Bullying no trabalho: quando uma piada não é só uma brincadeira

Prática está crescendo e preocupa especialistas, aprenda a identificar e ajude a combater

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  • Priscila Natividade

Publicado em 19 de novembro de 2018 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Ilustração: Morgana Miranda/ CORREIO

Depois de sofrer uma perda recente na família, a executiva Maria Fernanda* não conseguiu bater a meta do mês. Foi aí que tudo começou. “Lá vem ‘a que quase bate resultado’. Isso me causava um desconforto imenso”, conta. 

Só que no mês seguinte, Fernanda conseguiu atingir a meta, mas as “brincadeiras” continuaram. Na verdade, só pioraram. “‘Esse mês você garantiu a meta. Mês que vem, só Deus sabe’. E assim eu fui perdendo o estímulo”. 

A gota d’água foi quando ela resolveu pintar o cabelo de loiro para tentar levantar o astral. “‘Cabelo loiro só tem que pode. Só tem dinheiro quem bate meta’. Aí minha produtividade despencou a um nível absurdo, quanto mais a empresa pressionava por números. Passei por essa situação durante seis meses, eu só chorava. Fiquei sem chão e tive que procurar um psicólogo”, relembra. 

A história de Fernanda pode ter acontecido com quem ocupa a mesa ao lado da sua, que se vê muitas vezes constrangido ou menosprezado com este tipo de comportamento praticado por colegas de trabalho, com a desculpa de que é apenas uma “piadinha”, ou que “fulano” não entendeu a “brincadeira”. Mas isso tem outro nome. E é bullying corporativo. 

Valores

De acordo com a especialista em Recursos Humanos do Departamento Organizacional da Luandre, Natalia Oliveira, o bullying corporativo é cada vez mais frequente nas empresas, quando valores pessoais e alguns preconceitos acabam ultrapassando as questões individuais. 

“O impacto é grande, muitas vezes podemos prejudicar psicologicamente esse profissional, fazendo com que ele desenvolva problemas como estresse, fobias, depressão, entre outras questões, trazendo consequências no seu desempenho ou até mesmo perdendo esse profissional para o mercado”, diz. 

Ela destaca ainda que apesar de atingirem de frente o desempenho deste profissional, o bullying não pode ser confundido com assédio moral. “Assédio moral é uma conduta abusiva que expõe a vítima a situações humilhantes ou constrangedoras entre pessoas de hierarquias diferentes. Já o bullying é uma situação de agressão física ou psicológica que acontece entre pares, ou seja, os envolvidos são do mesmo grupo”.

O bullying no trabalho também é identificado quando há chantagem, pressão, perseguição, agressão verbal, ameaça e descriminação. Normalmente o bullying pode aparecer como críticas não cabíveis, pela culpa dada ao funcionário sem uma justificativa real, pelo tratamento diferenciado da equipe de trabalho, xingamentos e piadas entre outras práticas.

“Estudos mostram que as mulheres normalmente praticam o bullying velado, através de fofoca, exclusão e maledicências. E os homens realizam agressões abertas, por meio de xingamentos e apelidos pejorativos. Isso reforça a necessidade das empresas criarem políticas internas que combatam esta prática”, diz Natalia. 

 Vulnerabilidade

Para o psicólogo da Clínica Holiste, Cláudio Melo, o bullying atinge com mais facilidade as pessoas que estão fragilizadas. “A brincadeira e os chistes fazem parte da relação humana. Isto se torna um problema quando se observa um excesso. O bullying não é resultado da ação de uma pessoa específica, mas o resultado de uma combinação entre uma brincadeira cotidiana com uma pessoa que passa por um estado de vulnerabilidade”, explica.

A solução é se fortalecer. Leve a conversa ao superior ou ao RH da empresa. O melhor é levar evidências para essa conversa: datas, horários, locais, o que foi dito ou feito e quem estava presente. “É preciso buscar a mediação dentro da empresa, que precisa ter profissionais  especializados nessa área para identificar e tratar casos”, diz Melo.

* Nome fictício, a fonte pediu para não ser identificada.

SAIBA MAIS

Bullying x assédio moral Há diferenças. A principal delas entre os dois casos é a questão do nível hierárquico. O assédio moral é praticado pelo superior. O bullying pode partir do colega da mesa ao lado. 

Impacto Os valores pessoais e alguns preconceitos acabam ultrapassando as questões individuais e o impacto no ambiente de trabalho é grande. Muitas vezes podemos prejudicar psicologicamente esse profissional, fazendo com que ele desenvolva problemas como estresse, fobias, depressão. 

Constrangimento e menosprezo  O primeiro passo é reconhecer que está sendo alvo de bullying, reconhecer também que o problema não é dele e não tem relação com o seu desempenho no trabalho.  Procure, o quanto antes, o seu superior ou o departamento de RH da empresa, a fim de registrar o caso. 

Perfil  No geral, o bullying é praticado por pessoas agressivas e abusivas. As empresas precisam reforçar  a criação de políticas internas para combater essa prática, além de uma área de Recursos Humanos próxima dos colaboradores e com canais abertos para ouvi-los.