Conselheiro tutelar de Salvador denuncia vizinho por agressões: 'Crime de LGBTfobia'

Alex é agredido verbalmente há 8 anos; agora, foi ameaçado com facão

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  • Luana Lisboa

Publicado em 4 de junho de 2021 às 21:49

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arquivo pessoal

Morador do Cabula IV, o conselheiro tutelar Alex Brito relata ter sofrido agressões verbais de seu vizinho durante 8 anos. Nas calçadas, no mercado, o idoso não podia o ver em lugar algum que palavras como “viadinho” e “vai viado” eram dirigidas a ele. Alex nunca havia o denunciado para tentar evitar atrito. Ele não poderia imaginar que os insultos verbais se tornariam ameaças a sua integridade física.

No dia 14 de maio, voltando para casa com seu irmão e um bebê de colo, após uma entrega de cestas básicas à comunidade local, Alex teria sofrido uma tentativa de atropelamento pelo vizinho. “Como ele não conseguiu o que queria, saiu do carro com um facão e veio para cima de mim e do meu irmão. Se não fosse o outro vizinho para acalmar ele, ele teria conseguido me ferir”, relata.

Mas essa não foi a única tentativa de agressão. Dois dias depois, em 18 de maio, Alex declarou à Polícia Civil estar na frente de casa quando o neto do idoso parou o veículo para o ofender. Em seguida, ao sair do carro, teria acertado um murro na boca do irmão do conselheiro tutelar, que estava filmando o ocorrido nas duas ocasiões. Outros familiares do idoso teriam se juntado à agressão e furtado o aparelho celular da conselheiro.

“Isso foi tudo filmado. Eu já tinha colocado câmeras em frente à minha casa justamente por conta da reincidência desses episódios e todas as imagens foram levadas para a delegacia. Eles dizem que é briga de vizinho, mas é LGBTfobia pesada”, alega Alex.

Antes, ele conta já ter deixado de sair de casa para evitar o encontro com o vizinho. “Nunca dei queixa porque queria evitar atrito, ainda mais com um idoso. Mas toda vez que ele me via, me xingava na frente de todo mundo. Se me via com um amigo, dizia que era ‘meu macho’, quando eu estava sozinho, me chamava de ‘viadinho’”. Com a agressão física, registrei um Boletim de Ocorrência”, diz.

O primeiro caso foi registrado na 11ª Delegacia Territorial de Tancredo Neves, no mesmo dia em que aconteceu a tentativa de atropelamento. Já no segundo, também foi registrado um Boletim de Ocorrência, dessa vez por furto e lesão corporal. De acordo com a Polícia Civil, os envolvidos serão ouvidos na unidade. 

Já o defensor público que acompanha o caso, Daniel Soeiro, detalha que o inquérito está sendo instaurado para a apuração dos fatos. “As testemunhas foram ouvidas, o delegado me informou que deve ouvir na próxima semana os supostos agressores, que parece que já tem esse comportamento LGBTfóbico há muito tempo. Após a conclusão do inquérito, ele será encaminhado ao Ministério Público, que poderá denunciar os agressores. Aí, teremos um processo judicial com direito a contraditório e eles podem até ser presos”.

O caso está sendo acompanhado pela Defensoria Pública da Bahia (DPE-BA) e pelo Centro de Promoção e Defesa dos Direitos LGBT da Bahia (CPDD-LGBT), que pertence à Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SJDHDS). De acordo com o coordenador do CPDD-LGBT, Renildo Barbosa, tanto a equipe jurídica quanto a psicológica foram colocadas à disposição de Alex, que procurou o Centro após ter sofrido a agressão.

“Atendemos Alex, o irmão, e como também trabalhamos com familiares das vítimas, atendemos os pais deles. A mãe e o pai são idosos e passaram mal com tudo o que aconteceu. Fomos à delegacia, envolvemos a 1a vara do Ministério Público, promotora Márcia Teixeira e demos entrada na queixa na delegacia de Tancredo Neves, além de mobilizarmos também a Secretaria de Segurança Pública do estado e notificamos a Polícia Militar. Agora estamos aguardando a finalização do inquérito pelo delegado. Tudo isso para formarmos uma rede de proteção a Alex”, explicou o coordenador.

Segundo a SJDHDS, o Supremo Tribunal Federal (STF) considera que homofobia e transfobia são crimes previstos em lei desde 2019. O Supremo determinou que a conduta seja punida pela Lei de Racismo (7716/89), que hoje prevê crimes de discriminação ou preconceito.

Alex mudou a rotina por medo de novos ataques. Ao sair de casa ou do trabalho, agora ele envia para a família a localização de onde está e para onde vai, além de estar evitando transitar pelo bairro sozinho.  Apesar disso, os apoios da família e do Centro de Promoção e Defesa dos Direitos LGBT da Bahia estão o ajudando a seguir em frente. “É preciso ter coragem para denunciar e para acreditar na Justiça. Não tenha medo de recorrer às instituições competentes, porque se não denunciamos, o crime fica impune”, finaliza.