Após rompimento de barragem, baianos ainda esperam reconstrução de casas

Em Coronel João Sá, são 102 residências condenadas; em Pedro Alexandre, são 32, por enquanto

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  • Mario Bitencourt

Publicado em 7 de agosto de 2019 às 05:15

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação Movimento dos Atingidos por Barragem

Moradores das cidades de Coronel João Sá e Pedro Alexandre - ambas no Nordeste da Bahia -, que tiveram suas casas invadidas pelas águas após rompimento da barragem do Quati e outras pequenas represas, ainda não sabem quando terão dias melhores. No domingo (11) completa um mês do acidente que deixou mais de 130 imóveis inabitáveis.

De acordo com a Prefeitura de Coronel João Sá, há 102 residências condenadas pela Defesa Civil devido ao risco de desabamento. Os 319 moradores desses imóveis estão em quatro escolas municipais, cujos alunos tiveram de ser remanejados para outras unidades para não ficarem sem aulas.   Em Pedro Alexandre, também segundo a Prefeitura, ainda continua a contagem das casas que estão condenadas. Até o momento, são 32 imóveis que não podem ser habitados. Neles moravam 128 pessoas, e a maioria preferiu ir para casas de parentes.

Coronel João Sá e Pedro Alexandre receberam, respectivamente, R$ 265,3 mil e R$ 149,4 mil da Defesa Civil Nacional para ajuda imediata aos moradores, com a compra de kits com material de higiene (geral e pessoal) e cestas básicas.

A cidade mais atingida foi Coronel João Sá, cidade de 15 mil habitantes e onde o prejuízo estimado foi de R$ 10 milhões. Além dos desabrigados, houve ainda mais de 2 mil desalojados. O município recebeu também R$ 2,3 milhões para reconstrução da infraestrutura urbana e hídrica e na construção de uma nova escola. Estragos na Rua Velha, em Coronel João Sá (Foto: Divulgação Movimento dos Atingidos por Barragens) A dona de casa Elenildes de Jesus Barbosa Batista, 51 anos, perdeu todos os móveis da casa e disse que recebeu de ajuda apenas um guarda-roupa e uma cama, ambos doados por particulares. “Da Prefeitura, só veio cesta básica”, afirmou. 

Na casa, moram ela, o marido José Sabino Santos, que é guarda municipal, e mais dois filhos, um de 12 anos e outro de 29. Para dormir, o casal e o menino ficam na cama, e o filho mais velho, num “amontoado de travesseiros que improvisamos em cima de uma base, e ele deita e dorme”.

Elenildes é moradora da Rua 15 de Novembro, na parte baixa de Coronel João Sá, área mais atingida pelas águas. O momento da invasão da água ainda está gravado na memória dela:“Estava levantando os móveis, mas aí o nível da água subiu demais e derrubou o portão, entrando de vez na casa, não deu mais pra fazer nada”.Hoje, a dona de casa disse que se sente “meio apavorada, abalada, pois via a casa toda arrumadinha e agora sem nada”. Ela contou que gostava muito da cozinha que tinha, “com mesa e seis cadeiras, fruteira, fogão, geladeira, pia...”. Dona Elenildes ainda não ganhou geladeira e nem fogão. Ela recebe R$ 160 do programa federal Bolsa Família.

Também moradora de João Sá, a cabeleireira Josefa Lidiane dos Santos, 29, conta que três tios idosos tiveram as casas inundadas e perderam tudo. No momento, eles estão ficando em casas de parentes porque não têm condições de ficar nos imóveis sem ter os bens que precisam para sobreviver.

“Até o momento, também só receberam cestas básicas por parte da Prefeitura, estamos contando mais com ajuda de outras pessoas de fora”, disse ela, cuja casa não foi atingida. “A cidade ainda está muito abalada com a situação, por todo canto da parte baixa vemos sinais da destruição, ainda vai levar tempo pra reconstruir”.

O coordenador estadual do Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), Moisés Borges, fala sobre o desânimo dos moradores:“A maioria dos prejudicados são pessoas pobres que tinham apenas aquilo mesmo para sobreviver e, de repente, não têm mais nada. Vejo gente falar em desânimo para trabalhar e fazer outras coisas, e isso é um problema para o qual as autoridades ainda não se atentaram”, declarou.O Movimento está articulando com universidades públicas o auxílio psicológico aos atingidos. Outra ação, ele diz, é a realização de um diagnóstico mais completo da situação para que sejam tomadas também outras providências.

“Estamos fazendo um relatório mais abrangente sobre os prejuízos, sobretudo na zona rural. Verificamos que a Defesa Civil não tem registrado os prejuízos causados nas lavouras e criações de animais, muito dos quais morreram, como porcos, galinhas e frangos, caprinos e ovinos, vacas, além da produção de milho”, disse Borges.

Ele observa que a barragem do Quati, que agora está seca, “antes alimentava os moradores com seus peixes, os quais eram criados há muitos anos, justamente com o fim de alimentar a população, sobretudo em épocas de seca e baixa produção agrícola. Os peixes eram uma das principais fontes de proteína deles”.

Na opinião do coordenador do MAB, é preciso a construção de uma política estadual de direitos dos atingidos por barragens, “já que elas sempre são motivo de conflitos nas áreas onde são instaladas”.

Outra demanda necessária, ele continua, é a criação de “uma política de segurança para monitorar as obras, ver situação de riscos e planejar rotas de fuga e salvamento”, o que já foi passado para o Ministério Público da Bahia (MP-BA), em reunião nessa segunda-feira (5).

Responsável pelo caso, a promotora ambiental Luciana Koury informou que deverá entregar hoje um relatório sobre a situação, para poder cobrar as providências do governo do estado.

“É importante garantir a reparação para essas famílias atingidas, não só material, de bens e reconstrução de casas, mas também o atendimento psicológico. É uma reparação que precisa ser integral, e para que isso ocorra todos os entes públicos devem se envolver”, disse a promotora.

Ações oficiais                   Por meio da assessoria de comunicação, a Prefeitura de Coronel João Sá declarou que “está fazendo reparo nas estradas, melhorias em escolas com muros danificados e calçamentos de ruas”. Diz que “está esperando resposta do governo do estado para fazer o cadastramento das pessoas que serão beneficiadas com o aluguel social e verba para construção das casas condenadas pela Defesa Civil”.

Em Pedro Alexandre, a coordenadora da Defesa Civil, Carla Leão, informou que deve ficar pronto este mês o relatório completo sobre as casas que foram danificadas na cidade. “Como são áreas rurais e em locais distantes, tivemos algumas notificações que ocorreram recentemente e temos de verificar uma por uma”, declarou.

As prefeituras de Coronel João Sá e Pedro Alexandre informaram que não foram registrados surtos de doenças por conta do problema nas cidades. A Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab) foi procurada para comentar o assunto, mas não respondeu.

Coordenador da Superintendência de Proteção e Defesa Civil (Sudec), Paulo Sérgio Menezes Luz informou que aguarda a conclusão do relatório de Pedro Alexandre para encaminhá-lo ao Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) e solicitar a verba. O MDR informou ainda que Coronel João Sá já pediu mais recursos e que o pedido está em análise.

“Só podemos dar nosso encaminhamento com esses relatórios. A situação emergencial já está reconhecida e já foram liberados recursos”, falou Luz, que diz que outra frente de trabalho que está sendo realizada é um estudo sobre uma poligonal que dirá quais são as áreas de maior risco próximo ao rio.

“Vamos fazer uma categorização das áreas de risco e assim melhor orientar os moradores sobre os problemas que podem ocorrer, depois poderemos elaborar rotas de fuga, locais que são indicados como seguros etc.”, afirmou ele.