Arquidiocese de Salvador reafirma proibição de casamentos católicos fora de igrejas

Em nota à comunidade este mês, arcebispo de Salvador fala da não validade das cerimônias

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  • Gabriel Amorim

Publicado em 20 de novembro de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Mercury Fotografia/Divulgação

Quando chegou o momento de oficializar a união, a advogada Clara Braz, 33 anos, e o engenheiro químico Ueriton Figueiredo, 33, esbarraram em um dilema: o casamento dos sonhos, realizado dentro da Igreja, não cabia no orçamento do casal. “Fazer na Igreja representaria um custo adicional porque eu ia precisar ter gastos com duas decorações, então, procurei o melhor custo-benefício”, conta a noiva, que se casou em um espaço para eventos no Imbuí. A solução encontrada pelo casal, no entanto, não é reconhecida pela Igreja Católica Apostólica Romana. Casamento de Clara Braz e Ueriton Figueiredo (Foto: Mercury Fotografia / Divulgação) Em nota que se tornou pública nessa terça-feira (19), o arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil, Dom Murilo Krieger, reafirmou a impossibilidade de realização de matrimônios em espaços que não sejam igrejas (matrizes ou capelas). Assinada no dia 11 deste mês, a nota esclarece, ainda, que não são considerados válidos os casamentos realizados em fazendas, salões, clubes ou residências e capelas particulares.

“Chamamos a atenção para celebrações matrimoniais que acontecem, por vezes, fora de igrejas: elas não são presididas por sacerdotes católicos apostólicos romanos (isto é, em comunhão com o Papa), mesmo que tais celebrantes usem (indevidamente) vestes, ritos e símbolos católicos. Para a Igreja Católica, tais celebrações matrimoniais não têm validade”, informa o comunicado. 

A celebração por um padre católico não vinculado à igreja apostólica romana foi justamente a solução encontrada por Clara e Ueriton, que completaram neste mês um ano de casados. “A gente sabia que um padre apostólico romano não sairia da igreja. Para a gente, ser católico já era suficiente”, explica a noiva. O matrimônio foi celebrado pelo padre Ozeas Araújo Nascimento, sacerdote da chamada Igreja Católica Apostólica Independente.

“Por ser a maior igreja, quando se fala de igreja católica, as pessoas costumam associar à apostólica romana, mas existem outras igrejas católicas com algumas diferenças”, afirma ele. Entre elas, a oportunidade para divorciados se casarem novamente e fazer as celebrações fora dos templos, por exemplo.

A Igreja Independente divulgou seu posicionamento: “Acreditamos que o matrimônio e demais sacramentos podem ser realizados nos nossos templos e também em espaços apropriados, sabendo que não é o templo apenas que determina a validade ou a unção de uma determinada celebração, mas em última análise, a intenção daqueles que recebem tal sacramento”.

Já para Dom Murilo, o espaço físico é importante. “A Igreja cria todo um ambiente de oração, então, o espaço físico para nós é importante. Em toda parte está Deus, mas há lugares em que ele mesmo faz questão de realizar a força da sua presença”, explica. 

Dúvidas Dom Murilo esclarece ainda que a nota da Arquidiocese não traz uma nova determinação. “Na verdade, há séculos é proibido missa fora da igreja, e para nós era pacífico. Acontece que tem havido casamentos em salões, em fazendas, e as pessoas querem fazer o mesmo e vêm nos procurar questionando que uns podem e outros não. Toda vez temos de explicar que aquele casamento foi feito por um padre que não tem jurisdição, que não é da Igreja Católica.” O arcebispo diz que os interessados devem procurar uma paróquia, para tirar dúvidas.

A assessora de casamentos Michele Azevedo lembra que, em um ano de trabalho, por volta de 80% dos casamentos organizados são realizados fora de igrejas.

“Uma opção são as cerimônias ecumênicas, bênçãos não católicas. Apenas se o casal for católico apostólico romano praticante é que não tem jeito. Mas, muitas vezes, o casal só quer preencher essa necessidade religiosa da família, a bênção acaba suprindo”, conta a organizadora.

Michele diz, também, que a limitação de espaço não é o único fator que interfere na hora de realizar o casamento dos sonhos para seus clientes. “Tem igrejas que não estão mais permitindo fechar as portas, que não aceitam músicas não religiosas, tudo isso interfere”, conta.

Michele foi a responsável pela realização do sonho da empresária Suzana Vidal, 34. Católica, ela queria que a cerimônia fosse realizada por um padre católico, mas tinha outros desejos. “Eu queria um casamento menos formal e de dia. Pesquisei muito e sempre caía no impedimento de precisar ser numa igreja, que não tinha espaços de festa”, detalha. Casamento de Suzana Vidal (Foto: Kiki Fotografia/ Divulgação) A solução foi mover a cerimônia para a Ilha dos Frades. “Achamos essa ilha que tinha uma pequena capela, e que um padre de Madre de Deus realizava também missas por lá. Foi perfeito, apesar de ter mais trabalho com o transporte de convidados, por exemplo. Faria tudo de novo”, conta Suzana.

Irmã da empresária, Samanta Vidal, 37,  havia casado anos antes e também levou a cerimônia para a praia. “Meu marido já havia sido casado e achávamos que, por isso, não poderíamos casar na igreja de fato”, explica a também empresária. Samanta e o marido casaram em Fernando de Noronha e foram abençoados por um celebrante não católico.

Quando soube que casamentos realizados fora das catedrais não eram reconhecidos, Samanta foi se informar. “Como no primeiro casamento ele casou numa chácara, fomos atrás e descobrimos que o casamento não tinha sido reconhecido pela igreja, então resolvemos fazer uma nova cerimônia”. Seis anos depois da primeira celebração, Samanta e o marido renovaram os votos, dessa vez, dentro da igreja. “Quando você é católico, receber o sacramento do matrimônio faz toda a diferença”, opina.

Aumenta número de casamentos em cartório na Bahia

Em 2017, foram registrados 64.578 casamentos nos cartórios de registro civil da Bahia. Pelo segundo ano consecutivo, os casamentos tiveram, no estado, um movimento contrário aos do resto país. Enquanto no Brasil houve redução de 2,3% no total de casamentos civis registrados (de 1.095.535 em 2016 para 1.070.376 em 2017), a Bahia teve o maior aumento absoluto no número de uniões formalizadas: de 60.734 em 2016 para 64.578 em 2017, ou 3.844 casamentos a mais realizados em um ano (alta de 6,3%).

O número absoluto de católicos e sua participação na população caiu em dez anos: de 9.682.822 (74,0% da população) em 2000 para 9.158.613 (65,3%) em 2010.

*Colaborou Marina Hortélio. Com supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier