Alfabetização inclusiva

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  • Da Redação

Publicado em 10 de julho de 2019 às 07:00

- Atualizado há um ano

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Como conseguir que o processo de alfabetização atinja todas as crianças, mesmo as que têm maior dificuldade de aprendizagem? Me deparei com esse desafio quando comecei a trabalhar na instituição Lar Vida, na Estrada Velha do Aeroporto, inicialmente com a responsabilidade técnica das crianças e adolescentes com autismo e, mais tarde, como coordenadora pedagógica. Após um ano na instituição, me deparei com uma das acolhidas, já adulta, chorando compulsivamente em cima do livro da escola onde estudava.

Quando fiz a sondagem, a jovem realmente não sabia nada, mesmo tendo 24 anos e uma enorme vontade para aprender. Estava numa fase que chamamos de garatuja, só traçava aquelas bolinhas. Ela pediu que eu a ensinasse a ler e escrever, assim como uma outra menina com 9 anos que também não tinha conseguido aprender. As duas com deficiência, uma com síndrome de Crouzon e a outra, além da paralisia cerebral, também com deficiência intelectual. Foi assim que nasceu o PAI- Projeto de Alfabetização Intensiva, que deu origem ao embrião do Espaço Caminhar.

A primeira coisa que fizemos foi pegar os livros paradidáticos das escolas onde as meninas já haviam frequentado para saber quais eram as metodologias usadas e que não surtiram  efeito. Foi aí que chegamos a um consenso de que trabalharíamos com uma metodologia voltada para atividades multissensoriais que abordassem a alfabetização - isso é, quando você  utiliza vários tipos de entradas sensoriais  para que seja absorvido o conteúdo.

O primeiro passo foi conscientizá-las do aparelho fonador, ou seja, consciência dos pontos articulatórios, modo e sonoridade quando  é pronunciado algo. Isto é, como fica posicionada a boca quando se emite os sons das letras, a consciência se a boca está aberta ou  fechada, onde coloca a língua, onde não coloca. Depois a consciência fonológica, mostrando que cada letra tem um som, a depender da posição com que a boca está. A proposta não utiliza a ordem alfabética tradicional.

A concepção articulatória usada neste projeto se estabelece do mais difícil para o mais fácil, de acordo com o processo de desenvolvimento da linguagem. E traz uma concepção cíclica. Nossa estratégia foi consolidar primeiro as cinco vogais,  trabalhar os encontros vocálicos, e só após a internalização desses é que se inicia o trabalho com uma consoante, nesse caso a letra L.

A partir do momento que a criança passa pelo ponto articulatório do L vai para  S, depois para V e, por fim, o P. Cada um tem suas diferenças essenciais. Depois,  segue para a letra D, que é um ponto articulatório próximo do L. Como  já conseguiu o L, o D, para ela, vai ser mais fácil.

Surpreendentemente, a criança aprendeu rapidamente. Em oito meses ela estava alfabetizada, faltando apenas ortografar. A segunda  está ainda no processo, mas já absorveu as vogais, encontros vocálicos e cinco das 22 consoantes do alfabeto com suas respectivas famílias, evolução essa que passou mais de duas décadas para alcançar, mesmo frequentando escolas regulares.

A partir dessa experiência, decidimos reunir uma equipe multidisciplinar para trabalhar a proposta do PAI. Com auxílio de fonoaudiólogas, começamos a elaborar uma sequência lógica de alfabetização para o público com deficiência. Para nossa alegria, a proposta está dando certo, e na instituição Lar Vida já temos mais de 18 deficientes participando do projeto. Todos evoluindo.

Como está funcionando, nos surgiu a ideia de trazer esta mesma proposta de trabalho para crianças matriculadas na escola regular e que, por algum motivo, não conseguiram aprender a ler e escrever. Foi assim que decidimos abrir turmas na instituição Espaço Caminhar para o público com faixa etária mínima de 7 anos, com o apoio do Centro Comunitário Batista Clériston Andrade (Cecom), que funciona na Avenida Garibaldi.

Como todo trabalho é voltado para a área social, fora as mediadoras, trabalhamos com psicólogas e assistentes sociais voluntárias e estamos atrás de novos parceiros e colaboradores. Nossa pretensão é que, em médio prazo, a Espaço Caminhar se transforme em centro comunitário, com vários tipos de atividades, incluindo um núcleo de educação e aprendizagem que se iniciará pela alfabetização, chegando até outros níveis de escolarização como a ortografia, interpretação textual. Além disso, queremos oferecer atividades de recreação com oficinas de arte, de música, inclusive com trabalhos que envolvam toda a família.

Carolina Sibio é professora, pedagoga pós- graduada em Neuropsicologia, pós-graduanda em Análise do Comportamento e fundadora do Espaço Caminhar