Em chamas: 25% dos incêndios em vegetação do Nordeste acontecem na Bahia

O estado já registra mais que o dobro de focos de calor em relação a 2020

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  • Wendel de Novais

Publicado em 26 de agosto de 2021 às 05:45

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Reprodução/CBMBA

Um fenômeno que destrói a flora, impacta a fauna e mina recursos hídricos. É assim que dá para descrever os incêndios em vegetação que, em 2021, na Bahia, têm mais que o dobro do que foi focos de calor - área com alto risco de incêndio - em relação ao ano anterior, de acordo com o Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema). Uma estatística que assusta já que ainda é agosto e coloca o estado como principal foco de queimadas no Nordeste. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que monitora ocorrências do tipo em todo o Brasil, de todos os incêndios em vegetação que acontecem na região, 25% deles estão concentrados na Bahia. 

Problema que, para o Inema, tem a ver com um ano em que o estado passa por período mais seco e com poucas incidências de chuva. Isso afeta, principalmente, o interior da Bahia, que se apresenta como um terreno mais árido em comparação com a região costeira, o que coloca todo o território mais afastado das regiões litorâneas como área de riscos para incêndio, segundo o órgão. Locais mais áridos são focos de pontenciais incêndos (Foto: Reprodução/CBMBA)  Para Eduardo Topázio, diretor de Água e Monitoramento do Inema, a situação é problemática porque 2021 fica marcado por um volume de chuva muito abaixo do necessário para que o número de focos não seja alto."Estamos em uma situação muito pior do que o ano passado. Em relação aos focos de calor e incêndios, ainda é prematuro dizer que é o pior em dez anos porque estamos em agosto e a estatística não está fechada. O que dá para adiantar é que, entre 2010 e 2021, esse ano foi um dos piores períodos de chuvas no estado da Bahia", informa ele, salientando que a chuva é essencial em ambientes áridos, onde a possibilidade de ocorrer incêndios é maior.Todo esse ambiente propicia uma temporada de alta de incêndios que, segundo o Corpo de Bombeiros Militares da Bahia (CBMBA), já começou por aqui. "Já iniciamos a temporada dos incêndios florestais e começamos o momento crítico, com altas temperaturas e baixa umidade do ar, mas o CBMBA está preparado para dar essa resposta, com a criação das bases florestais. A prevenção é primordial, pedimos que a população evite o uso do fogo para a limpeza de pastagens e terrenos", declara o major BM Márcio Jansen, coordenador da Operação Incêndio Florestal Bahia 2021.

Ainda segundo o CBMBA, os bombeiros estão atuando em duas áreas. Em Pilão Arcado, no norte da Bahia, onde contam com 10 bombeiros e apoio de aeronaves modelo Air Tractors, e em Campo Alegre de Lourdes, com 14 militares empregados, além do apoio das aeronaves. E no distrito de Peixe, próximo a Pilão, onde há apoio de alguns brigadistas locais, de municípios vizinhos e de cinco bombeiros do Piauí para evitar graves consequências.

É difícil mensurar em números os prejuízos financeiros causados pela situação. No entanto, Topázio afirma que a sociedade baiana perde de forma dupla com a situação. "O prejuízo está tanto na despesa que o governo precisa direcionar para a prevenção e combate dos incêndios como na perda de biodiversidade. Sendo esse o último ainda pior porque afeta áreas naturais importantes e chega a colocar biomas em risco de tragédias parecidas com a que aconteceu no Pantanal ano passado", explica o diretor, que acredita que a situação só deve melhorar quando a chuva, prevista para Outubro, começar a cair. Incêndios afetam biodiversidade e contas públicas (Foto: Reprodução/CBMBA) Oeste em apuros

E esses efeitos são ainda mais evidentes no Oeste do estado, onde o Inema registra em seus mapas o maior quantitativo de áreas com alto risco para incêndio. Brigadista e supervisor estadual de brigadas do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo) do Ibama, Vagner Manheze conta que as demandas estão em um volume muito maior neste ano."O Oeste, neste ano, tem um acúmulo de biomassa e o frio fez a vegetação secar mais rápido. Então, a previsão é de muito incêndio e pode bater recorde. Pra ter uma ideia, começa ter incêndio florestal no fim de agosto. Neste ano, o primeiro foi em 21 de julho", relata ele, informando que, só a brigada de Barreiras, combateu em torno de 30 focos de incêndio nos últimos 30 dias.Manheze conta que a média anual de combates feitos pela brigada é de 35. Apesar disso, Demósthenes Nunes Jr., secretário do meio ambiente de Barreiras, garante que a situação não saiu de controle e que o trabalho de prevenção vai evitar maiores problemas. "Nós temos focos de incêndio, mas estão sob controle porque intensificamos a campanha de prevenção a esse problema junto ao Ibama, Corpo de Bombeiros e brigadistas. No entanto, na região, já teve foco que quase atingiu unidades de conservação e, aqui mesmo em Barreiras, queimou parte de uma lavoura de milho de uma grande propriedade", declara.

A cidade de Barreiras faz uma campanha intensa de conscientização para evitar uso de fogo inadequado, como queima de móveis e lixo, o que pode levar fagulhas pelo vento para vegetação e iniciar incêndios. Preparação que é fruto da consciência dos múltiplos problemas que o fenômeno traz. "É um grande prejuízo se acontece. Impacta a região das Áreas de Preservação Permanente (APP) e reserva legal. Fora o problema para os recursos hídricos. O Oeste é um dos maiores aquiferos do Brasil. E a região precisa da vegetação viva para a água fazer o trabalho de infiltração e ir para o subsolo e recarregar o lençol freático", explica o secretário, que comemora o fato da cidade estar conseguindo prevenir e combater os incêndios. Focos de incêndio também ameaçam recursos hídricos (Foto: Reprodução/CBMBA) Brigadas em combate

Muito do sucesso na contenção de potenciais incêndios tem a ver com o trabalho dos brigadistas, que apoiam municípios e órgãos no processo de combate. Vagner Manheze conta mais como se caracteriza o trabalho destes profissionais."O brigadista tem seu papel principal na prevenção para evitar condições mais extremas, quando realizamos o combate e entramos em áreas de fogo para conter os incêndios. São, normalmente, profissionais que têm uma maior convivência na zona rural, que passaram pelo problema e sabem da importância do serviço deles para o  presente e o futuro, preservando o que ainda temos", diz.O supervisor também explica como são preparados os profissionais que vão desempenhar a função de brigadista. "São profissionais que passaram por capacitação em educação ambiental. Fazemos todo um treinamento porque eles precisam saber do valor do trabalho e conhecer conhecer as vegetações e biomas que eles vão trabalhar. No entanto, não saímos do zero, pra ser brigadista, a pessoa precisa ter pré-requisitos como conhecimento de ferramentas agrícolas e um bom condicionamento físico", alerta. 

As prefeituras de Luis Eduardo Magalhães e Santa Maria da Vitória, municípios da região Oeste, também foram procuradas para falar sobre a situação dos incêndios, mas não retornaram até o fechamento desta reportagem.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro