Da mandioca à cerâmica: mostra traz saberes tradicionais de Irará para Salvador

Município se destaca pelo cultivo da raiz e pelas tradições culturais da zona rural

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  • Georgina Maynart

Publicado em 17 de maio de 2019 às 13:00

- Atualizado há um ano

No próximo fim de semana, quem visitar o centro histórico de Salvador tem a chance de viajar por tradições da zona rural sem sair da capital. Basta visitar a Mostra Cultural Sabores e Saberes de Irará. A exposição reúne um pouco da história do município através das artes plásticas, da gastronomia, da música e da fotografia.

No povoado de Sobradinho, em Irará, a 128 quilômetros de Salvador, 33 mulheres avançam sobre a lavoura para colher a mandioca, plantada um ano antes pelos agricultores familiares. A hegemonia feminina no cultivo da raiz é uma tradição secular na comunidade.

Marinalva Cerqueira, de 51 anos, faz parte da quarta geração da família a manter o cultivo. Tanto que adotou a atividade como apelido. Há mais de quatro décadas, desde que tinha 9 anos, se orgulha de ser chamada de Nalva do Beiju.

“Eu criei meus filhos assim. Na roça, arrancando mandioca, fazendo farinha e goma. Aprendi com minha tia, que aprendeu com minha avó, depois de minha bisavó”, conta a agricultora, famosa na região pela produção de beijus recheados. Um dos mais populares é o Beiju de carne do sol com farinha nutritiva de cenoura, beterraba e couve.  Durante a Mostra Cultural, Nalva do Beiju vai preparar tapiocas tradicionais e com sabores inusitados para os visitantes. (Foto: divulgação) Barro

Na mesma região, outra tradição se perpetua desde o século XVII, a produção de cerâmica. A antiga arte de dar forma ao barro foi herdada dos antigos índios Paiaiás, que habitavam a região, e ganhou influência africana nos séculos seguintes. 

Não é por acaso que as peças do ceramista Francisco Moreira, que nasceu na região, trazem uma forte presença de personagens femininas, faces com traços afro-ameríndios e religiosidade. Mulheres grávidas, amamentando, ou lidando com a lavoura, se multiplicam entre as peças.

“Tem um pouco de sofrimento, de alegria, e de amor. Eu amo fazer arte, e com a atividade ainda mantenho minha família”, afirma o artista.  O ceramista Francisco Moreira mantem a tradição secular de dar forma ao barro. (Foto:Lucy Anunciação) Cores

Em todas as telas do artista plástico João Martins, lá está Inácio, um pássaro sofrê de estimação. A ave circula entre potes e panelas de barro, voa entre mangas e cajus, pousa em janelas de casas de taipa. Retratar o cenário colorido e alegre da zona rural é uma marca do artista. Foi assim que ele ganhou o apelido de Poeta da Cor, dado pelo artista plástico Floriano Teixeira há mais de 30 anos.

“O universo colorido retrata a alma alegre. Ainda hoje isso tudo existe lá na zona rural, e ainda encanta muito”, afirma o artista que está expondo a mostra Mãos ao Barro, no Museu de Cerâmica e Azulejaria Udo Knoff, também no Centro Histórico.  As obras do artista plástico João Martins estão em exposição no Museu Udo Knoff. (Foto: divulgação) Fotografias

O cotidiano dos trabalhadores do campo também é o tema das imagens registradas pela fotógrafa baiana Lucy Anunciação. A filha de agricultores, nascida em Irará, percorreu várias comunidades da zona rural do município para registrar detalhes da rotina de quem tira o sustento na terra. 

Nas fotografias é possível ver detalhes do manejo da raiz, do preparo dos beijus e da tradição que se tornou a principal fonte de renda de muitas famílias.

“Estas pessoas demonstram muita força de vida e determinação. Quero que o trabalho delas seja mais valorizado e que elas encontrem mais facilidade para comercializar os produtos”, pontua a fotógrafa.

As exposições também fazem parte da programação da Semana dos Museus, e ficarão abertas ao público até agosto no Museu Udo Knoff de Azulejaria e Cerâmica da Bahia.

“Nós estamos falando do futuro das tradições. É essencial mostrar esta riqueza tradicional. Mas não apenas o objeto pelo objeto. Ele só faz sentido quando contado junto com a história destas mulheres, dos homens, das famílias que passam esta arte de geração para geração”, afirma Renata Alencar, coordenadora do Museu Udo Knoff.  Trabalhadoras rurais são destaque na Mostra Cultural de Irará. (Foto: Lucy Anunciação) Serviços:

O QUE: Mostra Cultural Sabores e Saberes

Onde: Praça Teresa Batista, Centro Histórico de Salvador

Quando: Sábado (18) e Domingo (19). A partir das 10 horas, com apresentações musicais de artistas da região, entre eles Nilson Aquino, e convidados como Del Feliz e Val Macabira.

O QUE: Mostra Mãos ao Barro

Onde: Museu Udo Knoff, Rua Frei Vicente, Centro Histórico. Terça a Sexta, das 10 as 17 horas. Sábado das 13 as 17 horas. Até agosto