Extinga-se a Codevasf!

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  • Waldeck Ornelas

Publicado em 30 de julho de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Já se foi o tempo em que a Codevasf era a Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco. Vale a pena lembrar que tudo começou quando, na Constituição de 1946, foi vinculado 1% da receita tributária da União, pelo prazo de vinte anos, ao desenvolvimento da bacia do rio São Francisco. Trata-se do rio da unidade nacional, assim chamado pelo importante papel que desempenhou na ocupação do território pátrio e, no presente, estratégico para o desenvolvimento do Nordeste, como bem demonstram a implantação da agricultura irrigada e, mais recente, a transposição de suas águas, antes mesmo de sua revitalização. Nos primórdios do programa, esse recurso financiou a construção das usinas de Paulo Afonso e Três Marias.

É verdade que, desde sua origem, a Comissão do Vale (CVSF) – depois Suvale e, em seguida, Codevasf – esteve controlada pelo deputado Manoel Novaes, que elegia na Bahia uma bancada de 6 a 9 deputados em cada eleição, inclusive sua esposa, Neci Novaes. Mais tarde, em Pernambuco, os Coelho a tinham como instrumento de poder político em Petrolina e região, mas, reconheça-se, implantaram o polo de irrigação do submédio São Francisco, tornado um grande centro exportador de frutas – o maior feito da Codevasf.

Em 2000 a Codevasf teve sua área de atuação expandida para o Vale do Parnaíba. Até aí justifica-se: é a segunda mais importante bacia hidrográfica do Nordeste, na divisa entre o Piauí e o Maranhão, e não seria razoável criar uma outra empresa para atuar na mesma região sem utilizar a valiosa experiência já acumulada em projetos de irrigação.

Mais recentemente, contudo, sucessivas leis vêm ampliando a área de atuação da empresa: em 2009 foi incluído o Ceará; em 2010 foram incorporadas as bacias dos rios Itapecuru e Mearim; em 2017 uma nova lei incluiu a bacia do Vaza-Barris e outra, as do Paraíba, Mundaú, Jequiá, Tocantins, Munim, Gurupi, Turiaçu e Pericumã e os municípios do estado de Alagoas que não estão no Vale do rio São Francisco; em 2018 foram incluídas as bacias dos rios Una, Real, Itapicuru e Paraguaçu a as demais bacias de Alagoas, Maranhão e Sergipe. Com isto, a área de atuação da antiga Codevasf – que ainda ostenta o nome do São Francisco – já abrange o território de treze estados: Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia, Minas Gerais, Goiás, Piauí, Maranhão, Ceará, Mato Grosso, Pará, Tocantins e Distrito Federal. Tudo isto acontece fora do contexto de qualquer política nacional ou de algum plano de desenvolvimento. Nesta festa entrou até a bacia do rio Paraguaçu, que abastece Salvador, medida sem nenhum impacto, tanto assim que ninguém sabe dessas inclusões, salvo os interessados diretos. Como se não bastasse, estupefato, leio que a Câmara dos Deputados acaba de aprovar (20/7) projeto que inclui na área da Codevasf mais três estados: os dois do Nordeste que faltavam e, pasme-se, o Amapá!  Não é preciso ser vidente para perceber que se trata de passo essencial para, em seguida, justificar que as companhias estaduais de saneamento não paguem pela água transportada na transposição, deixando a conta no custeio da União.

Enquanto a Codevasf é consumida no jogo político, a Embrapa caminha rumo à irrigação de precisão, avançando em pesquisas que, fazendo uso da internet das coisas, permitam a economia de água e energia nos projetos de irrigação, tema que não está na agenda da Companhia do Vale. Ao contrário, já em 1995, quando da tramitação da lei sobre concessões no Senado, incluí os perímetros irrigados dentre os ativos elegíveis, recurso nunca utilizado por não interessar, desde então, à burocracia da Codevasf.

Hoje, definitivamente engolfada na esculhambação geral brasileira, não tem mais jeito: extinga-se a Codevasf! Será melhor para o país e não compromete o nome do Santo.  

Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional e ex-secretário do Planejamento, Ciência e Tecnologia da Bahia.