Comunidades rurais protestam na Chapada contra devastação para produção de batatas 

Empresa foi autorizada a desmatar quase mil hectares de vegetação nativa em Piatã

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  • Da Redação

Publicado em 24 de novembro de 2020 às 19:06

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Sávio Cardoso Bello/CPTBA

Foto: Sávio Cardoso Bello/CPTBA Famílias do município de Piatã, na Chapada Diamantina, fizeram uma caminhada com faixas de conscientização e protesto, nesta terça-feira (24), contra a implantação de um empreendimento do agronegócio que pretende cultivar batatas na região do Gerais. 

O percurso foi feito entre rodoviária e a Câmara local, onde foi entregue uma carta aos vereadores pedindo a realização de uma audiência pública. As informações são da Comissão Pastoral da Terra na Bahia.

A manifestação foi organizada após a população ser surpreendida, no dia 19 de outubro, com as Portarias de nº 21.671 e 21.672 do Inema, publicadas no Diário Oficial do Estado, concedendo à Shuichi Hayashi autorização para desmatamento de mais de 950 hectares de vegetação nativa na Fazenda Piabas.

Integrantes do movimento falaram da preocupação com a escassez da água e a degradação do solo, assim como pode ser constatado nos municípios vizinhos de Mucugê e Cascavel, que já possuem plantações de batatas por esses mesmos grupos japoneses que pretendem explorar as terras de Piatã.

Patrimônio hídrico Da região dos Gerais de Piatã nascem três importantes bacias hidrográficas estaduais: Contas, Paraguaçu e Paramirim, rios que, sem exceção, cruzam as regiões mais áridas do Estado e cumprem a importante função social de abastecimento hídrico e de uso produtivo. 

Segundo os manifestantes, a bataticultura demanda grandes quantidades de água e uso de agrotóxicos, interferindo na qualidade e na disponibilidade das águas para o abastecimento humano, bem como para o desenvolvimento de uma das principais atividades econômicas do município, que é a agricultura familiar.

Seguindo a mesma lógica do agropolo que foi instalado nos municípios de Mucugê e Ibicoara, com a concentração de terras, uso intensivo dos recursos hídricos e a descaracterização territorial e cultural, a empresa já conta com um complexo de 19 imóveis vinculados ao empreendimento que juntos totalizam uma área de pelo menos 5.164 hectares na região dos Gerais. 

Para um produtor local, esse tipo de empreendimento não agrega nada ao município. “O agronegócio produz para exportação, e os prejuízos ambientais ficam para a população local, que sofre com falta de água de qualidade, poluição no solo e doenças causadas pelo uso de agrotóxico”, disse.

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Danos visíveis Após a divulgação da portaria, a empresa deu início às atividades na área do empreendimento alargando a estrada que segue paralela ao Rio de Contas. 

Nos dias 26 e 27 de outubro, moradores contaram que houve um intenso tráfego de caminhões e tratores que foram utilizados para jogar cascalho na estrada. 

No final do dia 27, choveu e todo o cascalho foi levado para o rio, deixando-o completamente enlameado, em uma condição muito diferente da habitual, impossibilitando o uso da água pelos vizinhos. 

Inema ciente Diante da situação, foi feita uma denúncia ao Inema, órgão vinculado à Secretaria estadual de Meio Ambiente, que após fiscalização no local, embargou a obra por falta de licença de supressão de vegetação. 

Na 11ª reunião ordinária da ARIE Nascentes do Rio de Contas (ARIE NRC), essa questão foi levantada. Os conselheiros expuseram suas preocupações sobre os impactos ambientais e sociais que o avanço da fronteira agrícola na região poderia representar para as comunidades do entorno. 

Diante do que foi colocado, o conselho deliberou por criar um grupo de trabalho sobre as barragens do agronegócio, com a finalidade de trazer mais informações sobre o assunto, que deveria ser apresentado em uma reunião extraordinária, marcada para o dia 4 de setembro de 2013. 

Ao final desta reunião, o conselho gestor emitiu uma carta de repúdio sobre a instalação do agronegócio no Gerais de Piatã. Neste meio tempo, foi feita uma representação ao Ministério Público Estadual Ambiental e um inquérito civil foi instaurado. 

MP recomenda cancelamento de licenças Na sexta-feira (20), a promotoria de justiça regional especializada em meio ambiente, atendendo ao inquérito civil público instaurado pela comunidade local, realizou uma investigação sobre as denúncias realizadas e emitiu uma recomendação para que o Inema cancele as licenças de supressão de vegetação e manejo de fauna, bem com interdite qualquer atividade decorrente da autorização. 

Destacou que esta era uma medida de urgência dado o caráter de danos sérios e irreversíveis ao meio ambiente da Chapada Diamantina. Solicitou, ainda, informações em um prazo de cinco dias, acerca das providências adotadas para dar cumprimento ao exposto na recomendação.

O CORREIO tentou contato com as assessorias do Inema e da empresa Shuichi Hayashi, mas sem sucesso.