Coordenador de políticas para cidadania LGBT acusa restaurante por agressão e homofobia

Estabelecimento nega agressão e afirma que cliente teve um "surto" e ficou "fora de si"

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  • Wendel de Novais

Publicado em 30 de novembro de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

O coordenador de políticas para cidadania LGBT da Secretaria Municipal de Reparação de Salvador, Vida Bruno, afirmou ter sido agredido com pancadas na cabeça e em diversas parte do corpo nas instalações internas e na porta do bar e restaurante Cervantes, no Campo Grande, após comer no local na tarde desse domingo (29).

Segundo ele, as agressões teriam sido iniciadas por Benjamin Villaverde, proprietário do local. A filha de Villaverde, Érica, conversou com a reportagem e negou as acusações. De acordo com ela, Bruno teve uma reação alérgica, seguida de uma convulsão e um surto que o fez ficar “fora de si”, chutar coisas e virar mesas no restaurante, precisando ser contido pelos presentes. A polícia foi chamada e apura o caso.   Vida Bruno antes do ocorrido no Cervantes (Foto: Acervo Pessoal) Bruno contou que a agressão teria começado após ele passar mal ao comer um prato de mexilhões. "Depois de comer, eu passei mal. O proprietário e a proprietária queriam que eu saísse do restaurante para não passar mal lá dentro. Enquanto eu não tinha condição de coordenar minhas pernas para sair, eles me esticaram e me jogaram lá fora. Me agrediram na cabeça e em vários lugares. Eu tô com a cabeça toda quebrada", relatou.

Ele disse ainda foi agredido fisicamente e verbalmente. "Na parte de fora do restaurante, várias pessoas tentaram me linchar. Isso por conta do que aquele sujeito [dono do restaurante] dizia. Eu tenho um cavanhaque e ele achou que eu era um homem cis. Quando viu que eu não era, ficou mais cheio de ódio ainda".

O servidor falou sobre os xingamentos que recebeu do proprietário do local e de como conseguiu escapar das agressões. "Ele me chamava de negra. Chegou a me chamar de vagabunda e vadia. Como eu tomei tanta pancada na cabeça, tive que sair correndo. Tentei pedir abrigo em vários locais. As pessoas acharam que eu era marginal porque eles tiraram meu sapato, minhas coisas pessoais", falou. No depoimento prestado na Central de Flagrantes, que o CORREIO teve acesso, Bruno relatou ainda que teria sido chamado de "puta" e "ordinária" por Benjamin Villaverde.

Defesa Por telefone, Érica, que não quis dizer o sobrenome e é filha do proprietário do local, negou as acusações e afirmou que Vida Bruno passou mal, convulsionou e teve um surto. "Não aconteceu em momento nenhum o que ele contou para vocês. Ele não foi espancado, todo mundo viu, tem câmeras de segurança. Ele passou mal, começou a convulsionar, surtou e ficou completamente fora de si. Ele começou a chutar tudo que tinha dentro do bar, virar mesas e se debater lá dentro", alegou. Érica ainda disse que Vida Bruno só foi retirado do restaurante para manter a segurança dos outros clientes que estavam no local. "As pessoas retiraram ele do restaurante pela segurança dos outros que estavam em volta e chamaram a polícia", contou.

Ela também afirmou que Bruno deveria passar por exames toxicológicos e ressaltou que nunca aconteceu um caso do tipo no restaurante. "Acho que valia a pena fazer um exame toxicológico numa pessoa dessa. Porque ele pode ter ido no banheiro fazer alguma coisa. A gente achou muito estranho que uma pessoa tenha comido um mexilhão e tenha tido esse tipo de comportamento em um restaurante que existe há 40 anos e nunca teve nenhum episódio de homofobia ou agressão", declarou.

Por meio dos advogados, o Cervantes enviou nota: "Hoje [ontem], a equipe do Cervantes vivenciou episódio de intercorrência clínica com um de seus clientes, nunca vivido antes. Prestou assistência imediata, contando inclusive com suporte de médico que também estava no local e acionou a SAMU. Devido à evolução do quadro com agravamento de alterações comportamentais do cliente e a recusa em receber os cuidados da equipe da SAMU foi também necessário acionar a polícia para segurança de todos", escreve. 

A nota também afirma que o estabelecimento tem grande interesse na maior apuração do ocorrido e também ressaltou o histórico do local "O Cervantes é o maior interessado no esclarecimento das causas (endógenas ou ambientais) que possam estar relacionadas com o ocorrido.Ao longo de mais de mais de 40 anos a diversidade do nosso público foi sempre marca registrada, assim como o nosso respeito a todos. Acreditamos, pois,  que o que aconteceu hoje seja consequência de quadro de saúde alterado que merece cuidados específicos".

A assessoria da Polícia Civil também foi procurada. Em resposta, a PC afirmou que tem ciência do caso, que será investigado após uma denúncia que relata agressão e homofobia por parte da vítima. "O comunicante e os donos do restaurante foram conduzidos para a Central de Flagrantes, por uma guarnição da Polícia Militar, por volta das 13h, de hoje (29). Todos foram ouvidos e o comunicante recebeu as guias para realização de exame de corpo de delito. Foi instaurado inquérito para apurar a denúncia de agressão e homofobia. A 1ª Delegacia (Barris), que atende a região onde está localizado o estabelecimento, vai prosseguir com a investigação".

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro