Breja delas: cervejaria baiana tem equipe formada na maioria por mulheres

61% do time da Proa Cervejaria é feminino, com ampla presença em cargos de gestão

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  • Priscila Natividade

Publicado em 8 de agosto de 2021 às 16:00

- Atualizado há um ano

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Mulheres na direção de produção, no administrativo-financeiro, gerência de bar, comercial, marketing, atendimento e ocupando a maior parte dos espaços de trabalho. Que outra mulher não se sentiria mais à vontade em tomar sua cerveja sozinha ou com as amigas em um ambiente que reforça essa representatividade? A Proa Cervejaria fica localizada no município de Lauro de Freitas e emprega 18 profissionais, time composto por 11 mulheres, o que corresponde a 61% da equipe. Além da fábrica, a marca baiana de cerveja artesanal tem também três bares: um na Pituba, em Salvador, outro em Lauro e outro, inaugurado há dois meses, em Praia do Forte, no Litoral Norte.

E que diferença faz essa maioria, como destaca a mestre em química, mestre cervejeira e sócia proprietária da marca, Débora Lehnen. “Num mercado predominantemente masculino é muito importante para nós termos referências e acredito que é isso que estamos criando dentro do nosso time. Tem muitas mulheres incríveis fazendo um ótimo trabalho, mas os homens continuam achando ‘interessante uma mulher à frente de uma fábrica de cerveja’, como se fôssemos algo exótico, como se estivéssemos invadindo o espaço deles. Para mim, exótico é ver como os pensamentos ainda estão atrasados”.

Mercado que, ainda de acordo com Débora, exclui muitas profissionais até mesmo na chamada por oportunidades de emprego:“Na última semana, recebi em um grupo de meninas cervejeiras um anúncio de vaga de uma cervejaria que estava recrutando exclusivamente homens para a produção. Cada pessoa, de diferentes comunidades e culturas, tem experiências únicas. Quando somadas a um lugar diverso e inclusivo, temos um espaço muito mais propício ao crescimento de qualquer empresa”, completa.Gaúcha, Débora começou a fazer cerveja em casa e o que antes era só um hobby acabou se intensificando quando se mudou para Salvador. “Em busca de algo que me desafiasse comecei a ver na cerveja artesanal uma oportunidade de negócios. Passei um ano fazendo especializações na área e estudando o mercado antes de iniciar o projeto de construção da cervejaria, em 2018. Começamos a vender cerveja, inauguramos nosso bar de fábrica e em seguida partimos para industrializações por encomenda (produções para outras marcas), o que nos garantiu um bom volume de produção, permitindo que a cervejaria, desde o começo, girasse sem injeção de verbas externas”, lembra.

A capacidade produtiva da Proa é de 22 mil litros/mês, mas, no momento, devido à pandemia do coronavírus, a produção está em torno de 10 mil litros/mês. “Acabamos tendo uma retração muito grande em função da pandemia, quando, logo no início, nosso faturamento chegou a cair 90%. Hoje estamos retomando a produção e também o fornecimento de bares, restaurantes, hotéis, que também sofreram muito durante os dois últimos anos. Mas, certamente, queremos continuar com uma equipe diversa. Espero que o cenário melhore e em breve possamos aumentar o time”, comenta.

Presença feminina Pra começar a quebrar o estereótipo de masculinidade que por muito tempo sustentou o universo cervejeiro, lá há mais de 11 mil anos, enquanto os homens iam caçar eram elas que cuidavam dos grãos e faziam o pão. Só que, muitas vezes, com a exposição dos recipientes onde os cereais eram guardados à chuva e ao calor, a fermentação acabava formando um líquido, que deu origem à cerveja.  Avançando muitos séculos na história, o lúpulo — um dos principais ingredientes da bebida — teve suas propriedades descritas pela primeira vez no século XII, pela monja e teóloga alemã Hildegard von Bingen - ou Santa Hildegarda. Bom, o que essa prosa quer dizer é o seguinte: a cerveja é muito mais feminina do que se imagina. 

E é desse processo inteiro que a gerente do Bar da Proa, na Pituba, Dayse Lima, entende muito bem. Ela começou a trabalhar na empresa no ano passado. “Quando uma empresa dá espaços para que mulheres ocupem cargos de gestão, como no meu caso, criam essa dinâmica de reflexo. Na medida que eu vejo que é uma mulher que gerencia, que têm mulheres operando, outras mulheres se sentem confortáveis de estar no espaço para consumir. Ou seja, essa diversidade na empresa se vê também no outro lado do balcão, no público que entra no bar”.

Marcele Vergne trabalha na área financeira da cervejaria. Para ela, a diversidade nas empresas precisa ser algo tratado como natural. “Estar rodeada de mulheres só nos mostra o quanto somos capazes, independente de gênero”, diz. 

A gerente de marketing da Proa, Fernanda Queiroz, concorda: “As pessoas são múltiplas e já deu de retratar sempre o mesmo padrão. O que mudou é que agora nossa voz é mais ouvida. A mudança da percepção de quem são os consumidores de cerveja — e aqui incluo outras minorias também — acompanha as transformações sociais e mostram que um ambiente diverso só traz benefícios, seja qual for o setor”.

Recrutadora associada da Audens Group, consultoria que oferece serviços de recrutamento e seleção de profissionais, Bárbara Coelho, acredita que promover a inclusão no mundo corporativo significa entender a importância de respeitar e valorizar as diferenças. “Estamos falando sobre a necessidade de criação de programas e políticas para a diversidade na empresa, desde a contratação, até regras de promoção, treinamentos e benefícios diferenciados para mulheres. Algumas empresas estão estabelecendo cotas em cargos de comando, por exemplo”, aconselha.A equiparação só vem com mais oportunidades e esse é um movimento que precisa partir das empresas, na opinião da especialista: “É fundamental ouvir as mulheres, entender como se sentem nesse ambiente, questionar a estrutura da empresa, repensar políticas, promover oportunidades e entender histórias de sucesso relacionadas ao tema”, afirma.