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Da Redação
Publicado em 20 de setembro de 2021 às 09:15
- Atualizado há um ano
No país do futebol, metáforas que envolvem o esporte podem ser uma ótima ferramenta de comunicação. As pessoas entendem mais facilmente e se sentem mais confortáveis quando temas complexos são explicados através de frases como “o Bahia não tem culpa de ter a maior torcida”. Mas, quando a metáfora é mal feita, pode confundir ou até revelar mais do que se pretende. É o que ocorre com as recém famosas “quatro linhas da Constituição”.
A nossa Constituição tem 250 artigos, sem contar as Disposições Transitórias. Nas suas milhares de linhas, nenhuma fala no exército como “poder moderador”. Só existem três poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. Cada um é responsável por parte do controle da atividade dos outros e de todas as instituições. A Carta Magna prevê instituições que, pela natureza das suas funções, são autônomas e não integram nenhum dos poderes. Exemplos são a Defensoria Pública e Ministério Público. Outras, como os tribunais de contas e as universidades, integram poderes, mas com autonomia. Nenhuma, porém, é moderadora. Isso é coisa do Império.
A Constituição não prevê autonomia para as forças armadas, não as trata como poderes, não as trata como moderadoras e não permite que elas interfiram na política. A razão é simples: como o nome diz, elas estão armadas. Política é a arte do diálogo, do convencimento. No Estado de direito, não se faz política com tanques, nem com revólveres. Militares obviamente têm convicções sociais e partidárias, pois são cidadãos e são inteligentes. Mas, em uma democracia não pode haver mistura entre essas convicções e as suas atuações profissionais. Forças armadas devem proteger o país contra inimigos externos. Intervenção militar é golpe. É ataque contra o próprio povo.
Na crônica esportiva, a expressão “dentro das quatro linhas” se refere ao espaço físico e não ao respeito às regras do jogo. Dentro das quatro linhas, há faltas o tempo todo. Quantas brigas, carrinhos por trás e cotoveladas acontecem em campo? O campo da Constituição brasileira é o Brasil inteiro. Quando alguém sugere usar as forças armadas para fechar ou pressionar um dos poderes, viola as regras. Assim como há quem aplauda a agressão de um Pelé, há quem aplauda a ameaça de golpe de um Zé Bugué.
Talvez, o presidente se refira ao football americano. Lá, cada equipe tenta ganhar espaços do campo, para começar o próximo lance mais perto da sua meta. Nesse sentido, podemos interpretar que um político que louva a ditadura militar e não sofre nenhuma consequência ganha jardas no ataque à democracia. À medida que vão se naturalizando bandeiras como a homofobia, o racismo, o desrespeito aos povos indígenas, homenagens a torturadores, a ameaça de fuzilar adversários, a disseminação de informações sabidamente falsas e acusações sem provas contra as urnas, mais linhas são conquistadas .
Agora quando alguém promove ato público, com recursos públicos, falando em não obedecer decisões judiciais e xingando ministros do STF, resta pensar em quantas jardas ainda restam. Ah! Esqueci de contar. O objetivo no futebol americano é romper todas as barreiras defensivas, chegar ao final do campo e finalmente conseguir sair das quatros linhas. Aí já era. Touchdown.
Rafson Ximenes é Defensor Público Geral da Bahia