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Do Estúdio
Publicado em 6 de setembro de 2019 às 14:30
- Atualizado há 2 anos
A educação é um direito fundamental, faz parte do processo de desenvolvimento e dignidade do ser humano, conforme a Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (LDB 9394/96). Na contramão dessa garantia, nos deparamos, no Dia Mundial da Alfabetização – 8 de setembro – com um dado preocupante: o Brasil ainda tem 11,3 milhões de analfabetos a partir dos 15 anos, o que corresponde a 6,8% da população brasileira. A informação faz parte do suplemento de educação da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) de 2018.>
Por trás desses números, histórias de pessoas que não tiveram oportunidades, nem sequer sabem assinar o próprio nome, além de terem dificuldades para participar na sociedade ao requerer seus direitos. Mas nunca é tarde para voltar para escola. E foi o que Antônio Dias, 60 anos, fez retornando para a sala de aula para aprender a ler e a escrever.>
“Meu pai não podia colocar a gente no colégio. Ele dizia que quem estuda eram os filhos do patrão, a gente tinha que trabalhar. E aí, quando cheguei para trabalhar de pedreiro, fui tendo dificuldades e dependia dos outros para ler para mim. Quando comecei a trabalhar na construção, vi a necessidade de estudar porque preciso ler e entender os projetos”, conta Dias que trabalha na construção civil e é estudante da Educação Jovens e Adultos - EJA da turma intermediária de alfabetização.>
Antônio Dias havia tentando estudar antes, mas precisou parar, pois tinha que trabalhar e também por falta de motivação. Começou mais uma vez no ano passado e continuou graças ao estímulo das professoras, as quais ele tem muita gratidão. Uma delas, a Kika Llanos, educadora do EJA, conhece e acompanha de perto histórias como a dele e de outros alunos. “Um fator relevante é o entendimento sobre a situação do aluno trabalhador, pois este vive o eterno dilema entre escolher estudar ou ter salário. Trata-se de uma necessidade de sobrevivência e que por isto nem sempre os alunos conseguem estar na escola todos os dias ”, reflete a professora.>
Acolher, se doar a cada dia na sala de aula, e viver a essência de lecionar para jovens e adultos, inebria Kika. Para ela o papel do professor é de mediador para tornar acessível o conhecimento formal, sistematizado dentro da realidade do aluno. “O aluno do EJA, em sua grande maioria é adulto, que traz consigo vasta experiência de vida. E é uma importante porta de integração e libertação do aluno na sociedade. Muitos relatam que antes da escola sentiam imensa vergonha de pedir a outros para manipular o caixa eletrônico, ler um bilhete deixado pelo patrão ou de só poder ouvir áudios nos aplicativos de mensagens, e para que lessem a bandeira do transporte coletivo”, comenta a educadora.>
Essa era uma das dificuldades de Antônio, que já pegou várias vezes o transporte errado para se locomover na cidade. “Graças a Deus já sei assinar o meu nome. Leio algumas palavras, principalmente no ponto de ônibus, pois eu precisava perguntar ao pessoal para onde ia o carro porque eu pegava errado. Também escrevo ainda comendo letra, mas quase todo mundo acaba cometendo um erro, como a falta de um ponto, uma vírgula”, celebra o aluno.>
A metodologia do Ensino para Jovens e Adultos - EJA A professora Kika, que leciona em uma escola municipal, explica que a metodologia de ensino para o público adulto precisa ressignificar o conteúdo formal através da prática, da realidade e da experiência do dia a dia, para favorecer a acomodação e assimilação desses saberes. Embora o lúdico, em dosagem certa, também exerça seus encantos sobre os alunos do EJA, considerando que muitos não viveram plenamente a infância. Pode ser também uma experiência enriquecedora através da oralidade e das memórias.>
“Apesar de todas as fundamentações teóricas, o primeiro passo para o sucesso no EJA é conhecer o seu público, seus desejos e suas experiências. Este é o pontapé inicial para qualquer profissional desenvolver um bom trabalho com o EJA”, pontua Kika.>
A professora do EJA, em seus anos de prática, acredita no potencial de cada aluno que passa pela sua sala de aula. Para ela esse é principal fator que contribui para o sucesso, pois quando o professor acredita no aluno, este também acredita em si mesmo. “Não é em vão quando eu digo que espero ser convidada para a graduação de meus alunos, pois trabalho para que o pedreiro, se desejar, seja um Engenheiro. Ainda acredito na educação como meio de ascensão social! ”, conclui a educadora, Kika Llanos.>