blitzes de testes, além de outras atividades, serão promovidos pela administração municipal nestes locais com o intuito de diminuir o avanço da pandemia do novo coronavírus na capital baiana. 

A princípio, as ações da prefeitura vão durar por sete dias, mas há possibilidade de renovação e extensão dos bloqueios para outras áreas da cidade com registro de aglomerações. Se chover muito neste final de semana em Salvador, a prefeitura adiará a adoção dos bloqueios para a segunda-feira (11).

Na coletiva, o governador Rui Costa legitimou o planejamento feito pela prefeitura de Salvador.  "A Bahia, por ser um estado muito grande, do tamanho da França, a gente fez uma opção de adotar medidas de restrição de convívio social e de medidas de proteção social progressivas, de acordo com a região, com a cidade, sempre dialogando com o poder local. Portanto, vamos anunciar medidas de maior restrição de circulação de pessoas no sentido de que consigamos reduzir essa taxa [de contaminação]", disse.

De acordo com o prefeito ACM Neto, as medidas de restrição não podem ser chamadas de lockdown, visto que esta ação, mais extrema, envolve isolamento total e compulsório. A estratégia da prefeitura é a regionalização das ações nos três locais determinados.

A decisão pela interdição do Centro, Boca do Rio e Plataforma foi tomada com base em dados de mobilidade, relativos à circulação de ônibus e demais veículos nas ruas, assim como o fluxo de pessoas transportadas nos coletivos.

A prefeitura ainda levou em conta as informações de descumprimento de decretos, como os estabelecimentos comerciais que insistem em abrir as portas, além dos números de casos confirmados da covid-19 nos bairros. "Essa é uma base importante porque a gente percebeu em alguns lugares o fluxo de pessoas e de veículos vem se aproximando de um fluxo normal", justificou o prefeito.

Quais serão as restrições?

A administração municipal garantiu que o transporte público permanecerá inalterado, ou seja, a população terá acesso total aos coletivos, metrô e demais meios públicos. No entanto, serão feitas interdições em algumas vias das regiões anunciadas, que acontecerá das 7h às 19h.

Isso significa que todos os veículos que passarem pelas determinadas vias serão abordados e quem não reside na área não poderá ter acesso durante o intervalo estipulado. Somente moradores terão liberdade de circular nestes locais a qualquer hora do dia, mediante apresentação do comprovante de residência. 

Na Avenida Joana Angélica, no Centro, a administração propôs a interdição completa da via, que vai do Campo da Pólvora à Praça da Piedade. Neste trecho, existirão seis barreiras de trânsito em ruas laterais que dão acesso aos bairros da Mouraria e Tororó. A Avenida Sete de Setembro, que fica na intersecção com a Av. Joana Angélica, já está interditada deste o início de abril devido às obras de requalificação e terá uma barreira de trânsito. Trecho da interdição no Centro (Foto: Reprodução/Redes Sociais) Com 35 casos de covid-19, a Boca do Rio teve um salto no fluxo de transportes públicos, que saiu de 27% em abril para 35% só na primeira semana de maio. Os números de circulação dos demais veículos subiu ainda mais, de 50% para 85% comparando o mesmo período. 

Devido a esses índices, a prefeitura propôs a interdição total da Rua Hélio Machado, onde há forte comércio, e só permitirá o trânsito de ônibus e moradores. Serão instaladas 10 bairreiras de trânsito em ruas laterais à esta (confira no mapa). O fluxo de demais veículos será desviado para a orla, pela Av. Octávio Mangabeira, e pela Rua Simões Filho.

Já em Plataforma, que até o momento conta com 32 casos, a proposta foi interditar um trecho da Avenida Suburbana, na região do Largo do Luso. Não haverá imposição de barreiras de trânsito nessa área. O bairro de Plataforma vem sendo visto com preocupação pelas autoridades municipais porque a taxa de crescimento de casos na localidade tem sido maior do que a do bairro da Pituba, que tem 72 casos de covid-19, liderando em número de ocorrências. 

Dos 32 casos registrados em Plataforma, 14 aconteceram só nesta primeira semana de maio, o que revelou uma velocidade de contágio, já que a Pituba tem casos desde o início da pandemia em Salvador, em 13 de março.

"Plataforma é hoje um dos bairros da cidade com o maior aumento de casos de coronavírus. É bom destacar que a taxa de crescimento da Pituba é menor do que a de Plataforma. Registramos um aumento no volume de pessoas transportadas e de veículos, que chegou a 81%, ou seja, uma redução de apenas 19% quando comparado a um dia normal", analisou ACM Neto.

Permanecerão proibidas na cidade inteira todas as atividades comerciais (formais e informais), assim como os serviços não essenciais. Isso não vale para supermercados, farmácias, bancos e lotéricas.  Veja a proposta de trânsito para a Boca do Rio apresentada pela prefeitura (Foto: Reprodução/Redes Sociais) Entenda o que é o lockdown, que pode ser adotado em Salvador

Por que outros bairros com grande número de casos não foram escolhidos?

O prefeito explicou ainda que outros locais da cidade precisam de ajustes e chamou atenção principalmente para a famosa Rótula da Feirinha, em Cajazeiras, e também dos bairros de Periperi, Paripe e Liberdade. Segundo o gestor, a medida lançada nesta quinta-feira é uma forma de refinar a operaçã, mas as demais áreas com registro de aglomerações e casos positivos poderão ser incluídas futuramente.

"Não dá para fechar o trânsito na Av. Lima e Silva, na Liberdade, e nem da Rótula da Feirinha porque se não para a cidade. Espero que essas medidas possam ter um caráter pedagógico, educacional. Por isso, terão toda a atenção da prefeitura. Vamos estar dialogando com os moradores e queremos que esses bairros sejam um modelo. A partir daí, a operação vai sendo ampliada, até que a gente tenha condições de inspirar outros bairros para evitar que, no futuro, seja necessária uma medida mais dura. Para que essa palavra, 'lockdown', não precise fazer parte do nosso vocabulário", disse Neto. ACM Neto em coletiva de imprensa nesta tarde de quinta-feira (7) (Foto: Reprodução/YouTube) Como as pessoas serão fiscalizadas e que apoio elas terão?

Para fazer valer a diminuição de casos nos locais selecionados, equipes de órgãos municipais farão distribuição em massa de máscaras de proteção, medição em massa de temperatura, além de aplicação de testes rápidos em pessoas a bordo de veículos. Os agentes públicos também farão distribuição de cestas básicas para ambulantes e feirantes, mesmo que eles já recebam o auxílio-emergencial do governo federal e demais benefícios municipais e estaduais.

A operação conta ainda com profissionais itinerantes do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), através da Secretaria Municipal de Promoção Social e Combate à Pobreza (Sempre), que darão cobertura à quem precisa de serviços sociais. O apoio no bairro inclui a assistência à instituições locais que lidem com crianças, idosos e pessoas com deficiência, que receberão cestas básicas e materiais de higiene.

Haverá intensificação da higienização das principais ruas dos três bairros, que inclui a orientação dos moradores quanto ao enfrentamento do mosquito aedes aegypti, transmissor dos vírus das dengue, zika e chikungunya, doenças que também tiveram aumento expressivo de casos na cidade.

"Cada vez mais a gente pretende compreender a dinâmica das pessoas de cada bairro e traduzir isso em decisões para proteger a vida dessas pessoas. A prioridade nessas medidas é exatamente proteger a vida dos moradores do bairro que sofrerá algum tipo de restrição", garantiu o prefeito.  Rui Costa também participa da coletiva remotamente (Foto: Reprodução/YouTube) Lockdown não é descartado

Ao antecipar os bloqueios na quarta-feira (6), o prefeito ACM Neto não descartou a possibilidade de estendê-la para toda capital. “O lockdown total foi tratado como uma hipótese durante reunião entre a prefeitura e o governo do estado na segunda-feira (4). No entanto, o diálogo vem acontecendo diariamente e, se for preciso, vamos adotar as medidas necessárias. Vamos observar o comportamento das pessoas durante o isolamento que faremos de algumas áreas da cidade, a partir de sábado, e então analisar se haverá a necessidade de estender a ação para toda a cidade”, explicou.

O transporte público também passará por alterações porque houve um aumento no número de passageiros na última semana. Antes, apenas 28% dos usuários estavam usando o sistema, mas esse número saltou para 35% nos últimos dias. A maior circulação de pessoas justamente quando o vírus está mais ativo na cidade preocupa as autoridades.

Até a manhã desta quarta (6), Salvador estava com 128 leitos de UTI e 238 leitos clínicos ocupados. Juntos, município, estado e rede privada oferecem 489 acomodações de UTI e 444 clínicas. Até a manhã desta quarta, havia 2.599 casos confirmados do novo coronavírus apenas na capital baiana. Em toda o estado, são 4.247 pacientes. 

Segundo as previsões, se a taxa de contaminação continuar em 7%, a partir do dia 14 não haverá mais leitos clínicos disponíveis, e em 20 de maio acabam os de UTI. O pico da crise vai se estender até 23 de junho, quando a curva de contaminação finalmente pode começar a baixar.

Até agora, a Pituba permanece como o bairro com o maior número de infectados em Salvador, com 72 ocorrências. A lista é seguida por Brotas (53), Patamares (38), Bonfim (34), Federação (32), Liberdade (26), Engenho Velho de Brotas (25), Imbuí (26), e Uruguai (27). Em bairros populares o movimento de pessoas nas ruas é maior e isso também tem chamado à atenção das autoridades.

Em nota, a Secretaria Estadual da Saúde (Sesab) informou que ainda não há motivo para o lockdown total em Salvador, mas que isso pode ocorrer caso não cheguem novos respiradores para abrir leitos de UTI e nem haja profissionais suficientes para abrir novos leitos. A pasta reassaltou que o governo tem realizado um planejamento para abertura de novos leitos em toda a Bahia.

Isolamento no estado O governo da Bahia também não descarta a adoção do lockdown no estado, mas no momento não há previsão para isso. A gestão estadual informou que essa decisão depende da evolução da taxa de crescimento na Bahia. O isolamento total, caso seja adotado, não deve acontecer em todo estado ao mesmo tempo também. O assunto é discutido exclusivamente pelo gabinete de crise do governo neste momento. 

Há cerca de dez dias, o governador Rui Costa pediu apoio das Forças Armadas para garantir o cumprimento dos decretos estaduais e municipais na região Sul da Bahia. Desde março, representantes da Marinha, Exército e Aeronáutica no estado se colocaram à disposição do governo para ajudar. Depois de concordar em ajudar no Sul do estado, contudo, as Forças Armadas anunciaram que não teriam condições de dar o apoio, sem explicar a razão.

O governo diz que caso seja preciso e haja interesse, aceitará futuramente o apoio das Forças Armadas novamente.

No último boletim do Comitê Científico do Consórcio Nordeste (C4), montado com o incentivo de Rui Costa, os pesquisadores associados recomendaram lockdown quando os estados nordestinos atingirem 80% de ocupação dos leitos totais exclusivos de covid-19.

Perguntado pelo CORREIO se seguiria essa recomendação, o governador disse que as intervenções que vêm sendo feitas nos municípios, como o fechamento do Centro de Ilhéus e agora a restrições localizadas em Salvador, são uma forma de agir para dispensar o lockdown no estado.

"Temos que agir agora. Não dá para esperar chegar com 100%, 90%. Isso foi o que outras cidades fizeram, esperaram chegar à beira do esgotamento para tomar providência e já se comprovou que o resultado disso é o caos, o colapso até no sistema funerário", comentou ele, citando o caso do estado do Pará, que já chegou ao nível de recolher corpos nas residências das pessoas.

O prefeito ACM Neto também aproveitou para dizer que as medidas em Salvador têm sido tomadas com base em dados científicos e chamou atenção para o fato de que o colapso, se acontecer, deve atingir tanto a rede pública de saúde quanto a privada. "Pessoas que têm plano de saúde e que pensam 'ah, não, se acontecer comigo, eu tenho meu plano de saúde, vou para hospital particular, me interno e me curo'. Não! Há um risco de colapso nas duas redes. Estamos tentando nos antecipar ao caos para evitar que ele aconteça e é nesse nível de abordagem que eu quero a compreensão das pessoas porque, de fato, se vier o caos não vai ter gente com dinheiro ou sem dinheiro, com plano ou sem plano, que mora no Subúrbio ou no Centro, todos, literalmente, serão alcançados e afetados. A gente espera que essas medidas nao tenham que ser mais duras no futuro, que elas possam começar a dar resultado em nossa cidade", afirmou.