Clima e alta na demanda vão deixar o café caro

Exportações do produto para outros mercados também devem cair

  • D
  • Da Redação

Publicado em 4 de fevereiro de 2022 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução

Condições climáticas ruins nos últimos anos, somadas a um aumento na demanda mundial, devem pressionar os preços da bebida favorita dos brasileiros. Quem faz a estimativa é o empresário João Lopes Araújo, presidente da Associação dos Produtores de Café da Bahia (Assocafé). 

A produção de café está sujeita às oscilações do clima e a Bahia vem sofrendo com isso há sete anos, explicou João Lopes, durante a sua participação no programa Política & Economia, transmitido ontem no Instagram do CORREIO (@correio24horas), com a apresentação do jornalista Donaldson Gomes. 

Por coincidência, Minas Gerais, outro grande produtor nacional, passou por estas mesmas condições, desde 2019, lembra, agravada por geadas no sul do estado e no Paraná, no final de 2021. 

Segundo o empresário, já houve outros períodos em que aconteceram situações semelhantes, porém, lá atrás o governo federal tinha um estoque regulador suficiente para evitar que houvesse falta do produto no mercado. “O mercado mundial de café vive um cenário único, porque também há dificuldades climáticas no Vietnã e na Colômbia, outros grandes produtor mundiais”, comenta. 

“O Brasil há 150 anos é o maior produtor mundial, então não existe nenhum outro mercado preparado para suprir uma ausência como a nossa”, explica.  

Segundo ele, este cenário já se reflete nas exportações do produto. Em 2020, foram exportadas 40 milhões de sacas, depois de produzir quase 70 milhões de sacas. Em 2021, mesmo com queda na produção, o país exportou 40 milhões de sacas, mas em 2022, as expectativas são de que o volume não cheguem aos 30 milhões de sacas, calcula. “Existem estimativas de que podem ser até 15 milhões de sacas a menos, com a exportação de apenas 25 milhões”, projeta. “Está na cara que vai faltar café no mundo”, avisa. 

“Os exportadores estão fazendo ginástica para transferir o produto disponível para onde há demanda, mas é um esforço que se limita à disponibilidade do produto. Café não tem substituto”, diz. “Eu brinco sempre com os amigos produtores de cacau que eu já vi na Bélgica chocolate só com 28% de cacau, mas não dá pra fazer isso com o café. É um produto difícil de substituir”, compara. 

Mesmo na pandemia, com fechamentos de escritórios e restaurantes, o consumo de café cresceu, lembra João Lopes. “Ninguém imaginava que o consumo poderia crescer com as pessoas deixando de ir para o escritório ou de frequentar restaurantes, mas o consumo em casa cresceu tanto que compensou”, lembra. 

Segundo ele, o consumo cresceu aproximadamente 15% no Brasil, outros 10% nos Estados Unidos, 15% no Japão e o mesmo movimento se repetiu em todo o planeta. “A procura agora continua extremamente alta, este é um grande momento para o produtor e de grande aprendizado para todos, sobre como funciona o mercado”, acredita. 

Para o consumidor brasileiro, este cenário deve se refletir em aumentos nos preços do produto, avalia o empresário. A boa notícia para quem não abre mão da bebida quentinha é que dificilmente haverá falta dele. “Dificilmente vai chegar ao ponto de faltar. Nós estamos junto da fonte, mas para o comprador no exterior a situação pode se complicar”, avalia. 

“O preço vai subir muito. O preço que estava por R$ 400 a saca antes da crise, já está saindo por R$ 1,4 mil”, explica. “É claro que o industrial não consegue passar isso tudo para o supermercado, mas uma parte disso vai acabar sim sendo repassado”, acredita. 

Aposta na qualidade Há alguns anos, os produtores de café baianos decidiram deixar de lado as preocupações com a quantidade da produção para focar na melhoria da qualidade, conta o empresário João Lopes, presidente da Assocafé. “Não podendo ser os maiores, decidimos trabalhar para sermos os melhores”, lembra. Atualmente, a atividade é responsável pelo sustento de aproximadamente 100 mil famílias baianas, estima. 

O trabalho para estimular o produtor a melhorar cada vez mais as estratégias de produção passaram por concursos de qualidade, que acabaram fazendo escola. “Nós colocamos muitos pequenos produtores no mapa mundial, porque eles foram orientados no cuidado da lavoura e em tudo o que envolve fazer um bom café”, lembra. 

“Muita gente deixou de vender o café cru para comercializar um produto já torrado e moído, com uma marca própria, em restaurantes e supermercados”, lembra. Isso fez com que produtores que faziam em torno de R$ 600 com uma saca do produto in natura passassem a conseguir até R$ 7 mil com a mesma quantidade, após a industrialização. 

Segundo João Lopes, a indústria do café nacional passa por uma situação complicada em termos de competitividade. “Nos últimos 20 anos, mais de 50 marcas nacionais foram compradas pelo capital estrangeiro. Duas grandes marcas, associadas com grupos locais, concentram mais de 55% do mercado”, destaca.