Baiana ganha bolsa de estudos na Califórnia e cria vaquinha: 'Maior oportunidade da vida'

Liliane foi a única brasileira a conquistar uma vaga na instituição

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  • Fernanda Varela

Publicado em 6 de maio de 2019 às 18:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Evandro Veiga/CORREIO

Mulher, negra e baiana. Esse é o perfil da estudante Liliane Soares, 22 anos, única brasileira selecionada em uma disputa mundial para estudar na Universidade da Califórnia em Berkeley (UCB), na região do Vale do Silício, nos Estados Unidos. 

Natural de Salvador, Liliane se mudou há dois anos para Teixeira de Freitas, no Sul do estado, onde faz Bacharelado Interdisciplinar (BI) em Humanidades na Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB). Foi através da parceria entre sua universidade e o banco Santander, chamada Le Bridge Program, que ela foi escolhida para estudar fora do país.

"Eu vi no site da minha universidade que teria esse programa, me cadastrei para quatro bolsas diferentes, de acordo com meu perfil e fui chamada para duas delas. Fui selecionada para um curso de verão de três semanas e um curso com estágio não remunerado de 10 meses, de empreendedorismo e inovação. Disputei com gente da Itália, Espanha, México, Argentina, e fui a única brasileira", conta ela, que concorreu com gente do mundo inteiro a uma das sete vagas do programa. A Universidade da Califórnia é uma das mais difíceis do mundo de entrar, com apenas 17% de aceitação para quem tenta ser bolsista.

O curso de verão terá duração de 22 julho a 9 de agosto, enquanto o de 10 meses começa no dia 7 de agosto. Ambos serão ministrados na UCB. Ou seja, a estudante tem a possibilidade de usufruir das duas bolsas que conquistou. O sonho já começou a ser realizado, mas Liliane esbarrou em um grande problema: falta de dinheiro.

Liliane receberá uma ajuda de custo de 9 mil dólares do programa, que cobrem o valor das mensalidades da universidade, parte dos gastos com moradia e das passagens aéreas. "O problema é que o valor é insuficiente para viver lá por 10 meses. O custo de vida na Califórnia é muito alto. Além disso, para entrar nos Estados Unidos eu preciso pagar as taxas do visto, viajar para tirar um visto, já que Salvador não tem consulado, fazer um plano de saúde obrigatório e ter um fundo de garantia, que eles exigem", explica.

Para realizar seu sonho, Liliane criou uma vaquinha virtual para arrecadar R$ 35 mil - deste valor, 13% (R$ 4.550) ficam com o site de hospedagem da arrecadação de dinheiro. 

"O que eu estou pedindo é em torno de 7 mil dólares, valor mínimo necessário para entrar no país. Não tenho como pedir o dinheiro pra me manter lá. Não vou pedir R$ 100 mil em uma vaquinha. Pedi o mínimo para iniciar meu sonho. Se eu vou passar fome lá, não tem problema, mas eu preciso muito estudar. Eu me viro", garante ela, que ao entrar no país será obrigada a assinar um documento onde se comprometerá apenas a estudar, sem poder buscar empregos informais. Baiana precisa de R$ 35 mil para entrar no país (Foto: Evandro Veiga/CORREIO) Sonho Estudar na Universidade da Califórnia, hoje, é o maior sonho da vida de Liliane. Ela, que perdeu o pai quando tinha apenas um ano e foi criada apenas pela mãe, enxerga o estudo como uma forma de crescer na vida. "Minha mãe não tem formação, mas é quem mais me ensina, me incentiva. Eu preciso orgulhar ela e realizar esse sonho. É a maior oportunidade da minha vida. Essa oportunidade representa muito pra mim, eu preciso muito dessa ajuda", conta.

Sozinha em Teixeira de Freitas, Liliane se dedica apenas aos estudos. De férias, ela voltou para Salvador, para divulgar a vaquinha e visitar a mãe, a artesã Vera, que está desempregada. Ela conta que já precisou morar de favor e, durante toda a infância, escutou de amigos da mãe que precisava estudar para ter uma vida melhor. De tanto ouvir esse conselho, conta ela, se dedicou. Foi graças aos estudos, inclusive, que ela se deu bem nas entrevistas que fez.

Em 2014, por meio de uma parceria realizada entre o Colégio Estadual Thales de Azevedo, onde estudava, e a Associação Cultural Brasil-Estados Unidos (Acbeu), ela conseguiu uma bolsa de estudos no programa Access Program, destinado apenas para alunos da rede pública de ensino, e se formou.  "Isso já me ajudou a não precisar de uma carta de pró-eficiência, que é tipo uma comprovação que a pessoa precisa dar quando não tem curso de inglês". 

Caso realize o sonho de conseguir os R$ 35 mil da vaquinha, Liliane terá aulas teóricas e práticas com uma equipe multidisciplinar, que conta com empreendedores, advogados, publicitários, além de profissionais que falarão sobre capital de risco, investimentos, entre outros. Para a garota, é a chance de adquirir conhecimento e conhecer profissionais que podem lhe ajudar na sua carreira.

"Lá tem até protótipo de carro voador. Para mim isso era coisa que um tataraneto ia conhecer, sabe? Era algo muito distante. O nível de conhecimento lá é muito alto. Sem educação a gente é ignorante, fica fácil de alienar, manipular. Eu quero crescer profissionalmente, ainda mais agora, que estamos tendo cortes na educação", revela.

O CORREIO entrou em contato com o Santander para verificar quantos alunos se cadastraram em todo o mundo em busca de uma bolsa, mas como o programa foi tocado diretamente pela sede da instituição de Madrid, não foi possível obter uma resposta até a publicação desta reportagem.