Citação a Bolsonaro pode levar investigação do caso Marielle ao STF

Suspeito teria pedido para falar com casa de Bolsonaro no dia do crime

Publicado em 29 de outubro de 2019 às 21:22

- Atualizado há um ano

. Crédito: AFP

A Polícia Civil do Rio de Janeiro teve acesso ao caderno de visitas do condomínio Vivendas da Barra, na capital fluminense, onde têm casa o presidente Jair Bolsonaro e também o PM Ronnie Lessa, acusado de matar a vereadora Marielle Franco. Bolsonaro afirmou que está disponível para conversar com o delegado sobre o caso. "Para começar a colocar em pratos limpos o que está acontecendo com meu nome. Por que querem me destruir?", diz. (veja mais abaixo).

Segundo reportagem do Jornal Nacional, no dia do crime, em 14 de março de 2018, um outro suspeito pelo crime, Élcio de Queiroz, foi até o local e pediu na portaria para ir até a casa de Bolsonaro. O porteiro do condomínio disse em depoimento que interfonou para perguntar se podia liberar o visitante, o que foi autorizado por um homem que ele identificou como "seu Jair". 

Depois de entrar no condomínio, contudo, o suspeito não foi até a casa de Bolsonaro, e sim até a de Ronnie Lessa, principal suspeito por ter disparado os tiros que mataram Marielle e o motorista Anderson Gomes.

A citação a Bolsonaro deve levar o caso de Marielle ao Supremo Tribunal Federal (STF), já que o presidente, então deputado federal, tem foro privilegiado. 

A reportagem cita que apesar da identificação da voz pelo porteiro, no dia do crime Bolsonaro estava em Brasília e participou de duas votações, segundo registro da Câmara. Ele também publicou videos na rede social no dia em que aparece no gabinete. Ronnie e Elcio são acusados pelo crime (Foto: Reprodução/TV Globo) Depoimento de porteiro No dia do crime, o porteiro estava na guarita controlando os acessos ao condomínio. Às 17h10, ele escreve no livro de visitantes a entrada do visitante identificado como Élcio, com detalhes do seu carro, um Logan de placa AGH 8202. A casa que o visitante iria era a de número 58, a de Bolsonaro.

Élcio é acusado pela polícia de ser o motorista que dirigiu o carro usado na execução, horas depois da visita ao condomínio de Bolsonaro e Lessa.

Segundo o JN, o porteiro disse à polícia que a entrada de Élcio foi autorizada por alguém que ele acreditou ser o então deputado federal Bolsonaro. Em dois depoimentos, ele identificou o homem que liberou a entrada como "seu Jair".  Além da casa 58, Bolsonaro é dono também da casa 36, onde vive seu filho Carlos Bolsonaro, vereador no Rio de Janeiro.

O porteiro conta que acompanhou a movimentação de Élcio pelas câmeras de segurança e na verdade ele seguiu para a casa 66, que pertence a Ronnie Lessa. Estranhando, ele voltou a ligar para a casa 58 e "seu Jair" teria dito que sabia para onde Élcio estava indo.

Os dois suspeitos saíram do condomínio juntos, pouco depois, usando o carro de Ronnie Lessa. O carro usado no crime foi pego por eles pouco depois, segundo fontes do JN, nas proximidades do condomínio.

De acordo com o jornal, o condomínio de Bolsonaro e Lessa grava as mensagens por interfone. A polícia tenta recuperar esses dados para tentar identificar com quem o porteiro teria falado no dia do crime na casa de Bolsonaro, já que ele estava em Brasília.

O advogado de Bolsonaro negou as acusações e disse que se trata de uma invenção para tentar incriminar o presidente. Para Frederick Wassef, trata-se de uma mentira clara. 

"Eu nego isso. Isso é uma mentira. Deve ser um erro de digitação, alguma coisa. É o caso de uma investigação por esse falso testemunho", disse Wassef ao JN.

MP vai ao STF Por conta da citação ao presidente Jair Bolsonaro, representantes do Ministério Público do Rio foram até Brasília este mês para se consultar com o presidente do Supremo Tribunal Federal, o minisitro Dias Toffoli. Eles queriam saber se podem continuar a investigação normalmente, agora que uma autoridade com foro aparece. Dias Toffoli ainda não se manifestou.

Prisão Ronnie e Élcio foram presos pela polícia em 12 de março desse ano. Lessa é sargento aposentado da PM e foi preso quando tentava fugir da casa no condomínio. 

Já Élcio é ex-policial militar e foi expulso da PM em 2015 por envolvimento com a contravenção. Marielle foi morta no ano passado no Rio (Foto: Divulgação) Bolsonaro responde Da Arábia Saudita, o presidente fez um ao vivo no Facebook comentando a matéria. Ele fala das comprovações de sua presença na Câmara, que foram citadas na matéria. Diz ainda que o processo do caso Marielle segue em segredo de Justiça e acusa o governador do Rio, Wilson Witzel, de vazar a informação. "O senhor só se elegeu governador porque ficou o tempo todo colado com Flávio Bolsonaro, meu filho", acusa. 

"Ou o porteiro mentiu ou induziram o porteiro a cometer um falso testemunho. Ou escreveram algo no inquérito que o porteiro não leu e assinou embaixo em confiança", afirma. "A intenção é sempre a mesma. O tempo todo ficam em cima da minha vida, dos meus filhos, e de quem está próximo de mim", diz. "Quero até isentar o porteiro, tenho certeza que ele não sabe o que assinou".

"Será que a Globo quer criar um fato, uma narrativa, de que eu deveria me afastar, ou de que o povo deveria ir às ruas pedir meu afastamento?", questiona, falando do momento de instabilidade em outros países da América Latina. Ele ainda atacou outros órgãos de imprensa, como a revista Época. "Deixem eu governar o Brasil, vocês perderam. Vocês vão renovar a concessão em 2022, não vou perseguí-los. Mas o processo vai estar limpo, se não estiver legal não vai ter renovação", afirmou, dizendo ser perseguido "24h por dia".

Bolsonaro fala ainda que o caso de Marielle parece "estar bichado" e questiona se deveria ser federalizado - o que foi pedido pela ex-procuradora-geral da República, Raquel Dodge. Depois, volta atrás e diz que isso talvez não fosse bom, atacando a Polícia Federal, "que não consegue responder quem mandou matar Jair Bolsonaro".