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Da Redação
Publicado em 3 de abril de 2020 às 05:00
- Atualizado há 2 anos
Todo começo de mês a dona de casa Ivone de Souza, 48 anos, vai ao mercado fazer as compras da família. Os três filhos são bons de boca e o marido adora feijão com arroz. Nesta quinta-feira (2) ela respirou fundo algumas vezes enquanto olhava o preço dos alimentos e acabou devolvendo o pacote do feijão de volta à prateleira.“O preço subiu muito. Tenho que levar porque a gente não pode ficar sem feijão em casa, mas vou comprar outra marca. Desde que começou a aparecer os casos de coronavírus aqui no Brasil os preços começaram a aumentar. O dinheiro que a gente tem já é tão pouco e ainda tem que lidar com isso”, disse.A dona de casa reclamou também do reajuste no preço do arroz, do leite e dos ovos, e disse que está pensando em alternativas para manter a família alimentada sem precisar gastar tanto. “Não sei como vou fazer, mas a gente vai ter que pensar em alguma saída. O dinheiro que eu gastei para fazer mercado em março já não dá mais para fazer a mesma compra em abril”, afirmou.>
Ivone tem razão. Segundo o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV IBRE), a variação média dos valores de 20 itens da cesta básica saltou de 0,19%. no início de março, para 1,64%. no dia 26 do último mês. O feijão foi apontado pelos consumidores ouvidos na reportagem como o que sofreu maior reajuste, passando de R$ 4,20 para até R$ 7,85. Em alguns mercados de bairro ele está sendo vendido acima dos R$ 8. Esse aumento revoltou o motorista por App Nilton Soares, 41 anos.“Não houve desabastecimento. Os caminhoneiros estão trabalhando, o campo continua produzindo, então, não tem motivo para esse aumento nos preços dos produtos. Eles (empresários) usam a desculpa do novo coronavírus para fazer esses reajustes absurdos”, disse, enquanto escolhia o que colocar no carrinho.Antes de chegar às mesas, os alimentos passam por um longo caminho que se inicia na plantação. Com a pandemia do novo coronavírus, etapas desse processo foram dificultadas e, como resultado, o preço de algum desses produtos alimentícios cresceu. Para o coordenador do IPC do FGV IBRE, o economista André Braz o aumento no valor é influenciado pelo isolamento.“Dois pontos principais explicam o avanço dos preços. Além do aumento da demanda por alimentos, pois todas as refeições estão sendo feitas em residência, houve aumento da estocagem de alimentos por receio de que o vírus se propague mais e expanda o período de confinamento social”, analisa o responsável pelo estudo.Os vilões Nos supermercados de Salvador, tanto os grandes como os pequenos, já é possível notar a elevação o valor de alguns alimentos. O presidente da Associação Bahiana de Supermercados (Abase), Joel Feldman, aponta que ovos, leite, feijão, arroz, óleo de soja e açúcar foram os que ficaram mais caros. >
“As indústrias que produzem essas categorias aumentaram os preços e algumas redes até trabalharam sem fazer ajuste nos valores por um período. Agora essas tabelas chegam, os supermercados evitam comprar de empresas que fizeram o aumento, mas em certos produtos foi uma alta simultânea em todos os fornecedores. Produtos como ovos e feijão são de primeira necessidade que não é possível substituir por outro fornecedor como podemos fazer em itens de higiene e perfumaria”, diz.>
Com base na nota fiscal de alguns clientes, o CORREIO comparou os preços dos alimentos antes e depois da pandemia ser decretada, em 11 de março. As compras foram feitas no mesmo supermercado e os produtos são da mesma marca. O arroz que custava R$ 2,59 passou para R$ 2,89. O açúcar que estava de R$ 2,98, agora está de R$ 3,19. A caixa do leite líquido que era R$ 3,13 aumentou para R$ 3,69. E o feijão saltou de R$ 4,19 para R$ 5,44.>
Quando a comparação é feita entre os mercados as diferenças são ainda maiores. O quilo do feijão da mesma marca variava entre R$ 5,44, R$ 7,29, R$ 7,85 e R$ 8,10. Já o óleo de soja estava de R$ 4,15, R$ 4,18, R$ 4,59 e R$ 4,65.>
A estudante de publicidade Aline Novaes, 32, contou que demorou mais que o tempo normal para fazer as compras e culpou a população pelo aumento nos preços. “Tem muitas gente comprando mais do que precisa. Os produtos acabam e como a demanda continua alta, os preços sobem. É preciso ter mais consciência e parar de agir como se o mundo estivesse acabando. Os consumidores precisam ser mais racionais”, disse.>
Ela disse que está preocupada. “Estou trabalhando de casa, mas não sabemos até quando isso vai durar. Imagine quantas pessoas vão perder o emprego e ainda terão que pagar mais caro para conseguir se alimentar. Esses reajustes podem até ser justificados, mas não podem ser abusivos”, afirmou.>
Enquanto isso, consumidores enfrentam filas e lotam supermercados, se aglomerando à procura de promoções. Em um dos mercados o gerente resolver baratear o preço dos ovos. Funcionários contaram que foi uma correria. Quando a reportagem chegou já não tinha mais nada na prateleira.>
* Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro>