CORREIO sobrevoa litoral com Ibama e mostra áreas atingidas por óleo

Estado decretou situação de emergência em 15 municípios

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  • Alexandre Lyrio

Publicado em 30 de outubro de 2019 às 05:15

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/CORREIO

"Pelo amor de Deus, estamos abandonados, não temos tecnologia, não temos estrutura! Precisamos de recursos, precisamos de equipamentos, precisamos que o Ibama assuma isso!”. O apelo partiu de Manassés Santos Silva, presidente da Câmara de Vereadores de Maraú, um dos 24 municípios baianos atingidos pelas manchas de óleo que avançam pelas praias do Nordeste brasileiro.

O vereador se dirigia diretamente ao superintendente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) na Bahia, Rodrigo Alves, que foi pessoalmente à Itabuna se reunir com representantes de cidades do Baixo-Sul e Sul baiano para conhecer as demandas dessas cidades no combate às manchas de óleo.

Naquele momento, as prefeituras de 15 cidades da Associação dos Municípios da Região Cacaueira (Amurc) e os consórcios Litoral Sul, Mata Atlântica (Cima) e Baixo-Sul (Ciapra), estavam aderindo ao decreto de situação de emergência do Governo do Estado.

O decreto será publicado no Diário Oficial dessa quarta-feira (30). Assinado pelo governador em exercício, João Leão, o documento inclui na lista as cidades de Belmonte, Cairu, Camamu, Canavieiras, Igrapiúna, Ilhéus, Itacaré, Itaparica, Ituberá, Maraú, Nilo Peçanha, Taperoá, Una, Uruçuca e Valença. Outras seis cidades tiveram situação de emergência reconhecida pelo Estado no último dia 14 de outubro: Camaçari, Conde, Entre Rios, Esplanada, Jandaíra e Lauro de Freitas.

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A bordo do helicóptero Ibama-02, o CORREIO percorreu nesta terça-feira (29), junto com o superintendente Rodrigo Alves, boa parte do litoral baiano - entre Salvador e Ilhéus -  e flagrou alguns pontos com manchas de óleo e a atuação de voluntários e agentes do Ibama, Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), Marinha e Petrobrás.

Desde o início das operações na Bahia, 350 toneladas de óleo foram recolhidas das praias baianas. A chegada das manchas de óleo é imprevisível. Somente nesta terça, dez toneladas foram recolhidas do litoral em Ilhéus. Numa delas, a Praia da Avenida, uma das principais da cidade, foram três toneladas.   Óleo na Praia da Avenida, em Ilhéus (Foto: Divulgação Ibama) Abrolhos Em Ituberá, chegaram mais 500 kg de óleo. Em Maraú, três toneladas. Em Canavieiras, somente terça, voluntários calculam que mais 600 kg de óleo foram retirados das praias. O município de Taperoá foi o último com registro oficial da chegada do material. Não foi divulgada a quantidade.

Segundo a ONG Conservação Internacional, 40 kg de óleo atingiu a região do Arquipélago de Abrolhos, mas a mancha ainda não teria chegado ao santuário. O superintendente afirmou que não há um plano especial para conter as manchas em Abrolhos. Até porque, acredita ele, não há como identificar a mancha antes de ela chegar na praia.“O plano que temos para Abrolhos é o que tem sido feito nos outros locais. Há 30 dias tem dois navios da Marinha monitorando Abrolhos, mas não acha nada. Nem lá e nem em lugar nenhum. Um terceiro navio capaz de sugar o óleo ainda no mar também foi deslocado para a região. Mas, para ele sugar o óleo, o material precisa ser encontrado antes. Se o óleo navega sob a superfície, como é que encontra?”, disse Rodrigo.“O único local em que conseguimos sugar óleo foi em Pernambuco, quando uma pequena quantidade foi visualizada antes de atingir a costa. Mas se tivesse chegado na praia a gente limpava e dava no mesmo”, justificou.

O superintendente espera que aconteça com o arquipélago aquilo que teria ocorrido na Baía de Todos-os-Santos. Por conta das características das correntes marinhas, o óleo teria chegado no máximo até a entrada da baía, na praia da Barra, e depois foi jogado para fora da região.

Confira a lista atualizada dos locais atingidos pela mancha de óleo na Bahia

Base de apoio Na terça-feira, nada menos que dez toneladas de óleo atingiram a praia de Pratigi, no Baixo-Sul, município de Ituberá. Foi lá que o Ibama montou uma base de apoio para as localidades da região. Também na terça, 500 Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) foram entregues na base. Mais 500 foram para a Amurc, que envolve municípios do Sul e Baixo-Sul.

Com o decreto da situação de emergência, os municípios esperam que os equipamentos para combater o óleo cheguem com mais facilidade. A situação de emergência autoriza a mobilização de todos os órgãos, sem a necessidade de licitações, nas ações de resposta ao desastre, reabilitação do cenário e reconstrução. Superintendente do Ibama na reunião em que 15 municípios aderiram ao decreto de estado de emergência (Foto: Marina Silva/CORREIO) “Esse decreto vai possibilitar ações mais rápidas para promover o restabelecimento da normalidade das praias afetadas pelo óleo. Possibilita a aquisição de materiais de proteção individuais, como EPI e ferramentas para a coleta de material, além da contratação de mão de obra temporária para que possa atuar na limpeza dessas praias que estejam afetadas”, destacou  o superintendente de Proteção e Defesa Civil da Bahia, Paulo Sergio Menezes, presente na reunião.“A gente tá correndo atrás da mancha, tá enxugando gelo. Cada um tá fazendo sua parte, mas tá faltando comando. Precisamos de recursos do Governo Federal para equipar as pessoas e para estruturar as ações”, cobrou Luciano Veiga, secretário dos representantes dos municípios do Sul e Baixo-Sul. “A carga política das ações não está sobre o Governo Federal ou a União. Está nos municípios”, criticou.   Ilha no Baixo-Sul foi atingida pela mancha (Foto: Marina Silva/CORREIO) O superintendente do Ibama na Bahia garantiu que não está faltando homens no combate ao óleo e também equipamentos, mas sim uma ação unificada e uma melhor comunicação. “A nossa interpretação é que tá faltando comunicação”, disse Rodrigo Alves, marcando para esta quarta-feira (30), às 14h30, uma reunião do Ibama com o Governo do Estado e a participação por vídeo conferência dos representantes dos municípios.

“A ideia é coordenar os esforços para que as equipes estejam informadas dos locais exatos da chegada do óleo. Isso é que faz a diferença nas ações de combate”, disse Rodrigo, que nessa quarta-feira também se encontra com o Ministro da Defesa.

'As barreiras são uma operação impossível' Durante o sobrevoo no litoral baiano, Rodrigo insistiu que a estratégia para combater o óleo é focada na limpeza das praias, ou seja, depois que o óleo atinge a costa. Isso porque, segundo ele, as manchas navegam sob a superfície e isso torna quase impossível a sua “captura” ou sucção.

Mesmo que fosse possível localizar as manchas de óleo, a instalação de barreiras de contenção seria uma operação impossível, avaliou Rodrigo, lembrando a todo tempo que o problema do óleo no Nordeste é algo inédito e que a limpeza das praias é a única saída possível até o momento. Populares tentam instalar contenção em barra de rio em Maraú (Foto: Marina Silva/CORREIO “Nunca houve nada parecido e com essas características. Imagine colocar barreiras no litoral do Nordeste inteiro. É uma operação logística impossível. Além do mais, qual a viabilidade técnica disso? Como saber se a mancha vai passar por baixo ou não da barreira. Não se sabe em que profundidade ela se movimenta. Como saber se a barreira vai suportar a mancha. O trabalho tem que ser de monitoramento exaustivo e de limpeza das praias”, apontou o superintendente do Ibama."Não dá pra gastar dinheiro com algo que não tem efetividade. Quanto mais a gente é competente em limpar as praias, melhor o óleo é combatido", acrescentou.

Sobrevoo Na inspeção aérea que o CORREIO acompanhou ao longo de toda essa terça-feira (29), depois de estar tudo limpo até a Ilha de Tinharé, onde fica Morro de São Paulo, flagramos manchas de óleo na praia de Algodões, na Peníssula de Maraú, próximo a Barra Grande. Eram cerca de 800m de manchas.

Por onde o helicóptero Ibama-02 passava, voluntários acenavam pedindo ajuda. Na própria Barra Grande, populares recolhiam vestígios de petróleo. De cima, vimos que muita gente não parecia preocupada com o óleo e se banhava nas praias paradisíacas da Bahia. Muitos não resistiam ao azul imbatível das águas de Morro ou ao mergulho nas piscinas naturais de Garapuá. Flagrante aéreo de óleo na Praia de Algodões, Peníssula de Maraú (Foto: Marina Silva/CORREIO) "Pena de quem cancelou pacote turístico. Garapuá tudo limpo", postou no Instagram o superintendente do Ibama. Encontramos equipes de limpeza da Petrobrás atuando em Boipeba e um grupo de voluntários instalando uma rede de contenção na barra de um rio, em Maraú.

Pousamos pela primeira vez em Moreré, na própria Ilha de Boipeba, onde voluntários recolhiam restos da grande quantidade de óleo que atingiu aquele paraíso no dia anterior. “Tiramos quase quatro tratores de óleo dessa praia. Isso que ficou aí é só o resto”, disse o pescador George Alcântara, 41 anos.  Voluntário em Moreré (Foto: Marina Silva/CORREIO) “A gente precisa que o poder público faça o que a gente está fazendo. Estamos trabalhando dia a noite. A nossa energia vai acabar”, reclamou a bióloga Cacilda Rocha, uma das voluntárias.Como não tinham o que comercializar, marisqueiros e pescadores tiraram a mão do mangue para meter a mão no óleo. “Ninguém tá comprando marisco nenhum: lambreta, caranguejo, peixe. Tudo parado”, lamentou o pescador Marcelo Menezes, 37 anos.  

Mais a frente, equipes do Inema e de voluntários reclamavam da falta de equipamentos, de equipes da Marinha, de veículos e de rádio transmissores. A comunidade relatou que, além de usar quadriciclos emprestados, estava enviando ao mar, por conta própria, embarcações de monitoramento e até drones.“Essa região não pega celular e precisamos de rádios. Estamos com uns drones emprestados que estão monitorando. Tudo por nossa conta”, disse o mergulhador voluntário Juan Ceva.O superintendente do Ibama prometeu atender a todas as reivindicações.

Em Salvador, de cima, tudo estava aparentemente limpo. Na Orla Atlântica, de Itapuã até o Farol da Barra, apenas em Armação encontramos alguns pontos de óleo. "Já vou acionar o pessoal da prefeitura", disse o superintendente do Ibama.

No Porto da Barra, praia cheia e pouca gente na água. Além de difíceis de serem encontradas, as manchas poderiam ser confundidas com sombras de nuvens ou vegetação aquática. "Eu não tinha noção do quanto o litoral baiano era bonito. Era não! É bonito", disse o comandante do Ibama-02, em um possível ato falho de quem teme o pior.