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Gil Santos
Publicado em 29 de setembro de 2021 às 06:30
- Atualizado há 2 anos
O engenheiro civil Rafael Lordelo, 27 anos, é especialista em Estrutura de Concretos e Fundações, área pela qual é apaixonado, mas atualmente atua no departamento de qualidade de uma construtora em Salvador. O emprego foi um desdobramento do estágio que ele iniciou em 2015 e resultado de muito esforço. Apesar de não estar desempenhando exatamente a atividade para qual é especializado Rafael pode se considerar um privilegiado por estar atuando na área em que é formado.>
Uma pesquisa nacional divulgada, nesta quarta-feira (29), pela Federação da Indústria do Estado do Ceará (Fiec) com apoio da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), revelou que a Bahia passou de 6ª para a 13ª posição na inserção de pessoas com pós-graduação no mercado de trabalho, na comparação com o último levantamento da instituição, realizado no ano passado.>
Confira a pesquisa>
O Índice de Inovação dos Estados está na terceira edição e apontou algo que Rafael já sabia: que está cada vez mais difícil conseguir uma colocação no mercado, mesmo para quem tem mestrado ou doutorado.>
“Fiz essa especialização porque é uma coisa que eu gosto. E se um dia eu quiser trabalhar como autônomo será nessa área. Ingressei como estagiário e estou na área até hoje, mas está bem difícil para quem é de fora, para quem não ingressou no mercado na época da faculdade, e para quem não tem experiência. As empresas não estão comportando mais profissionais e as pessoas estão tendo que ser autônomas. O mercado está saturado”, disse.>
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A pesquisa divulgada ano passado apontava a Bahia como primeira colocada entre os estados do Nordeste na contratação de pessoas com pós-graduação, com destaque para o número de mestres e doutores atuando na indústria de Construção Civil. Mas o jogo virou. O gerente de Produtos de Inteligência Competitiva Elton Freitas, um dos responsáveis pela pesquisa, explicou que o indicador avalia apenas mestres e doutores empregados na indústria e em atividades de Tecnologia da Informação e Comunicação (TICs).>
“Um dos principais gargalos no país é justamente a pouca participação desse perfil profissional no setor produtivo, geralmente eles estão na academia. Ter profissionais com pós-graduação no mercado é fundamental para que o conhecimento, muitas vezes preso na academia, transborde para o setor privado”, disse.>
Na Bahia, os setores dentro da indústria que possuem maior participação de mestres e doutores são: extração de petróleo e gás natural (4,4%), fabricação de produtos farmoquímicos e farmacêuticos (1,0%) e produtos químicos (0,7%). Em geral, a Bahia avançou duas casas em inovação no último ano, sendo o 14º entres os mais inovadores.>
O estudo apontou que em termos de formação de mão de obra houve melhora no estado. O capital humano, que é a avaliação da quantidade e da qualidade de profissionais nas áreas tecnológicas, avançou da 17ª para a 13ª colocação. Porém, o mercado de trabalho não conseguiu acompanhar essa mudança.>
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-BA), Wladimir Martins, algumas mudanças recentes no mercado contribuíram, no que diz respeito às exigências em termos de escolaridade. "Eu diria que houve uma flexibilização e priorização de mão de obra técnica em alguns setores, com abertura do mercado para os que tem curso técnico, então o perfil de busca foi alterado".>
Para ele, o "pós-cenário de pandemia" também levou ao achatamento de salários, devido à maior quantidade de mão de obra disponível. A redução de postos de trabalho e a redistribuição estrutural em termos de posições também se adequaram aos custos que as empresas podem ter no momento.>
"O cenário trouxe uma situação complexa, um período grande sem produção, o que onerou os custos e obrigou ambientes organizacionais a fazerem uma reestruturação em termos de posições. As posições se reduziram e agora, em muitos casos, tem uma pessoa fazendo a função de duas, por exemplo".>
Impacto Para o pró-reitor de Ensino de Pós-Graduação (Propg) e de Pesquisa, Criação e Inovação (Propci) da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Sérgio Ferreira, dois fatores pesaram nessa equação: a pandemia e o fechamento da Ford. A montadora era responsável por 12 mil empregos diretos e mais 60 mil postos de trabalho indiretos no estado, e entre os profissionais que atuavam na empresa estavam mestres e doutores de diversos campos da indústria.>
“Muitos de nossos alunos de mestrado e doutorado atuavam na Ford e nas diversas empresas que estavam ligadas a ela e foram impactados pelo fechamento. Além disso, a recessão financeira provocada pela pandemia atingiu as faculdades privadas e muitos alunos das engenharias, química, física, matemática, saúde e outras mais que eram absorvidos por essas instituições perderam os empregos”, disse.>
A pesquisa da Fiec ainda não avaliou os efeitos da pandemia no setor, e não contabiliza as atividades de docência. Outro fator apontado por especialistas foi a redução das atividades da Petrobrás que está fechando postos em diversas cidades baianas. >
Procurada, a Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb) não comentou a pesquisa.>
Crise acontece também em outras áreas A pesquisa do Observatório da Indústria se debruçou sobre as profissões voltadas para esse segmento, mas estudantes de outras áreas também relataram dificuldades para se inserir no mercado baiano.>
Em 2020, eram 2.916 bolsistas de pós-graduação na Bahia, segundo os dados da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). O levantamento mais recente da instituição sobre as titulações é de 2019 e aponta que 2.756 estudantes de diversas áreas se tornaram mestres e outros 780 doutores naquele ano.>
A pesquisa da Fiec é desenvolvida por economistas, cientista de dados e engenheiros, utiliza dados públicos para a análise de dois indicadores. Na dimensão Capacidades, são observados Investimento Público em C&T, Capital Humano (Graduação e Pós-Graduação); Inserção de mestres e doutores na Indústria, Instituições, Infraestrutura e Cooperação.>
Já na dimensão resultados, são analisados a competitividade global do estado, o nível de intensidade tecnológica da produção, a propriedade intelectual, produção científica e empreendedorismo. O estudo será disponibilizado para gestores públicos e para a sociedade civil com o propósito de identificar os principais gargalos e oportunidades relacionados à inovação.>