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Vinicius Nascimento
Publicado em 1 de janeiro de 2021 às 00:10
- Atualizado há 2 anos
É bem verdade que não faltaram exemplos ruins de pessoas fazendo festas e aglomerando em pleno pico de segunda onda do coronavírus. No entanto, também há bons exemplos: gente que deixou a vaidade de lado e preozu por ficar quietinho em casa, com as pessoas de seu círculo familiar imediato - tudo em nome da própria vida e também das vidas alheias. E as opções são mais variadas do que parece: desde quem ficou tomando uma em casa com a mãe, até uma dupla que preferiu virar o ano assistindo a uma nova série ou quem ficou da janela pensando na vida.>
O soteropolitano Vitor Vinícius, webdesigner de 41 anos, abriu mão da viagem para sua terra Natal em nome da prudência. Ele não esconde pra ninguém que é fã de aglomerações. Inclusive, foi numa dessas que conheceu sua atual esposa, a funcionária pública Roberta Pereira, 44: os dois se encontraram no meio da Lavagem do Bonfim de 2007. O amor de verão subiu a serra e ele foi passar uma Semana Santa em Brasília, onde sua esposa já morava. Não voltou mais. Casaram-se e hoje têm um filho, Bento, de 4 anos.>
Típico casal de brasilienses, cada ano eles vão para a casa de um. Ou Salvador, ou Volta Redonda, no Rio de Janeiro. Este ano era a vez da capital baiana: Vitor se programou, comprou um carro novo para fazer a viagem pela estrada, mas no final das contas a preocupação da mãe, que tem um problema respiratório, falou mais alto e ele deixou a viagem pra lá. Virou o ano dentro de casa mesmo.>
"A gente iria para a Ilha de Bom Jesus dos Passos, próximo de Madre de Deus. Minha família é de lá e conheço todo o mundo, frequento desde que tinha dois anos de idade. E minha mãe me conhece, sabe que ia querer conversar com todo o mundo, matar a saudade de gente que não vejo há um tempão e ficou preocupada de eu ir", contou o baiano.>
Também teve quem fez o movimento contrário: caso da pesquisadora Lize Antunes. Natural de São Carlos, em São Paulo, ela é pesquisadora aqui na Bahia e retornou para sua terra natal logo no início da pandemia. A ideia era passar 15 dias com sua mãe, Sonia Antunes, mas acabou virando 8 meses. Lize só voltou à Bahia em novembro para resolver alguns problemas pessoais e logo retornou. Correu o máximo possível para evitar a correria de fim de ano nos aeroportos porque tanto ela quanto sua mãe estão muito cuidadosas em relação à pandemia. É tanto que fizeram um generoso estoque de cerveja para nem pensar em sair de casa durante as primeiras semanas de janeiro: o número de mortes e casos aumentou bastante, o que assustou a dupla.>
Ou seja: este ano, tudo se resumiu a elas duas. Quer dizer, tem mais: os gatos Manoel Carlos e Carlos Eduardo e o cachorrinho, um shitzu, Pedro Gabriel. Mas mesmo com a companhia dos pets, foi um Natal e Réveillon estranho para a família acostumada a receber quase 30 pessoasnesse período. Lize confessa que não teve tristeza por não recebre os familiares, apesar de gostar muito de juntar a turma - mas o estranhamento foi inevitável.>
"Preferimos prezar pela prudência. E está sendo muito tranquilo, não é nenhuma tristeza. Claro, gostamos de casa cheia, de ver aquela galera que não vemos sempre", conta. Da esquerda à direita: Lize Antunes, Pedro Gabriel, Manoel Carlos (o pretinho), Carlos Eduardo (o branquinho) e Sonia Antunes (Foto: Acervo Pessoal) Só, somente só A solidão enquanto os fogos estouram não é uma novidade para a publicitária Milena Coutinho, de 36 anos. Foram incontáveis Anos Novos que virou sozinha, na sacada de sua casa na Pituba, enquanto via os fogos estourando e pensava um pouquinho na vida, nos planos, nas realizações e na pessoa que era há exatos 12 meses.>
Este ano, no entanto, teve uma mudança importante: ela foi obrigada a passar o Réveillon sozinha. O motivo? Testou positivo para o coronavírus, mesmo assintomática. E passou os últimos 15 dias em casa. Seu filhinho de 4 anos foi para a casa do pai.>
"Meu ritmo de vida é muito agitado, então nesse período aproveito para fazer nada. O Réveillon nunca me animou, acho uma festa muito cara. Mas estar sozinha neste momento pega pelo isolamento. Em outros anos eu podia marcar com uma amiga de ir rápido até a praia, fazer uma caminhada, almoçar, jantar, e estou privada dessa liberdade. Isso foi o mais difícil", conta.>
Em Brotas, a psicóloga Leila Mignac brigou com boa parte da família para seguirem o isolamento, mas não conseguiu que todo o mundo continuasse em casa - o cansaço de quase um ano de pandemia acabou pesando. Ela, no entanto, seguiu firme. Virou o ano sentadinha em sua cadeira, reclamando um pouco no Twitter enquanto tomava um bom vinho e lia um dos vários livros que comprou na Black Friday.>
Leila e Milena acreditam que o final do ano é uma boa oportunidade para fazer um balanço da temporada. Milena diz que acredita no calendário como um norte e que é importante ter um momento de desacelerar e pensar um pouco no que foi feito, no que não foi feito e naquilo que se quer fazer.>
Leila, por sua vez, diz que é uma fã de datas para parar e pensar: desde aniversário até o Ano Novo. Ela tem a sensação de que em 2020 os planos foram interrompidos e foi vivida uma vida completamente diferente do esperado. Foram muitas dores, muitas perdas e essa coisa do Ano Novo de permitir desejos, sonhos e faíscas de boas energias que ficaram apagadas, ou deixadas de lado, durante todo o 2020 por conta da pandemia."Eu encaro esse período como uma oportunidade, assim como outras datas ou marcos pessoais", diz Leila.Milena, por sua vez, pensa muito nas crianças. Para 2021, o que ela mais deseja é que seu filho possa voltar a viver normalmente. A publicitária nem pensa muito nos adultos, acredita que gente grande tem a capacidade de se adaptar melhor. No entanto, quando o assunto são os pequenos a coisa muda.>
"É uma tristeza muito grande olhar pra meu filho e ver que ele está em casa o dia inteiro (...). Criança precisa de outra criança, estar em coletivo. Criança aprende com o corpo, vendo o outro, pela repetição de coisas legais e não legais. O que eu queria pra 2021 era uma perspectiva de que as crianças teriam a vida de volta", disse Milena. Por conta do coronavírus, Milena passou o ano novo longe do filho de 4 anos (Foto: Acervo Pessoal) Em geral, o desejo de muita gente é ter a vacina. Principalmente àquelas pessoas que deixaram os próprios desejos e saudades do lado para ficar mais em casa para proteger a si e seu entorno. O representante comercial Moacir Rodrigues virou o ano com seu filho, sua irmã e sobrinha - que passaram a morar com ele por conta da pandemia. Ele lamenta o fato de não conseguir encontrar sua família como era o planejado.>
A advogada Carolina Neris, 25, virou um ano em casa pela primeira vez. Fazendo companhia a seus pais. Ela diz que nem vai se arrumar, mas ficou no aguardo do ano virar porque 2020 "já foi tão tenso que nem vale a pena passar o ano dormindo. Perde um pouco da emoção". O maior desejo para este ano de 2021 é continuar protegida do vírus junto à sua família. E que a vacina venha o mais rápido possível. Família Neris posa para foto dentro de casa (Foto: Acervo Pessoal) E para aqueles que dizem não conseguir ficar sem aglomeração, o Ano Novo da vendedora Maria Veloso, 22, mostra que é possível espairecer um pouco ao lado de alguém importante e sem aglomerar: ela virou o ano assistindo à série Bridgerton, lançada na Netflix e baseada na série de livros de mesmo nome escrita por Julia Quinn que acompanha o competitivo mundo da alta sociedade da Regência Britânica. Um pouco antes da virada, ela dizia que já estava na expectativa de dormir antes mesmo dos fogos estourarem. E está tudo bem assim, também.>
2021 começou com o recado de que é possível se virar e ficar quietinho em nome de um bem maior. Um bem maior que vai chegar, com vacina, recuperação e aglomerações livres e seguras do jeito que a gente gosta e sabe fazer tão bem. Um ano que inaugura uma nova década: de esperança, aprendizados e resiliência, por que não? Feliz ano novo!>