Conheça Jonathan, o padre que trocava mensagens com Mãe Stella e ama o Instagram

Religioso de 27 anos é o capelão da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos desde fevereiro

Publicado em 24 de novembro de 2019 às 06:05

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arisson Marinho

Durante um ano, padre Jonathan e Mãe Stella trocaram e-mails. A ialorixá, falecida em dezembro do ano passado, estava ansiosa para conhecer o seminarista que lhe escreveu: “Precisamos nos tornar pequenos e percebemos que juntos somos mais fortes”. O encontro aconteceria em setembro de 2013 e a frase segue um lema. Desde fevereiro, Jonathan de Jesus, capelão da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, atrai fieis pela força da palavra e da espiritualidade. O padre de apenas 27 anos tenta dar novos rumos ao templo até então lembrado apenas pelas referências afro-brasileiras.

As passagens de padre Jonathan pelos corredores da igreja são acompanhadas de pedidos de bençãos e abraços. O padre chegou à uma das mais tradicionais de Salvador, no Largo do Pelourinho, para substituir o padre Lázaro Muniz, a quem os frequentadores promoveram uma campanha por sua sua permanência. “Não me deu medo, pelo contrário. Lázaro é um bom irmão, é um amigo”, diz o religioso, no jardim ao fundo do templo.

O padre tem levado como missão atrair fiéis à igreja numa época de distanciamento. A resposta são missas cada vez mais lotadas. O testemunho é de quem chega à igreja, já que a Irmandade dos Homens Pretos, administradora, não tem estimativa. 

O método é investir na proximidade com quem chega à igreja primeiramente movido pela curiosidade em relação dos atabaques, agogôs e timbal que ritmam os cânticos católicos. “A missa me atrai. Todo dia eu rezo a eucaristia, mesmo que sozinho”, conta. As inspirações vieram de uma vida dedicada à fé. Acompanhou o padre italiano Luis Litner revolucionar Cajazeiras 5, onde nasceu e foi criado, investir no trabalho social e resgatar jovens do crime. O religioso foi assassinado em maio de 2002. Os impactos de Litner na vida de Jonathan não escorreriam com o sangue.“Ele é um mártir de Cajazeiras”, emociona-se.No discurso de posse na Rosário, citou a música Protesto do Olodum e entoou: “Mãe que é mãe no parto sente dor”. A pobreza das ladeiras e vielas que visita leva o padre a um novo conhecimento de Salvador. Realidade que é levada ao altar quando fala aos fiéis. “Não há problema em falar sobre política. Não a partidária, falo de uma ética política”, fala. Há quatro meses, Jonathan é também o administrador paroquial da Paróquia São Francisco de Assis, em Saramandaia. É o bairro onde mora desde julho e para onde quer levar, por exemplo, psicólogos para atenderem os moradores da comunidade.“A pobreza é uma grande ferida”.Depois de sete anos de seminário e de nove meses na função de padre, Jonathan parece certo de que conhecer a história e acompanhar as mudanças do tempo fortalecem. A primeira experiência foi no Santíssimo Sacramento de Itaparica, na Ilha de Itaparica, onde experimentou pela primeira vez, de perto, a convivência com a cultura baiana. “A igreja erra se faz algum projeto fora do curso de Jesus. Cada tempo é um tempo”, acredita. O desafio, agora, é conciliar todos eles. Padre Luis Lintner foi morto em 2002 (Foto: Arquidiocese/Divulgação)

A história, a cultura e a música: outros caminhos de fé  

Nos anos de seminário, Jonathan fechava os olhos e ouvia Maria Bethânia cantar “Quem me leva os meus fantasmas”. Foi uma de suas companheiras no caminho para se tornar padre. Assim como Caetano Veloso e Gil. O padre enxerga na cultura um caminho para a fé. “A música, a cultura, a história, tudo isso também me faz rezar”, diz. Por isso, ouve e lê o quanto pode para entender a Bahia e falar mais próximo dos fiéis.

Na rotina com os integrantes da Irmandade dos Homens Pretos, aprende uma história de 334 anos. “Cada dia mais tenho que estudar a história da Bahia, de Salvador. Além do contato com os irmãos da irmandade. Eles são a história. “Eu sou soteropolitano com orgulho. Ando por essas ladeiras do Pelourinho com alegria”, agradece. A ideia é fazer resplandecer uma face negra de Jesus. Sem reforça a ideia de um sincretismo. “Aqui não é Igreja Sincrética. A irmandade tem um grande esforço em mostrar isso”, pede. 

As datas na vida religiosa são todas guardadas na memória. O batizado, o seminário, as posses. Também o dia que rezou uma missa para duas pessoas, na paróquia São Pedro dos Clérigos, no Largo Terreiro de Jesus. Na última vez, rezou para 50. “Toda celebração é como a primeira e a última”, diz. O padre parece celebrar até quando está fora do altar. 

No lado esquerdo da batina, leva sempre o terço. No direito, o celular. “Sou um padre muito online”, brinca ele, que atualiza a todo tempo o Instagram. Na hora de ser fotografado para a reportagem, brinca: “Vamos fazer uma coisa mais natural, né?”.

Na despedida, pergunto ao padre o que deseja para o futuro da Rosário, de Saramandaia e da fé. “Que arregacemos as mangas para derrubar os muros e construir as pontes”, respondeu. Como quando escreveu à Mãe Stella: “Com pessoas conscientes e comprometidas com a verdade é mais fácil e mais belo o diálogo”. Padre Jonathan está na Rosário dos Pretos desde fevereiro, onde celebra missas aos domingos, às 9h (Foto: Arisson Marinho/CORREIO)