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Da Redação
Publicado em 2 de agosto de 2021 às 09:57
- Atualizado há 2 anos
O Brasil não quer que você durma. Ou, pelo menos, tem dificultado nossas noites de sono. Como se não bastasse a pandemia, ainda embrulhamos nosso pacote de ansiedades com crise política, problemas econômicos e uma Olimpíada realizada em um fuso horário que nos faz acordar no meio da madrugada.>
"Eu sempre tive um sono pesado, mas, do ano passado para cá, tudo virou do avesso. A pandemia fez com que eu trocasse a noite pelo dia. Não consigo dormir, desperto com ansiedade à flor da pele. Tive até burnout (distúrbio psíquico causado pela exaustão extrema, sempre relacionada ao trabalho)", contou a confeiteira Tatiana Branco, de 38 anos.>
Uma pesquisa divulgada recentemente pelo Instituto do Sono revelou que a dificuldade de dormir afeta 66,8% dos brasileiros na pandemia. O levantamento ouviu 1.600 pessoas de 24 Estados no Brasil, que responderam a um questionário virtual. Além disso, 59,4% das pessoas acordam mais vezes durante a noite.>
Ultimamente, a Olimpíada no Japão também reflete nos problemas de sono da confeiteira Tatiana Branco. "Deixei a TV ligada para ver um pouco do futebol feminino. Daí o Brasil ganhou de 5 a 0 da China. A cada gol eu despertava um pouco. Não consegui mais pegar no sono depois", lembrou.>
O médico e pesquisador do Instituto do Sono Sergio Brasil Tufik explica a diferença entre sofrer de insônia ou ter apenas uma noite mal dormida: "Para ser considerado que a pessoa sofre de insônia, ela precisa ter três noites por semana com dificuldade para dormir, por pelo menos três meses, mesmo com condições propícias para o sono".>
Tufik elencou os fatores que podem tirar o sono dos brasileiros no momento. "Primeiro, claro, a preocupação com a própria saúde e a dos familiares; depois, a gente ainda tem as questões econômicas e a conjuntura política. Esses fatores geram preocupações que compõem riscos para a insônia", afirmou.>
Para o coordenador do Departamento do Sono do Hospital Santa Paula, Luiz Fernando Lobo, a insegurança em relação ao futuro está tirando o sono do brasileiro. "A preocupação com a pandemia, o emprego, as contas a pagar. Tudo isso gera insegurança. O que nos apavora é o desconhecido", disse. Para Lobo, o básico para tentar se livrar deste acúmulo de estresse é falar. "Toda emoção que se vive tem que ser verbalizada, precisamos falar sobre o que estamos vivendo.">
Sobre os Jogos Olímpicos, Tufik apontou a mudança na rotina como o principal fator de alteração do sono. "Acordar de madrugada para ver os jogos mexe com a nossa rotina - e isso altera o nosso sono. Se a pessoa não tiver alguma forma de compensar ao longo do dia, dormindo em outro horário, essa privação pode causar problemas", disse.>
Outra insone, Tatiana Santos Veríssimo de Lima, de 35 anos, coordenadora de habitação da subprefeitura de Freguesia/Brasilândia, conta que sempre teve olheiras de insônia "Eu tento não mexer no celular na hora de dormir, mas acabo pesquisando coisas do trabalho e não consigo mais pegar no sono. Já tentei de tudo.">
Aquela "olhadinha" no celular antes de dormir ou simplesmente dormir com o celular ao lado da cama é um fator de risco para quem quer dormir direito. "As pessoas recebem muitos estímulos. Antes era só a TV, mas agora com celulares e computadores são estímulos que pedem mais interatividade e exigem atenção", comentou Tufik.>
Lobo afirmou que o "bombardeamento de informações com pouco processamento destas informações" é um dos fatores que provocam dificuldade em dormir. "A gente vive em um sistema binário. Não processamos informações. Você está conversando com alguém e esse alguém já corre para o Google. É um 'chega e responde' (de informação), sem reflexão. Em uma cidade como São Paulo isso fica até opressor.">
Oito horas Muita gente reclama de não conseguir dormir as tais 8 horas por dia. Mas será que elas são realmente necessárias? De acordo com Laura Castro, psicóloga do sono e diretora de psicologia dos Vigilantes do Sono, cada corpo reage de uma forma e nem todas as pessoas precisam das 8 horas. "Não é todo mundo que responde à meditação, aos exercícios físicos. Cada caso é uma história diferente e precisa de um acompanhamento individualizado.">
Tufik explica que existem "curtos dormidores". "São pessoas que dormem apensas 5 horas e estão bem. Por outros lado, tem gente que precisa de 10 ou 11 horas de sono. Esse período necessário de sono também vai variando de acordo com a idade.">
Sonambulismo Alguns casos de insônia desenvolvem-se de forma muito grave, como o de Selma Aguilera, de 60 anos, técnica em eletrocardiograma. Do início da pandemia para cá, a insônia dela piorou bastante. "Existe uma ansiedade que não me permite sequer ficar deitada. Eu tomo remédios para dormir. E eles já não ajudam. Só de imaginar que vou deitar e não vou conseguir pegar no sono já fico nervosa", contou. O pior é que, quando adormece, ela faz coisas dormindo e não se lembra.>
"Quando dou por mim, tem caixas de Bis, pipoca e sucos na cama. Coisas que não lembro de pegar na cozinha. Pior, faço compras pela internet. No dia seguinte, preciso correr e ligar para o banco e tentar cancelar as operações", disse. Selma iniciou uma série de exames no Instituto do Sono para descobrir uma forma de tratar sua insônia e seu provável sonambulismo.>
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.>