Ciclo de esperança: cruzes são queimadas em protesto contra a violência

Chamas das cruzes que representaram vítimas de violência acenderam o Círio Pascal durante a vigília na Basílica do Senhor do Bonfim

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  • Priscila Natividade

Publicado em 31 de março de 2018 às 20:45

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Almiro Lopes/ CORREIO

Há pouco mais de 20 dias, o administrador Cristiano Pereira foi surpreendido com a morte do primo e afilhado Akin Alves, 26 anos. “Ele estava morando em Porto Alegre (RS) e trabalhava como técnico de refrigeração. A informação que tivemos é que ele foi assassinado, mas não se sabe o motivo. Ele deixou um filho de 4 anos, uma mãe que só tinha ele e uma família em choque”.

O nome, a data do nascimento e morte de Akin estava em uma das mais de 500 cruzes que foram queimadas hoje, Sábado de Aleluia, na praça em frente à Basílica do Senhor do Bonfim, em celebração da Vigília Pascal. 

“Nesse momento vem tantas lembranças, principalmente da nossa relação de amizade. Como Akin não tinha pai, ele me respeitava muito. Os conselhos foram dados. E, hoje, a gente está aqui buscando forças através da fé”, afirma Cristiano, que acompanhou o acendimento do Círio Pascal com as chamas formadas pela queima das cruzes.  Mais de 500 cruzes com nome de vítimas de violência foram levadas (Foto: Almiro Lopes/ CORREIO) A vela branca representa a Luz de Cristo, o que, na doutrina católica, reflete a expectativa da passagem da sua morte para a vida. As cruzes foram reunidas pela paróquia durante a Quaresma e ficaram fincadas no jardim da praça por uma semana até serem retiradas anteontem à noite. A ação é um protesto contra a violência e faz parte da programação da Igreja da Campanha da Fraternidade 2018.

“Estamos fazendo a culminância desta iniciativa. Foi uma ideia minha recolher o nome de vítimas fatais da violência e produzir as cruzes. Com isso, associamos a morte das vítimas à morte de Cristo. A certeza da ressureição faz nascer uma nova esperança na vida das pessoas que perderam seus entes queridos”, explica o reitor da Basílica, padre Edson Menezes.

Amor ao próximo

E é esta mesma esperança que acompanha a doméstica Antônia Oliveira. Há seis anos, ela perdeu para a violência o sobrinho Diego Oliveira, 23 anos. “Pegaram ele no dia 4 de setembro e simplesmente desapareceram. Três dias depois, ligaram dizendo que encontraram o corpo. Até hoje a gente não sabe o porquê. A Páscoa chama a gente para compartilhar a ressureição de Cristo, mas com esse ato compartilho também a do meu sobrinho assim como de outras famílias que sofrem por conta da violência”, afirma. 

Enquanto o fogo consumia as cruzes, o técnico em mecânica Felipe Santana era um dos fiéis que rezavam pelo fim da violência. “Estamos vivendo em um país muito violento e a Igreja precisava se manifestar sobre isso. Eu não tenho nenhuma relação consanguínea com as pessoas que tiveram seu nome gravado nas cruzes, mas cada uma delas que morreu vítima de violência foi também crucificada como Cristo”.

Após a  celebração do Sábado de Aleluia, a programação da Semana Santa termina hoje com a celebração da Missa do Domingo de Páscoa, às 10h, na Igreja São Pedro Dos Clérigos, no Pelourinho. A liturgia será presidida pelo arcebispo de Salvador, Dom Murilo Krieger.