'Bem melhor que antes': novo Mercado São Miguel é inaugurado em Salvador

Estrutura existe desde 1965, foi destruída por um incêndio em 2017 e reconstruída

  • Foto do(a) author(a) Gil Santos
  • Gil Santos

Publicado em 5 de novembro de 2020 às 14:13

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Max Haack/Secom

Houve um tempo em que a Baixa dos Sapateiros era um dos lugares mais nobres de Salvador. Nos anos 1950, um garoto chamado Deco, ou Derivaldo Santana, corria as ruas para entregar nas casas e lojas de grife as quentinhas que a mãe dele fazia. A cozinha da trabalhadora ficava em um terreno de chão batido ao lado das barracas de outros vendedores. Pode não parecer, mas é desse jeito que Seu Deco, hoje com 82 anos, recorda do Mercado São Miguel. Espaço ganhou área de lazer (Foto: Max Haack/ Secom) A estrutura de mercado só surgiu mesmo em 1965, viveu os tempos áureos até o final dos anos 1980, e então caiu em abandono. Um incêndio, em 2017, pareceu encerrar de vez o destino do prédio, mas não foi bem assim. A prefeitura resolveu reformar o espaço e, nesta quinta-feira (5), Deco vestiu uma camisa com a imagem do arcanjo São Miguel e foi até o local para participar a entrega oficial do novo mercado.“Ficou muito bonito. Está mais amplo e arejado. Ficou bem melhor do que estava antes. Quando eu era menino isso aqui era outra coisa. Até os anos 1980 era ótimo, tinha muito movimento, mas depois começou a cair”, contou.Ele deu continuidade ao trabalho da mãe e até hoje vende almoço para os clientes no mesmo endereço, no número 151, da Avenida José Joaquim Seabra. Deco contou que estava vivendo nos últimos meses com o auxílio de R$ 270 pagos pelo município para os trabalhadores durante a pandemia, e através de doações de cestas básicas. “Agora, [com o mercado inaugurado] estou mais aliviado”, afirmou o octogenário. Como era o mercado antes da reforma (Foto: Arquivo CORREIO) Estrutura As mudanças na infraestrutura do novo Mercado de São Miguel são evidentes. Na entrada, existe uma rampa que leva aos boxes de artesanato do piso superior. Em baixo, do lado esquerdo foi criado um santuário para São Miguel e mais adiante um espaço para a capoeira.

Um piso de madeira leva ao pavimento dos fundos, onde ficam a maioria dos 40 boxes, oito bancadas de hortifruti, e seis restaurantes. Além disso, há sanitários masculino, feminino e para pessoas com problemas de locomoção, e estacionamento com vagas para até 30 veículos. O equipamento funciona inicialmente de segunda a sábado, das 10h às 16h. Por dentro, a estrutura também mudou (Foto: Max Haack/ Secom) O prefeito ACM Neto inaugurou o espaço, mas antes fez a entrega oficial do santuário, acompanhou uma apresentação de capoeira, outra dos filhos de Gandhi, e destacou a importância do novo equipamento na revitalização do bairro.“Tenho certeza que o Mercado de São Miguel também se tornará um ponto turístico da nossa cidade, valorizando ainda mais a Baixa dos Sapateiros e o Centro Histórico de Salvador. Organizamos um mix com produtos típicos, identificados com a Bahia, artesanato, bares e restaurantes, hortifruti, entre outros, para tornar o mercado voltado para vários gostos, o que nos dará movimentação aqui dentro”, disse o prefeito.Ele citou a reforma do terminal rodoviário da Barroquinha, do terminal do Aquidabã e a construção do camelódromo como exemplos de investimento na requalificação dessa região do Centro Histórico. Para o secretário municipal de Ordem Pública (Semop) Marcus Passos, é justamente a herança histórica que faz o mercado mais especial.  

“Esse é um mercado histórico para a cultura de Salvador, de tradição muito forte. Na década de 1970, era um comércio pulsante na cidade, mas que veio perdendo espaço ao longo dos anos. Nada mais justo do que requalificar um mercado importante para a cultura e para o comércio local. Ele resgata o antigo e traz novos equipamentos”, disse. Prefeito ACM Neto disse que reforma vai impactar no comércio vizinho (Foto: Max Haack/ Secom) Reforma O investimento na requalificação foi de R$ 5,1 milhões e as obras ficaram sob a responsabilidade da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Obras Públicas (Seinfra). O titular da pasta, Luciano Sandes, contou que foram 11 meses de trabalho, e frisou a importância econômica e cultural do espaço.“Esse é um novo mercado, surpreendente para todos que visitam. Ele está encravado no Centro Histórico de Salvador. Existe a questão cultural e econômica, e que se juntam ao turismo, porque o mercado tem uma série de atrativos turísticos, o que termina fomentando mais essa região e o comércio como um todo”, afirmou.O novo equipamento tem uma área de 4.460 m², sendo 1.671 m² de espaço construído. A estrutura original foi jogada no chão e a nova começou do zero. O projeto é da Fundação Mário Leal Ferreira. A presidente do órgão, Tânia Scofield, contou que as mudanças foram discutidas com os permissionários e que a intenção era oferecer uma área de lazer, além dos boxes.

“A ideia do projeto era recuar um pouco o mercado para que tivéssemos uma área com vegetação e passeio, uma área para o lazer, e a gente conseguiu seguir o projeto na íntegra. Ele foi discutido com os comerciantes do mercado, que eram 12 ou 15 na época, e com os comerciantes da área, porque o mercado vai valorizar e fomentar também o comércio da Baixa dos Sapateiros”, disse. Local também tem espaço para capoeira (Foto: Max Haack/ Secom) O frei Edilson dos Santos, do Convento de São Francisco, abençoou o santuário. No cristianismo São Miguel é um dos arcanjos, e para a manicure Eliene Souza ele operou um milagre. “Quem esteve aqui antes do incêndio e está voltando agora vai levar um susto”, afirmou, enquanto ajeitava o celular para fazer mais uma selfie. 

Por conta da pandemia, a entrada no local é controlada e limitada a 172 clientes ao mesmo tempo. Está sendo aferida a temperatura dos visitantes e disponibilizado álcool em gel. O uso da máscara é obrigatório.

Linha do tempo

Antes dos anos 1960 - O local de terra batida servia para montagens de circo e como depósito para os carros alegóricos do antigo bloco carnavalesco Cavaleiros de Bagdá. Depois, vendedores ambulantes ocuparam o espaço.

Em 1965 – Prefeito Nelson Oliveira resolveu construir um mercado com oferta de produtos variados, como carnes, peixes, frutos do mar, galinha caipira viva, cereais, frutas, verduras etc.

Entre 1960 e 1980 – Período áureo do mercado que era frequentado por famosos como os sambistas Batatinha, Riachão e Bezerra da Silva, e o escritor Jorge Amado. Havia até uma loja de joias no local.

Anos 1990 – Início da época de degradação e abandono. O local perde público e permissionários deixam a região, até que um incêndio destrói parte da estrutura em setembro de 2017.

Março de 2019 – Prefeito ACM Neto anuncia que vai reformar o espaço, e em novembro de 2020 o novo Mercado São Miguel é entregue.