Eleições 2018: a ironia da história

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  • Armando Avena

Publicado em 12 de outubro de 2018 às 14:26

- Atualizado há um ano

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Na democracia, o povo fala através da urnas e o que se ouviu no último domingo foi um grito estrondoso de parcela expressiva da população. A reação a esse grito veio com chavões políticos de todo tipo e com manifestações iradas de ambos os lados da militância, mas poucos analisaram com racionalidade o recado do povo. O que mais se ouviu foi que uma onda conservadora varreu o Brasil e que o brasileiro demonstrou ter valores conservadores e, por isso, votou em massa no candidato que defendia essas ideias. Não foi bem assim. O grito não foi ideológico, foi apenas para avisar que o brasileiro não aceita mais a forma como o país vem sendo governado, com governos e políticos exercendo o fisiologismo e a corrupção a exaustão.

O candidato do PSL, Jair Bolsonaro, catalisou essa insatisfação, mas isso já aconteceu outras vezes na história recente do país. Em 2002, uma insatisfação semelhante tomou conta do Brasil, e a população, farta do governo Fernando Henrique Cardoso, votou em massa por algo diferente, algo que representasse o novo. Naquele momento, o político que catalisou a insatisfação da população brasileira tinha o nome de Luiz Inácio Lula da Silva. E assim, Lula, um político de esquerda,  ganhou o primeiro turno das eleições com 46,4% do votos e elegeu-se no segundo turno com a promessa de fazer uma nova política

Passados 16 anos, o povo brasileiro novamente se manifestou contra o fisiologismo e a corrupção, mas agora é um político de direita, Jair Bolsonaro, que catalisou a insatisfação da população e, prometendo mudar a política,  ganhou o primeiro turno com os mesmos 46% de votos.  Que ironia da história!  Mas quais seriam as razões para essa reviravolta? A resposta é simples: Lula e seu partido, que chegaram ao poder prometendo mudar a política, passaram a agir com os mesmos métodos que combatiam e ampliaram desmedidamente o fisiologismo na política, a irresponsabilidade na economia e o aparelhamento do Estado, institucionalizando a corrupção e a propina como instrumentos do processo político.  O resultado das eleições foi um movimento contrário a essa prática, um grito de repúdio à corrupção e à  ideia de que “os fins justificam os meios”. Por isso,  é possível afirmar sem erro que a maioria da população brasileira,  ao votar em Jair Bolsonaro e nos demais candidatos, estava votando contra o PT.

E quanto ao segundo turno? Na democracia, o segundo turno é fundamental para fazer com que um dos candidatos amplie o apoio e passe a representar a maior parte da população e, para isso, vai precisar eliminar os radicalismos e pender para o centro. No caso de Jair Bolsonaro, a tendência é que haja uma certa flexibilização no seu discurso, diminuindo a apologia ao armamento generalizado e as ofensas  às minorias e às mulheres, para assim tornar-se mais palatável à maioria do eleitorado. No que se refere a Fernando Haddad e o Partido dos Trabalhadores, o caminho seria  o partido fazer uma profunda autocrítica e, reconhecendo os graves erros que cometeu e que todos os dias enchem  as páginas dos jornais, propor um novo pacto à sociedade, apelando para outras lideranças mais confiáveis neste momento. 

Mas autocrítica não é da natureza do PT, por isso, o mais provável é que as mudanças sejam cosméticas (tipo trocar a cor vermelha pelo verde e amarelo), mas sem concessões na essência ou na forma de fazer política. Esse é o cenário e, como sempre ocorre nas democracias, será o povo que dará o veredicto final.

É preciso falar de economia A politica econômica precisa entrar na pauta do país e dos candidatos. Dois dos pilares econômicos estão alinhados – a inflação e o câmbio – mas o problema fiscal se deteriora a cada dia e a relação Dívida/PIB já atingiu 76%. Se a relação continuar aumentando vai ficar cada vez mais caro rolar a dívida e a conta dos juros vai aumentar.  É verdade que o déficit primário do governo caiu dos R$ 150 bilhões previstos inicialmente para R$ 139 bilhões, por conta de receitas adicionais e pequena redução nas despesas, mas o problema continua. A Previdência e as transferências a estados e municípios absorvem mais de 95% dos recursos do Tesouro, e o que sobra para investimentos é muito pouco. Os candidatos precisam, portanto,  detalhar sua política econômica no horário eleitoral, afinal, os brasileiros precisam saber o que esperar em 2019.

2º turno: os números Desde que foi instituído o 2º turno, em 1989, a maior diferença de votos no primeiro turno entre os dois candidatos que disputavam o 2º turno se deu em 2002, quando Lula colocou uma vantagem de 23 pontos percentuais sobre o 2º colocado, José Serra. A segunda maior diferença foi a verificada nessa eleição entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad, da ordem de 17%. Em todas as disputas de 2º turno, o candidato que venceu no 1º turno tornou-se presidente. A julgar pelo padrão histórico e pelos números da pesquisa Datafolha, que coloca Bolsonaro com 58% das intenções de votos e Haddad com 42%, só o imponderável poderá mudar o quadro eleitoral.

O Nordeste e a eleição Triste Nordeste, ó quão dessemelhante. Parafraseio o poeta Gregório de Mattos para assim denunciar as bobagens que ouvi sobre o papel da região Nordeste nessas eleições. Houve de tudo, desde raivosos posts culpando a região por votar maciçamente no PT, e assim impedir a vitória de Jair Bolsonaro no primeiro turno, até manifestações efusivas afirmando que o Nordeste tornou-se o bastião da esquerda  e do pensamento progressista no país. Isso sem contar nos mapas querendo eliminar a região da geografia brasileira. 

Na verdade, o desempenho eleitoral do Nordeste reflete apenas sua pobreza, pois a região é tão dependente dos recursos dos governos, especialmente do governo federal, que tende sempre a votar em quem está no poder. Isso acontece porque a administração pública em seu conjunto é responsável por cerca de 25% do PIB nordestino e mais de 50% dos municípios da região têm como principal e, às vezes, única fonte de renda os recursos da Previdência Social e do Bolsa Família. É por isso que, em 1998, Fernando Henrique Cardoso, disputando com Lula, ganhou em todos os estados do Nordeste, com exceção do Ceará, porque Ciro Gomes era candidato e obteve 54% dos votos na região contra cerca de 30% de Lula. 

Dizia-se, então, que os grotões do Nordeste elegeram FHC. Agora deu-se o mesmo e o Nordeste votou em peso com o PT que ainda representa o governo, apesar de Temer. É a dependência econômica ao governo federal que explica o voto nordestino e só será diferente quando a região for emancipada em termos econômicos e educacionais.

Os marqueteiros e a TV Esta eleição parece que vai marcar o ocaso dos marqueteiros políticos e da propaganda eleitoral na televisão. Eleição se ganha com emoção e a emoção parece ter se mudado para as redes sociais.