Barbeiro que matou a facadas Mestre Moa do Katendê vai a júri popular

Capoeirista foi esfaqueado após discussão com motivação política; não há data para o julgamento

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  • Bruno Wendel

Publicado em 11 de abril de 2019 às 13:17

- Atualizado há um ano

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(Foto: Reprodução) Acusado de matar o mestre de capoeira Romualdo Rosário da Costa, o Moa do Katendê, 63 anos, o barbeiro Paulo Sérgio Ferreira de Santana vai à júri popular. Moa foi esfaqueado após uma discussão com motivação política no dia 8 de outubro do ano passado na comunidade do Dique Pequeno, no bairro de Engenho Velho de Brotas. O autor foi preso em flagrante. 

Paulo Sérgio foi denunciado pelo Ministério Público do Estado (MP-BA) à Justiça pelo crime de homicídio qualificado – as qualificadoras são futilidade e impossibilidade de defesa da vítima. Ele também foi denunciado pela tentativa de homicídio contra o primo de Moa, Germínio do Amor Divino, 51, que também foi esfaqueado na ocasião. Ele foi atingindo no braço direito.

Ainda não há previsão para a data do julgamento. “A gente está pedindo para que seja marcada a data com muita brevidade em razão às manifestações internacionais. Os alunos do Mestre Moa no mundo todo estão pedindo por justiça. Estamos correndo para que a gente possa dar uma resposta à sociedade brasileira e internacional para se dizer que haverá justiça”, declarou o advogado da família da vítima, Alonso Guimarães, assistente de acusação. 

Guimarães diz não ter dúvida de que o acusado será condenado. “Tenho plenamente convicção da condenação. Primeiro pelas provas dos autos que demonstraram que a morte da vítima foi proveniente da ação contundente das facadas desferidas pelo Paulo Sérgio, além dos depoimentos das testemunhas que reforçam toda a instrução, somadas à própria confissão do acusado. Ele poderá pegar pena de 12 a 30 anos de prisão só pelo homicídio contra o Mestre Moa", declarou. 

A notícia de que o acusado irá à júri popular foi comemorada pela família de mestre Moa. “Foi impactante, porque estamos tendo repostas muito rápidas. Acredito que no júri ele irá pegar a pena máxima. Foi um crime cruel, bárbaro contra uma pessoa idosa, que foi pega pelas costas, sem direito de defesa. Não satisfeito, ele ainda quis matar meu tio”, declarou Somonair dos Santos da Costa, filha de Moa. 

Júri Segundo o assistente de acusação Alonso Guimarães, a decisão da Justiça pelo júri popular foi dado no dia 25 de março, após a juíza tomar os depoimentos das testemunhas de acusação e defesa. Por meio da assessoria, o MP-BA confirmou que o caso vai para o Tribunal do Júri. 

Ainda de acordo com Guimarães, a decisão da Justiça cabia recurso. Paulo Sérgio é assistido pela Defensoria Pública do Estado (DPE). “Mas a Defensoria optou por não recorrer”, disse. Em nota, a DPE informou que “tem como missão constitucional assegurar ampla defesa, integral e gratuita, de qualquer pessoa que precise dos nossos serviços e, visando prestar a assistência jurídica de qualidade para nosso assistido, não nos manifestamos sobre os processos em casos como este, para não afetar/atrapalhar a defesa e o trabalho do defensor público responsável”. 

Paulo Sérgio segue custodiado no Complexo Penitenciário da Mata Escura. No entanto, em fevereiro deste ano, após uma audiência de instrução, parentes de Moa disseram ao CORREIO que estavam apavorados com a possibilidade de soltura do acusado. Após a audiência, eles foram informados que a DPE pediu a liberdade provisória de Paulo Sérgio. A Justiça negou.  Paulo Sérgio: preso desde outubro de 2018 (Foto: Marina Silva/Arquivo CORREIO) Crime O crime foi testemunhado por várias pessoas, entre elas o irmão de Moa, Reginaldo Rosário, 68. Ele contou que bebia com as vítimas, no Bar do João, quando o autor da facada começou a defender ideias do então candidato à presidência Jair Bolsonaro (PSL), ouvindo críticas do capoeirista que era um eleitor do Partido dos Trabalhadores (PT). Nove dia depois, o inquérito policial concluiu que Moa do Katendê foi morto por briga política.

O barbeiro Paulo Sérgio foi denunciado pelo Ministério Público estadual pelo assassinato de Moa do Katendê - homicídio por motivo fútil e sem possibilitar defesa à vítima. Ele ainda foi denunciado pela tentativa de homicídio contra Germino do Amor Divino Pereira, que tentou defender o capoeirista e também foi ferido. 

"Moa ponderou que era negro e que o cara ainda era muito jovem e não sabia nada da história. Moa disse ainda que ele tinha consciência do quanto o negro lutou para chegar onde chegou e o quanto Bolsonaro poderia tirar essas conquistas se chegasse ao poder", disse Reginaldo na ocasião.

Ainda de acordo com o irmão das vítimas, após a discussão acalorada, um dos irmãos pediu que Moa ficasse calmo, no entanto, após a situação ter sido contornada, o autor da facada teria ido em casa, retornou com uma peixeira e atacou a vítima nas costas.

"Foi tudo muito rápido. O cara foi em casa e voltou portando a arma. Chegou 'voando', atingindo meu irmão pelas costas. Foi muito difícil ver meu irmão naquela situação sem poder fazer nada", disse. Barbeiro chega escoltado por policiais na sede do DHPP, na Pituba (Foto: Marina Silva/Arquivo CORREIO) Prisão O barbeiro Paulo Sérgio foi preso no mesmo dia. Em nota, a Polícia Militar informou que foi acionada pelo Centro Integrado de Comunicações (Cicom), com informações de que dois homens tinham sido atingidos por golpes de faca e deslocou uma equipe para o local. Lá, os policiais receberam a denúncia de que o autor do crime teria fugido para um beco próximo e iniciaram as buscas.

"Os policiais avistaram um rastro de sangue que levava até uma casa e prenderam em flagrante o homicida escondido no banheiro. Ele já estava com uma mochila com roupas no intuito de fugir", informou a nota da PM.

O barbeiro, ainda de acordo com a polícia, foi levado para o HGE para ser medicado - pois estava com um corte no dedo, e depois foi apresentado no Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), na Pituba.

Com 1,80 m de altura, voz firme, careca e de cavanhaque, Paulo Sérgio Ferreira de Santana tinha se mudado do bairro do Nordeste de Amaralina para a localidade do Dique Pequeno, no Engenho Velho de Brotas, cerca de dois meses antes do crime.

Pai de dois filhos, foi morar em uma casa alugada ao lado da companheira, que já residia no bairro. Ele disse que não conhecia Moa do Katendê até o dia do crime. 

A delegada Milena Calmon, do Departamento de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP), que investigou o crime, descreveu o perfil do barbeiro como sendo uma pessoa intolerante e agressiva. 

Por ser novo na vizinhança, que fica nas proximidades da Arena Fonte Nova, nenhum morador mais velho o conhecia. Em depoimento à polícia, Paulo Sérgio disse que nunca tinha ouvido falar sobre o capoeirista que exercia forte influência cultural no bairro, promovendo atividades e sendo, inclusive, uma das principais lideranças do bloco de afoxé Badauê.