Bahia chega a marca de 1 milhão de casos de covid-19; confira raio-X

A cada 15 baianos, um se infectou; quase 21 mil morreram  

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  • Daniel Aloísio

Publicado em 28 de maio de 2021 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Nara Gentil/CORREIO

Em 6 de março de 2020 a Bahia registrou o primeiro caso do, até então, novo coronavírus. Um um ano e dois meses depois, o vírus já não é um completo desconhecido, embora ainda surpreende. Nesta sexta-feira, 28, o estado atinge a triste marca de 1 milhão de infectados.

Até a quinta-feira, 27, eram 999.463 doentes de covid-19, segundo balanço da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab). Como a média de contaminações diárias está em 4 mil casos, a marca de 1 milhão de contaminados deve ser ultrapassada nessa sexta. 

Os especialistas em Saúde no estado se preocupam, principalmente depois que o novo boletim do Observatório Covid-19 da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), divulgado ontem, manteve a Bahia no patamar de alerta crítico para aumento de contaminações e óbitos.

 “Isso é assustador. A pandemia toda assusta muito. O vírus é extremamente transmissível e não é à toa que estamos assim”, lamenta a epidemiologista Gloria Teixeira, integrante da Rede CoVida Ciência Informação e Solidariedade.  “Temos muita dificuldade para fazermos o distanciamento social. Só teria diminuído os números se tivéssemos feito um lockdown severo. Temos também muita pouca vacina”, completa a especialista.Proporcionalmente, a cada 15 baianos, um já foi contaminado pelo vírus. De março do ano passado para cá, 20,9 mil pessoas morreram de covid-19 no estado, diz o boletim epidemiológico de ontem da Sesab. Isso representa 2,09% dos infectados. 

“Quando comparamos com outros estados, vemos que a Bahia não é o pior de todos. Mas tudo isso preocupa. Nós precisamos de vacina e distanciamento”, acrescenta Gloria Teixeira.    

Até a quinta, 27, a Bahia tinha vacinado aproximadamente 3,3 milhões com a primeira dose e 1,5 milhão com a segunda, ou seja, cerca de 10% da população do estado completou o esquema vacinal. Segundo a Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim), para que a vacina tenha efeito coletivo, é preciso que cerca de 70% da população esteja imunizada.  

Quatorze meses depois do começo da pandemia, o CORREIO fez um raio-x da covid no estado. Confira nos tópicos a seguir:

1 - A cada 15 baianos, um pegou covid  

Se temos 1 milhão de casos e uma população de quase 15 milhões de pessoas, de acordo com os dados mais atualizados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), podemos afirmar que, a cada 15 baianos, um foi infectado pela covid-19. Dificilmente você não conhecerá alguém contaminado, mesmo que de forma assintomática, pela doença.  

Atualmente, algumas personalidades baianas contraíram o vírus. Esse é o caso do vereador de Salvador Claudio Tinoco, do presidente da Assembleia Legislativa da Bahia (Alba), deputado Adolfo Menezes e do reitor da Basílica Santuário Senhor Bom Jesus do Bonfim, padre Edson Menezes da Silva. Eles não precisaram ser internados.  

Já o vice-prefeito de Capim Grosso, Frank Neto, precisou ser intubado após complicações da doença. Ele está internado no Hospital do Subúrbio, em Salvador. E o padre Renato Minho, da Igreja Nossa Senhora do Pilar e Santa Luzia, em Salvador, está na UTI do Hospital Instituto Couto Maia.  

2 – Dos infectados, quase 21 mil morreram 

Nesses 14 meses de pandemia, 20.856 pessoas morreram, segundo a Sesab. "É uma situação dramática que vivemos no Brasil e na Bahia”, classifica Celso Sant'Anna, médico imunologista e docente de Medicina da Rede UniFTC.

Ele está preocupado que, com o passar dos dias, mais pessoas morram de covid-19, no que já vem sendo chamada de terceira onda da doença.  "Talvez esse nem seja o termo adequado. Vivemos uma onda contínua com repiques. Estamos num patamar muito elevado de casos e, agora, estamos entrando em mais um repique”.  Outros números do estado:

Recuperados - 960.258  Casos ativos - 18.349  Internados - 2.684  Ocupação dos leitos de UTI - 82%  Ocupação dos leitos clínicos - 73%  Quantas pessoas aguardam na fila da regulação por uma UTI covid - 159   Quantas pessoas aguardam na fila da regulação por um leito clínico - 93 

*Dados até a quinta-feira, 27 3 – Todas as cidades registraram casos e mortes 

Não há uma cidade na Bahia que não tenha sofrido as consequências da pandemia. Ainda em setembro de 2020, Novo Horizonte, na Chapada Diamantina, foi o último município do estado a registrar casos de covid-19. Em 27 de abril de 2021, Cravolândia, no Vale do Jiquiriçá, foi a última a registrar morte. A vítima foi a mãe da secretária de Saúde do município, Ednalva de Oliveira Mendes. Na lista dos municípios com mais casos ativos tem até as ‘cidades pequenas’ como Ribeira do Pombal, que está em lockdown completo até segunda-feira (31). As 10 cidades baianas com mais casos ativos:  

Salvador – 2.886  Feira de Santana - 546  Paulo Afonso - 515  Barreiras - 469  Ribeira do Pombal - 400   Itabuna - 385  Guanambi - 368  Lauro de Freitas - 314  Santo Antônio de Jesus - 265  Vitória da Conquista - 249

Fonte: Sesab 4 – Primeira morte em março de 2020

No Brasil, o primeiro caso do novo coronavírus foi registrado oficialmente em 26 de fevereiro de 2020, Quarta-Feira de Cinzas: um homem de 61 anos que voltou de viagem à Itália. Nove dias depois, em 6 de março, a Bahia registrou seu primeiro caso. Uma mulher de 34 anos, residente em Feira de Santana, que também tinha voltado da Itália.

Já a primeira morte por covid no Brasil ocorreu em 17 de março de 2020. O aposentado Manoel Messias Freitas Filho, 62 anos, em um hospital de São Paulo. Na Bahia, o primeiro óbito foi confirmado em 29 de março de 2020. O paciente era um homem de 74 anos que estava internado em um hospital privado. 

5 – Quase 50 mil casos  em profissionais da saúde

A cada 20 contaminados na Bahia, um é profissional de saúde. No total, segundo a Sesab, são 48.939 trabalhadores da área que ficaran doentes. Desses, a maioria são auxiliares ou técnicos de enfermagem, com 14.246 casos, seguidos dos enfermeiros com 8.706 e os médicos com 4.254 infecções.

O cenário, para o médico Celso Sant'Anna, é revoltante:  “Nós estamos dando nossas vidas para salvar outras vidas e, muitas vezes, não encontramos o amparo necessário e sequer o apoio para desenvolver o serviço. É preciso criar uma rede de proteção aos trabalhadores que estão entregando suas vidas para salvar outras. Não está havendo um olhar cuidadoso dos gestores sobre isso. Os profissionais de saúde estão em campo de batalha lidando com situações dramáticas e dificílimas”, argumenta.  Casos de covid em profissionais da saúde  (Gráfico: Sesab) 6 - Mais mortes e casos em 2021 que em 2020

Os cinco meses de 2021 já tiveram mais casos e mortes do que os nove de pandemia em 2020 (março a dezembro), na Bahia. Este ano, já ocorreram 11,7 mil mortes e 506 mil casos, enquanto no ano passado foram 493 mil casos e 9,1 mil mortes. “Nós estamos vacinando muito pouco. Os dados mostram que casos e mortes começam novamente a aumentar, o que pode ser um reflexo pontual das aglomerações do dia das mães, mas junto com a chegada de novas variantes e a proximidade das festas juninas, a perspectiva não é animadora”, diz a epidemiologista Gloria Teixeira.  7 – Quase metade dos doentes é parda

Dos contaminados, metade é parda, diz a Sesab. São 497.553 pessoas autodeclaradas nessa cor infectadas (49,78% dos doentes). Em seguida, 11,54% são amarelos, 10,58% brancos, 7,81% pretos e 0,24% indígenas. Outras 200 mil pessoas não registram cor, o que equivale a cerca de 20% dos doentes. Casos de covid-19 por raça/cor  (Gráfico: Sesab) 8 - Mais mulheres contaminadas, mais homens mortos

Na Bahia, quanto ao gênero das pessoas com casos confirmados, 54,92% são mulheres, 44,97%, homens. Em 0,11% das notificações não foi informado o genêro, de acordo com a Sesab. Quando se trata de óbitos, 11.625 homens (55,74%) morreram de covid, enquanto 9.231 (44,26%) mulheres foram vítimas da doença. Esse fenômeno, segundo a epidemiologista Gloria Teixeira, não é exclusivo do estado ou do país.  

“Ainda não conseguimos cravar o motivo disso, mas tem algumas hipóteses. Primeiro, elas cuidam mais das suas comorbidades indo mais ao serviço médico. Pode ser também que haja algumas diferenças no físico do homem ou ele demore mais para procurar assistência médica. Tudo isso são hipóteses. Fato é que se tem observado no mundo inteiro os homens morrendo mais”, disse. 

9 – Mais da metade dos mortos tinha comorbidade 

Cerca de 13 mil baianos mortos pela covid-19 tinham alguma comorbidade e não resistiram a doença, o que equivale a cerca de 63% de todas as mortes. A comorbidade que mais causou mortalidade foi a hipertensão arterial, mas também há óbitos entre os pacientes com diabetes, doenças cardiovasculares, obesidade e doença renal crônica.  

“Quando você entra em contato com um vírus novo, seu sistema imunológico é desafiado a gerar uma resposta. Quem tem comorbidade entra em campo com o exército desfalcado, pois o sistema imunológico já está afetado. E aí, quando vem um vírus como esse, eles são os mais afetados, explicando numa linguagem simples”, diz o professor Celso Sant'Anna.

Mesmo assim, ainda tem uma boa parcela da população de infectados (37%) que morre mesmo sem ter nenhuma comorbidade.  

“Há algumas hipóteses que explicam isso: às vezes o paciente jovem, sem comorbidade, o sistema imunológico dá uma resposta tão forte que se volta contra ele próprio. Às vezes, o vírus que contaminou é de uma cepa mais agressiva e por isso a pessoa sem comorbidade sucumbe. Mas ainda são hipóteses”, diz. Óbitos de covid por comorbidades  (Gráfico: Sesab) 10 - Adultos são os mais contaminados

Os mais contaminados pela covid-19 na Bahia são adultos de 30 a 39 anos. No total, são 236 mil pessoas com essa faixa etária que pegaram o vírus, seguidas logo depois pelos adultos de 40 a 49 anos (196 mil contaminados) e dos jovens de 20 a 29 anos (178 mil).  

No entanto, quando se observa a taxa de letalidade por faixa etária, os idosos são os que mais sucumbem à doença. Segundo a Sesab, 22,93% dos infectados com 80 anos ou mais faleceram. Dos que tem 70 a 79 anos, a letalidade foi de 12,45%. Já os de 60 a 69 anos, foi de 5,94%.  

Essa letalidade vai caindo conforme a faixa etária. Nas crianças, por exemplo, não chega a 0,5%. No entanto, a Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SMIP), doença associada à infecção por covid-19, agrava a situação das crianças contaminadas. Até o momento, 80 casos do tipo foram registrados em pessoas de 0 a 19 anos na Bahia. Desses, quatro  morreram Letalidade da covid por faixa etária  (Gráfico: Sesab) 11 - Região Leste é a que tem mais casos ativos 

A região Leste da Bahia é onde há mais doentes de covid-19 ativos: 5.522. Nessa região está localizada Salvador. Logo depois, a região Centro-Leste, onde fica Feira de Santana, segundo maior município da Bahia, tem 2,8 mil casos ativos. Em seguida, Sul, Sudeste e Nordeste completam a lista dos municípios mais contaminados em tratamento da doença.   Casos ativos de covid por região  (Gráfico: Sesab) 12 – Quanto maior a população, mais casos 

Os municípios com mais habitantes são também aqueles que tem mais casos confirmados de covid-19 desde o início da pandemia. Na ordem, Salvador e Feira de Santana, as duas maiores cidades da Bahia, são líderes em contaminação. Já itabuna, a sexta maior cidade da Bahia, aparece em terceiro no número de casos confirmados. No início da pandemia, em 2020, a cidade do Sul do estado viveu dias de colapso no sistema de saúde. Logo depois, Vitória da Conquista e Camaçari, respectivamente, a terceira e quarta maiores cidades da Bahia, ocupam a quarta e quinta colocações na lista de municípios com mais casos confirmados.   Municípios com mais casos de covid na Bahia  (Gráfico: Sesab) 13 - Cidades pequenas tem mais letalidade 

Embora as cidades grandes tenham mais casos de covid-19, as pequenas aparecem na frente na lista das que têm mais letalidade. Água Fria, no Centro-Norte baiano, é a líder, segundo os dados da Sesab. Lá, são 151 casos confirmados e 10 mortes, o que totaliza uma taxa de letalidade de 6,62%.  

Em seguida, os municípios de Brejolândia, Chorrochó, Rio do Pires, Ibiquera, Canavieiras, Santana e Iagaporã aparecem com letalidade acima de 5%. Na outra ponta, o município de Ibiassucê, no Centro-Sul do estado, é o que apresenta menor letalidade. São 429 casos confirmados, segundo a Sesab, e apenas uma morte.  

14 – A Bahia no ranking nacional 

Quando comparada com os outros estados brasileiros, a Bahia está em boa colocação que se refere às taxas de letalidade e mortalidade. No primeiro índice, que mede quantos contaminados morreram, a Bahia está atrás do Amapá, Santa Catarina, Roraima, Tocantins e Acre, que possuem letalidade menor do que os 2,1% daqui.  

No índice de mortalidade, que mostra a quantidade de óbitos por habitantes, a Bahia apresenta o segundo melhor resultado, atrás do Maranhão. Aqui, são 139,4 mortos por 100 mil habitantes. Os dois índices do estado são inferiores à média nacional.    Cidades baianas com mais letalidade por covid:

Água Fria - 6,62% Brejolândia - 6,20%  Chorrochó - 5,79% Rio Do Pires - 5,47% Ibiquera - 5,41% Canavieiras - 5,27% Santana - 5,12% Igaporã - 5,01% Malhada - 4,96% Nordestina - 4,44%15 – Cientista de dados alerta para aumento de casos

Reabertura das praias, redução do horário limite do toque de recolher e volta às aulas presenciais. O aumento da mobilidade da população baiana por causa de medidas como essas chamou a atenção do cientista de dados Isaac Schrarstzhaupt, coordenador na Rede Análise Covid-19. Ele faz um alerta mostrando que há tendência de aumento de notificações de novos casos para os próximos 15 dias em todo o país, inclusive na Bahia.  

Para Isaac, há possibilidade real de vivermos a chamada “terceira onda”. Embasando seu alerta, ele utiliza uma pesquisa da Universidade de Maryland em conjunto com o Facebook.  “Aleatoriamente, eles sorteiam usuários da plataforma e fazem perguntas relacionadas com a pandemia: se as pessoas estão sentindo sintomas, quais são e desde quando. Se ela diz que tem tosse, febre e falta de ar, esse dado entra instantaneamente. Não há atraso de notificação. O que os dados vêm nos dizendo desde metade de 2020 é que eles antecipam em 15 dias o que acontece no número real de notificação de casos pelas secretarias de saúde”, diz. Nesse momento, usuários do Facebook de todo o país estão reportando mais sintomas de covid-19 nessa pesquisa, o que somado ao aumento da mobilidade das pessoas com a flexibilização das medidas de isolamento, gera preocupação. “Estamos falando de uma alta forte. O alerta nesse momento preocupa, pois a ocupação dos hospitais não baixou. O medo é que esse aumento cause o colapso no sistema hospitalar”, explica.  

Esse cenário é observado no momento em que a Bahia já está vacinando. Até essa quinta-feira, aproximadamente 3,3 milhões de pessoas tomaram a primeira dose e 1,5 milhão a segunda, o que representa 10% da população do estado com esquema vacinal completo. Segundo a Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim), para que a vacina tenha efeito de forma coletiva, é preciso que 70% da população esteja imunizada. 

*Com a orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro.