'Conseguir adesão 100% é utopia', diz presidente da Abape sobre protocolos de eventos

Governo estadual autorizou Corpo de Bombeiros a punir estabelecimentos que descumpram medidas

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  • Carolina Cerqueira

Publicado em 15 de janeiro de 2022 às 06:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Heder Novaes/G11 Eventos

Após a aglomeração flagrada na festa Me Leva pro Bonfim, que aconteceu na tarde de quinta-feira (13), o governo do estado publicou um novo decreto que determina penalidade aos estabelecimentos que descumpram os protocolos para eventos. O documento foi publicado no Diário Oficial desta sexta (14). Mas essa não foi a única festa a provocar aglomeração. Produtores dizem que a fiscalização cabe ao poder público. “Conseguir uma adesão 100% é utopia”, diz Moacyr Allcance, presidente da Associação Baiana dos Produtores de Eventos (Abape). 

Conforme o novo decreto, as punições para quem descumprir as regras são: advertência escrita; multa; embargo temporário ou definitivo de obras e estruturas; interdição total ou parcial de obras, eventos, estabelecimentos, máquina ou equipamento; e cassação do Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB). A aplicação das penalidades é de responsabilidade do Corpo de Bombeiros.

O decreto que prevê os protocolos a serem seguidos diz que os eventos devem exigir a comprovação de vacinação contra a covid-19, distanciamento e uso de máscara pelo público e demais participantes. O documento diz ainda que a lotação máxima deve ser de 50% da capacidade de cada local. No último dia 10, o limite máximo de público foi reduzido de 5 mil para 3 mil pessoas. 

“A realização de eventos com venda de ingressos fica condicionada à presença de público limitada na forma prevista no § 1º deste artigo, e ao atendimento, pelos artistas, público, equipe técnica e colaboradores, do quanto disposto no art. 2º deste Decreto, respeitados os protocolos sanitários estabelecidos, especialmente o distanciamento social adequado e o uso de máscaras”, diz o decreto número 21.027, publicado no último dia 10. 

A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (Sedur) ressaltou que, em Salvador, todos os eventos autorizados já são também fiscalizados pelo órgão e que, ao constatar descumprimento de regras, os responsáveis são punidos com multas com valores variáveis conforme a penalidade. O Corpo de Bombeiros foi procurado para informar como será cumprido o novo decreto, mas não retornou até o fechamento da reportagem.  

O presidente da Abape defende que eventos que descumpram os protocolos devem ser, sim, punidos. “Eu acho que, uma vez provado que houve descumprimento do decreto e das medidas sanitárias, os responsáveis devem ser autuados e punidos. E é importante que aqueles que fazem eventos com responsabilidade não paguem por quem infringe as normas”, opinou. 

Mas Allcance reconhece que produtores e organizadores não conseguem garantir o uso de máscara e distanciamento em shows. “Todos têm a obrigação de seguir os protocolos, mas, infelizmente, existem na sociedade aqueles que descumprem, tanto os organizadores quanto o próprio público. Cabe ao poder público a fiscalização e punição. Dentro dos eventos, o que podemos fazer é recomendar os protocolos, como o uso de máscara. Fora isso, exigir o comprovante de vacina na entrada”, diz.

A primeira edição do Baile da Santinha, no dia 7 de janeiro, aconteceu no Parque de Exposições. De acordo com a Salvador Produções, organizadora do evento, o local tem capacidade para mais de 50 mil pessoas e estava ocupado por 5 mil, conforme decreto da época. Mas, mesmo assim, quem foi ao show conta que isso não foi suficiente para impedir as aglomerações. 

“A vacinação na porta foi exigida e só entrava de máscara. Mas, durante o show, raramente vi alguém de máscara. Em relação à aglomeração, achei que tinha bastante espaço e acredito que poderia sim ter um distanciamento entre as pessoas, porém a grande maioria se concentrava na frente do palco, aglomerando e deixando o meio e fundo vazios”, diz a design de moda Yasmin Mello, de 22 anos.  No Baile da Santinha, pessoas estavam aglomeradas e sem máscara (Foto: Divulgação/Sércio Freitas) A Salvador Produções disse que “conforme protocolo, é permitido o não uso da máscara enquanto houver consumo de alimentos e bebidas”, mas que todos os profissionais e prestadores de serviço do evento fazem uso de máscara em tempo integral e assim orientam o público. A assessoria disse ainda que, no local, foram instaladas placas solicitando o uso do equipamento de proteção. 

Quem foi ao evento Circuito Musical Verão 22, que aconteceu no dia 8, no Centro de Convenções, também notou pessoas sem máscara e aglomeração, mesmo com uma quantidade de público de 3.200 pessoas e capacidade máxima de 14 mil. “Exigiram vacina, máscara na entrada, tinha álcool em gel; mas houve aglomeração. Até dava para fazer distanciamento tranquilamente, mas tinha gente colada no palco aglomerando, apesar do espaço ser grande para a quantidade de pessoas presentes. É uma coisa que depende do comportamento do público, eu fui sabendo dos riscos”, conta a estudante Renata Benigno, de 21 anos.  Circuito Musical Verão 22 também contou com aglomeração e algumas pessoas sem máscara (Foto: Divulgação/Heder Novaes) “Fui esperando que as pessoas tivessem um pouco de bom senso e mantivessem distância e usassem a máscara, mas nem todo mundo tem essa consciência. As pessoas entravam de máscara, mas logo tiravam. Quem ainda estava de máscara no show tirava para cantar, foi o que mais me incomodou”, acrescenta a estudante Esther Rebouças, de 21 anos, que diz que manteve a máscara durante o show. 

A organizadora do evento, G11 Eventos, disse que “na Praça Gourmet, no Lounge VIP e no Lounge Grama, as pessoas respeitaram mais o distanciamento. Na pista, apenas uma pequena parcela de público ficou mais concentrada na frente de palco, mas ainda assim a grande maioria das pessoas estava usando máscaras e no restante da pista foi mantido o distanciamento”. 

“Os realizadores do evento, e todas as 300 pessoas que trabalharam nele, cumpriram rigorosamente os protocolos. Mas os realizadores e quem estava trabalhando no evento não tinham o poder de exigir o uso de máscaras o tempo todo das pessoas nas plateias. Isso é uma atribuição dos poderes públicos, das polícias, não de quem faz o evento”, completa o comunicado. 

Vídeo flagra aglomeração na festa Me Leva pro Bonfim

Milhares de pessoas optaram por se aglomerar em uma festa privada, realizada na tarde da última quinta-feira (13), no Terminal Turístico Náutico da Bahia, no bairro do Comércio. O evento intitulado Me Leva pro Bonfim aconteceu no dia em que ocorreria a tradicional Lavagem do Bonfim, cancelada pelo segundo ano consecutivo por conta da pandemia. A festa contou com shows de Péricles, Tiee, Revelação e Escandurras. Imagens de vídeo registraram a aglomeração do público no espaço.  

Antes do início do evento, a circulação do público e o volume de veículos na via principal do bairro chegou a provocar lentidão no trânsito da região. A Superintendência de Trânsito do Salvador (Transalvador) esteve no local e desviou o fluxo para a Ladeira da Montanha.  Foto: Reprodução A Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia (SSP-BA) e a Procuradoria Geral do Estado da Bahia (PGE-BA) informaram que estudam uma ação criminal contra os responsáveis pelo evento. A Sedur informou que o evento não foi interditado porque foi licenciado e estava dentro da capacidade de acordo com as normas.

A JJP Eventos, organizadora do show, foi procurada pela reportagem, mas não respondeu ao contato. Ao portal G1 Bahia, a empresa informou que a festa teve 2.580 pagantes, abaixo do limite permitido pelo governo. No entanto, não falou sobre ter mais de 50% do espaço ocupado, nem comentou sobre as aglomerações.

Lavagem de São Gonçalo promovida pela prefeitura provoca aglomeração

O Dia de São Gonçalo do Amarante, padroeiro do município de São Gonçalo dos Campos, foi marcado por uma festa na cidade que provocou aglomeração. A tradicional lavagem foi organizada pela prefeitura e contou com cortejo, banda e trio elétrico. O evento começou na quinta-feira (13) e deveria seguir até domingo (16), mas, a pedido do governador Rui Costa, foi impedido de continuar. 

A lavagem foi transmitida através das redes sociais do prefeito Tarcísio Pedreira (Solidariedade). Nas imagens, é possível ver que muitas pessoas não utilizam máscara e que não há distanciamento. A programação foi encerrada durante a noite de quinta, quando a Polícia Militar foi acionada e convocou o prefeito a cancelar a festa.  

De acordo com a assessoria da prefeitura, os festejos foram cancelados. O novenário segue mantido até domingo, quando também acontece uma procissão. "A organização da festa agiu com rapidez, eficiência e responsabilidade, para que houvesse um evento digno do povo de São Gonçalo dos Campos, resgatando a tradição, valorizando a cultura e respeitando o estabelecido no Decreto Estadual, conforme acordado com a PM. Para isso foram montadas equipes de monitoramento que conferiam o comprovante de vacinação,  distribuíram pulseiras para os aptos a participarem dos festejos, orientando cada pessoa em relação aos cuidados e o uso da máscara."

Através das redes sociais, o prefeito disse que, antes da realização da festa, se reuniu com alguns coronéis da PM e foi feito um acordo no qual a PM iria dar apoio durante a festa, desde que fossem cumpridas as normas do decreto.

A confusão acabou com a exoneração da subcomandante do Grupamento de Bombeiros Militares de Feira de Santana, Laiza Garcia da Silva Nonato. A decisão foi tomada a pedido do governador Rui Costa. Ela teria enviado uma viatura para a lavagem em São Gonçalo para acompanhar os festejos. Durante o evento, bombeiros participaram da lavagem, jogando água nas pessoas presentes. 

O prefeito Tarcísio Pedreira defendeu a major, dizendo que a prefeitura havia informado ao Corpo de Bombeiros sobre a realização dos festejos e pedido o apoio do grupamento. Ele também publicou: “Rui mandou a PM suspender os festejos do nosso padroeiro. Alguém aí pode me explicar? Até porque, há dois dias, me reuni com três coronéis e fizemos um acordo”. O prefeito ainda repostou uma notícia sobre as aglomerações da festa Me Leva pro Bonfim, em Salvador, e marcou o perfil do governador Rui Costa. 

Essa não é a primeira vez que o prefeito e a cidade são envolvidos em polêmica durante a pandemia. Em junho do ano passado, uma discordância sobre o evento com mini trio elétrico promovido pela prefeitura de São Gonçalo dos Campos terminou com a condução do motorista do veículo e do prefeito da cidade, Tarcísio Pedreira, até a delegacia municipal. O evento, chamado de Forró itinerante, estava previsto para acontecer do dia 22 ao dia 26 de junho. Artistas locais se apresentariam em cima do equipamento, circulando pelas ruas da cidade. A Polícia Militar impediu a ação.