Antes da suspensão, 21 grávidas receberam vacinas de Oxford em Salvador 

Segundo Sesab e SMS, não há registro de relatos adversos graves 

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  • Marcela Vilar

Publicado em 12 de maio de 2021 às 05:15

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação/Sesab

Antes da recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab) suspender a aplicação de doses da vacina contra covid-19 da fabricante Oxford/Astrazeneca em grávidas, Salvador já tinha imunizado, pelo menos, 21 gestantes. Todas elas receberam a primeira dose e foram incluídas posteriormente no Plano Nacional de Imunização (PNI).  

Porém, esse número não considera as outras fases da vacinação. Isto é, as profissionais de saúde, pessoas com comorbidades, integrantes das forças de salvamento, etc. O levantamento só leva em conta a vacinação desse grupo prioritário das gestantes e puérperas, que começou na última sexta-feira (7). 

“Algumas grávidas acabaram se vacinando, mas não usaram o direito de grávida, elas se anteciparam em outras categorias e isso está fora do nosso controle”, pontua o secretário da saúde de Salvador, Leo Prates.   

Foi o caso da nutricionista Louise Tiúba, que se vacinou no dia 27 de abril, por ser profissional de saúde. Fizeram exatamente 15 dias, ontem (11), que ela se vacinou com a primeira dose. “No dia que tomei, senti o corpo mole, dolorido e tive um pouco de febre e enjoo”, relata Louise.  

Ela pontua que o dia também foi cansativo, o que pode ter acentuado os efeitos da vacina. “Foi um dia super cansativo, acordei cedo, fiquei quatro horas na fila da vacina, fiquei de 7h da manhã até 21h da noite em pé, fazendo coisa. Já acordei melhor no dia seguinte, só com um pouco de dor de cabeça”, conta.  

Grávida de oito meses da primeira filha, Yasmim, ela não se arrepende de ter tomado a vacina, mesmo após a suspensão da Anvisa. “Acho extremamente importante para proteger não só a mim, mas minha filha. E a gente não sabe se a mulher no Rio de Janeiro morreu por conta da vacina. Acho que se fosse para ter efeito colateral grave, eu já teria tido nos primeiros dias. Estou com o pensamento positivo”, pondera Tiúba.    Por ser nutricionista, Louise, que está grávida de 8 meses, se vacinou no dia 27 de abril. Crédito: Acervo Pessoal.  Assim como Louise, nenhuma das gestantes teve complicações graves pela vacina até agora, de acordo com o secretário de saúde. “Estamos abrindo um site para que elas registrem as reações adversas, rezando para elas não terem, e para a gente acompanhar de perto. Até agora, em Salvador, tivemos relatos de algumas reações adversas, mas nada grave”, explica Prates.   

Ele ressalta que as reações adversas são extremamente raras e que, por erro, essas 21 grávidas receberam a vacina da fabricante não recomendada. Salvador inclusive se antecipou, segundo ele, disponibilizando as doses da Pzifer para este grupo.   

“Por segurança, a Anvisa mandou suspender, mas fizemos até antes em Salvador. Por erro, no dia 7 de maio, foram vacinadas 21 grávidas com a Astrazeneca, porque no ponto de vacinação tinha Oxford e Pfizer. Não há outros casos desde o dia 8 de maio”, garante o secretário. 

A Secretaria Municipal da Saúde de Salvador (SMS) orienta que as gestantes que receberam outro imunizante, que não Pfizer, devem procurar de imediato a Secretaria e relatar os sintomas adversos através do site reacoesadversascovid.saude.salvador.ba.gov.br/. A pasta ainda salienta que as gestantes têm hoje pontos exclusivos de vacinação em Salvador apenas com aplicação do imunizante Pfizer. 

A orientação da Anvisa se baseia na indicação da bula da vacina da Oxford/AstraZeneca, que não recomenda o uso da vacina por gestantes sem orientação médica. O uso off label de vacinas, ou seja, em situações não previstas na bula, só deve ser feito mediante avaliação individual por um profissional de saúde que considere os riscos e benefícios da vacina para a paciente. 

Em nota, a Anvisa explicou que a medida veio após uma suspeita de evento adverso grave de acidente vascular cerebral hemorrágico ocorrido e que resultou em óbito fetal e da gestante. Até a tarde desta terça-feira (11), não havia outros eventos adversos graves envolvendo gestantes que tenham sido notificados para a Anvisa.

Mais de 4 mil grávidas receberam Oxford na Bahia  Segundo a Sesab, foram 4.707 gestantes e puérperas que tomaram a vacina de Oxford com a primeira dose. A pasta diz que não há relatos de efeitos adversos graves e que apenas a vacina de Oxford/AstraZeneca não será administrada em gestantes. Outras 35 mulheres deste grupo prioritário tomaram a Coronavac, produzida pelo laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, em São Paulo, e 263 com a Pzifer, totalizando, até agora, 5.005 vacinadas.  

“O grupo de gestantes deverá continuar sendo imunizado com as vacinas da Pzifer e a Sinovac/Butantan. O risco atribuído à vacina da Oxford de causar trombose cerebral venosa vem sendo muito específico dessa vacina. Não há porquê, neste momento, se acreditar que essas outras vacinas causarão estes eventos adversos”, tranquiliza o secretário da Saúde da Bahia, Fábio Vilas-Boas. 

Vilas-Boas explica que, até segunda ordem, as mulheres que tomaram a primeira dose da vacina de Oxford não devem tomar a segunda. “Essa decisão vai ter que ser tomada entre a Anvisa e o fabricante. A princípio, até que se defina isso em nível internacional, ao longo dos próximos 60 a 90 dias em que elas aguardam a segunda dose, as doses não deverão ser reaplicadas”, esclarece o secretário.  

Em São Félix, cidade a cerca de 130 km de Salvador, foram vacinadas 9 gestantes, sem registro de efeitos colaterais. Segundo a prefeitura do município, elas foram orientadas a procurar uma unidade de saúde se sentiram algo. Em Cruz das Almas, 75 grávidas foram imunizadas, também sem complicações. Já em Senhor do Bonfim, no Centro-Norte da Bahia, algumas das 22 gestantes vacinadas sentiram efeitos colaterais leves, como dor no local onde foi dada a vacina, e estão sendo monitoradas. 

Efeitos adversos graves são raríssimos, dizem especialistas  A infectologista pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Fernanda Grassi tranquiliza sobre os possíveis efeitos adversos da vacina de Oxford/Astrazeneca. As chances de possível trombose é de quatro em um milhão, segundo ela. “É um evento extremamente raro, mais frequente em mulheres, e essas ocorrências de trombose foram associadas a Astrazeneca, mas essa relação ainda precisa ser avaliada, para entender qual foi a causa do óbito antes de dizer que foi a vacina que causou isso”, argumenta a pesquisadora. 

Ela afirma que as grávidas e puérperas não foram incluídas nos estudos clínicos para a confecção da vacina. “A vacina Astrazeneca foi estudada em um número muito pequeno de gestantes para determinar o aparecimento de reações nesse grupo. Eram mulheres que estavam grávidas e não sabiam ou engravidaram depois. No entanto, a gente não imagina que vá agir de uma forma diferente nas grávidas, que ela vai ser menos eficientes ou causar mais efeitos”, explica Fernanda.  

A imunologista relembra que as grávidas, quando contraem covid-19, desenvolvem sintomas graves. “Elas apresentam várias alterações, e é um risco extremamente alto para a mulher e o bebê, inclusive associado a aborto espontâneo. A gravidez altera muito a homeostase, mas todas as três vacinas aplicadas no Brasil são seguras”, assegura Grassi.  

O imunologista e professor da UniFTC Celso Sant’Ana defende que a Anvisa agiu corretamente em suspender a vacinação do grupo, mas reforçou que as vacinas são extremamente seguras. “Não existe nenhuma vacina ou medicamento que seja 100% isento de efeitos colaterais, mas a maioria deles são leves, desprezíveis, como dores no local, vermelhidão, febre baixa, dor de cabeça, e passam rapidamente. Colocando na balança, é preciso continuar confiando nas vacinas, elas são extremamente seguras e eficazes e são uma das únicas armas, além das outras medidas, capazes de combater essa terrível doença”, defende Sant’Ana.  

Segundo ele, somente cinco casos de trombose foram registrados no Brasil até então. O risco é entre 0,001% e 0,004%. Já para as mulheres que tomam anticoncepcional, por exemplo, essa taxa é de 0,005%. O que ocorre é uma redução do número de plaquetas por uma resposta imune contra à vacina, fazendo com que se formem coágulos. O que chamou a atenção dos pesquisadores foram os lugares incomuns das tromboses, no cérebro e abdômen, explica Celso.  

“É uma reação inesperada, imprevista, que nem sequer foi descrita na bula como efeito colateral. Só se foi conhecer agora, quando você amplia a aplicação da vacina para um universo de milhões de pessoas”, completa. O imunologista ainda diz que não são só as grávidas que podem ter complicações, mas qualquer outra pessoa. As puérperas também não são grupo de risco para desenvolver trombose. “Elas oferecem um efeito protetor para a criança”, garante Celso.  

O Ministério da Saúde não respondeu ao CORREIO antes do fechamento desta matéria.  

*Sob orientação da subchefe de reportagem Monique Lobo