Arcebispo reúne documentos que resgatam a trajetória da Igreja Católica em Salvador

Dom Murilo Krieger lança livro nesta quinta-feira (28)

Publicado em 28 de novembro de 2019 às 05:50

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/CORREIO
Brasão - Registro do significado do brasão da Arquidiocese de Salvador. Documento foi escrito em 1955. Antes da posse de Dom Murilo, Brasão estava esquecido por Marina Silva/CORREIO

A cidade de Salvador e a Igreja Católica no Brasil nasceram juntas, afirma o arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil, dom Murilo Krieger. Inclusive, foi na capital do estado que foi criada a Diocese de São Salvador da Bahia, a primeira do país, em 1551. A história da circunscrição eclesiástica é contada desde o surgimento em textos guardados pela igreja. Parte desses documentos foi reunida por dom Murilo no livro “Documentos de fundação e outros registros da Arquidiocese de São Salvador da Bahia Sede Primacial do Brasil”.

A obra vai ser lançada nesta quinta-feira (28), às 18h, na Instituto Feminino da Bahia, no Politeama. O documento mais antigo do livro, a Bula de Criação (Super Specula Militantes Ecclesiae) da Diocese foi fruto de muita procura. Dom Murilo iniciou a busca pelo texto no final de 2010 para se preparar para nomeação para a arquidiocese. “Quando quis preparar as palavras que ia dizer no dia 25 de março de 2011, busquei o que dizia a bula de criação da diocese, mas não a encontrei. Quando cheguei aqui, encontrei o texto em latim e o texto em português, mas não tinha a bula”, contou dom Murilo.O arcebispo só achou o documento em Portugal, no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, em Lisboa. Depois de oito anos da posse, uma cópia da Bula de Criação em latim foi parar no livro sobre a história da Arquidiocese de São Salvador da Bahia. Além deste documento, outros textos e informações também foram escolhidas para a obra. Ao todo, são 11 registros.

Outro documento destacado por Dom Murilo foi a Bula de Elevação da Diocese de São Salvador à sede metropolitana (Inter Pastoralis Officii Curas), que fez com que Salvador se tornasse Arquidiocese. Ou seja, o texto escrito pelo papa Inocêncio XI indica que a Diocese da capital baiana foi a primeira do país.

Mesmo com o documento do papa, a Arquidiocese ainda não era reconhecida como a primeira do Brasil. Só em 1980, o Decreto da Sagrada Congregação para os Bispos reconhece a Arquidiocese como a Sede Primacial e o seu Arcebispo como o Primaz do Brasil.

Segundo Dom Murilo, o reconhecimento deve estar atrelado à visita do papa João Paulo II a Salvador, em junho de 1980.“O papa esteve aqui em junho e, em outubro, saiu o reconhecimento. Tudo indica que o bispo daqui, dom Avelar, falou com o papa que ainda não havia essa oficialização de Salvador como Sede Primacial”, disse.O livro ainda traz um documento escrito em 1955 com significado do brasão da Arquidiocese de São Salvador. Não se sabe quando o símbolo foi confeccionado.

O documento foi apresentado para Dom Murilo logo após sua posse como arcebispo. Até então, não se sabia da existência do brasão, mas, naquele momento, antigo símbolo começou a ser usado.

Documentos que contam história Os registros, ou a inexistência deles, permitem relacionar o que ocorria com a igreja com a sociedade da época. Na Bula de Criação, por exemplo, é possível ler sobre a colonização brasileira.

“Quando o nosso caríssimo filho em Cristo João, pela bondade divina rei ilustre de Portugal e Algarves, querendo que fossem dilatadas as fronteiras das Religião Cristã na Região do Brasil que, pelo seu valor e de seus antepassados, foi submetida ao seu poder”, escreve o Papa Júlio III na Bula de Criação em referência ao processo de colonização do Brasil.

Já o último capítulo do livro, que traz os documentos de sagração de São Francisco Xavier como padroeiro de Salvador, pode contar um pouco sobre a expulsão dos Jesuítas do Brasil por Marquês de Pombal.

Dom Murilo explicou que houve uma ordem para eliminar os documentos sobre os jesuítas com a expulsão. Por esse motivo, São Francisco Xavier, que também era jesuíta, foi esquecido. “Ele era um santo muito popular, mas ficou mais de 100 sem ter referência aqui”, disse.

O coordenador do curso de História da Universidade Católica do Salvador e do laboratório de conservação e restauração Reitor Eugênio Veiga, Álvaro Dantas Júnior, contou que nem mesmo o laboratório, responsável por guardar os documentos da Arquidiocese de Salvador, possui textos da época da expulsão dos jesuítas.“Acreditamos que estes documentos foram levados. Os jesuítas faziam parte de uma ordem e tinham seus próprios arquivos”, pontuou.Todo o livro surgiu de uma busca de Dom Murilo no final de 2010. Apesar do tempo de pesquisa, o Arcebispo acredita que o trabalho ainda não esteja completo. “Minha ideia é que a partir daqui outros comecem a descobrir documentos importantes. Meu foco eram os momentos mais marcantes na história. Tem muito outro documento”, contou.

O livro é composto pela transcrição dos documentos da igreja em Português e em Latim. A obra do Arcebispo Dom Murilo Krieger pode ser adquirida na lançamento por R$ 50. O livro ainda vai ser enviado à escolas e a entidades da igreja.

Arquivo dos documentos Frágeis e até raros, os documentos da Cúria da Arquidiocese de São Salvador estão guardados no Laboratório de conservação e restauração Reitor Eugênio Veiga, na Universidade Católica do Salvador (Ucsal). Lá, estão cerca de 16 mil papéis, segundo o coordenador do laboratório, Álvaro Dantas Júnior.

São registros de nascimento, casamento, batismo e até documentos históricos da Arquidiocese que estão sob a proteção da universidade desde 2002, quando foi firmada uma parceria entre a Cúria e a Ucsal.

Um dos documentos guardados no local é a certidão de batismo da Santa Dulce dos Pobres, a primeira brasileira a ser canonizada pela igreja católica. No século 20, quando Irmã Dulce foi batizada, já cabia ao estado os registros de nascimento, morte e casamento. Entretanto, estas certidões eram feitas pela igreja até a proclamação da república, em 1889.

No local, os documentos, que chegam a datar do século 16, também são restaurados. A ideia era que esse arquivo funcionasse no Palácio Arquiepiscopal de Salvador, na Praça da Sé. Entretanto, o local não tinha condições de arquivar os registros.“Pela umidade e a maresia, o palácio não era adequado para guardar documentos históricos de grande importância e tão antigos”, explicou Dantas Júnior.O palácio foi restaurado e vai ser inaugurado no dia 6 de dezembro deste ano. No início das intervenções, em ano de 2014, a estimativa era que as obras durassem dois anos.

Com a reabertura, o local vai funcionar como um museu da história da Arquidiocese de Salvador e vai expor documentos históricos, como a Bula de Criação presente no livro de Dom Murilo.

“O andar de baixo, vai ser para expor os documentos, não para restauração. No segundo andar, vai ter um museu e no terceiro, a sala de atendimento do bispo”, contou o Arcebispo de Salvador.

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*Com orientação do chefe de reportagem Jorge Gauthier