Feira de São Joaquim tem queda de 60% nas vendas após isolamento de baianos

Comerciantes reclamam de redução vendas; prefeitura determina fechamento de mercados municipais

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  • Eduardo Dias

Publicado em 24 de março de 2020 às 05:10

- Atualizado há um ano

. Crédito: Tiago Caldas/CORREIO

Corredores vazios, poucas mercadorias nas bancas e movimentação fraca de clientes. Esse é o atual cenário da Feira de São Joaquim durante a pandemia do novo coronavírus. Após mais um decreto anunciado pela prefeitura, nesta segunda-feira (23), que prevê o fechamento de cinco mercados municipais que não vendem itens de primeira necessidade para a população, os feirantes já começaram a sentir o efeito com o esvaziamento da cidade.

O CORREIO esteve na Feira de São Joaquim na manhã desta segunda e conversou com comerciantes, representantes da categoria e clientes para entender o quanto eles foram afetados com as medidas de isolamento da população. Devido a isso, como medida de prevenção, o Sindicato dos Feirantes e Ambulantes da Cidade de Salvador, que administra a Feira juntamente com o governo do estado, optou por fechar as portas do centro de compras no domingo (22), mas assegurou o seu funcionamento  para esta segunda-feira e ao longo da semana.

Segundo o presidente do Sindicato dos Feirantes e Ambulantes da Cidade de Salvador, Nilton Ávila, as medidas adotadas pela prefeitura, por enquanto, não afetam o funcionamento específico da Feira de São Joaquim, pois no local são comercializados produtos de primeira necessidade para a população. Ele  informou ainda que fará um apelo à prefeitura e Governo do Estado, através de ofício, apelando pela manutenção dos postos de trabalho dos comerciantes das feiras da cidade.  

“Acredito que isso só afeta os mercados com produtos não essenciais, como o Mercado Modelo e alguns outros da cidade que são administrados pela prefeitura. A feira funcionou normalmente nesta segunda-feira e vamos manter até o sábado, mas vamos encaminhar um ofício ainda hoje à prefeitura e ao governo com um apelo para ajudar as pessoas que trabalham por aqui, para garantir seus sustentos. Precisamos dessa ajuda ou todos passaremos necessidade”, contou. Foto: Tiago Caldas/CORREIO Ainda de acordo com o presidente da categoria, na última semana, a Feira de São Joaquim teve uma queda de 60% na movimentação de clientes devido às orientações para que as pessoas ficassem em casa, o que causou um esvaziamento nas ruas. No entanto, a estimativa é que o número aumente ainda mais nesta semana.

“Se hoje o prefeito fizesse um decreto para fechamento de feiras e mercados, teria de fazer uma pequena interrogação para a Feira de São Joaquim, pois ela é a única que não se enquadra na portaria de feiras e mercados municipais, pois não é administrada diretamente pela prefeitura”, disse o representante da categoria.

Procurada, a Secretária de Ordem Pública (Semop) informou que, inicialmente, as medidas tomadas competem somente aos mercados municipais, mas a prefeitura irá avaliar futuramente a situação do comércio de rua.

Decreto As novas medidas de segurança que foram adotadas pela prefeitura nesta segunda, com o intuito de combater o vírus na capital, só começam a valer a partir da quarta-feira (25), com o fechamento dos cinco mercados municipais que não comercializam produtos de primeira necessidade para a população, a exemplo das unidades de Itapuã, Cajazeiras, Bonfim, Liberdade e Mercado das Flores, no Dois de Julho. Além disso, o novo decreto também prevê o fechamento de bares e restaurantes, que funcionarão apenas com os serviços de delivery.

Mas o impacto do esvaziamento das ruas, devido aos decretos anteriores, já pode ser notado dentro da feira, que conta com corredores vazios, bancas de mercadorias desabastecidas e pouca movimentação de pessoas.

O comerciante José Carlos, 53, teme ter que comprar mercadorias e acabar perdendo seus produtos pela falta de clientes. "Hoje está sendo um dia péssimo, as segundas-feiras nunca foram tão vazias por aqui. Abastecimento está tendo, mas não estamos querendo comprar mais. Por enquanto, sigo trabalhando e tomando os meus cuidados contra a contaminação. Se for para nos prevenir, temos que obedecer as recomendações das autoridades, caso haja a necessidade de fechar o comércio totalmente”, disse.   (Foto: Eduardo Dias/CORREIO) Para o feirante Neném do Coentro, 47 anos, como Francisco é conhecido, o efeito do esvaziamento das ruas é notado na própria banca dele, que está com pouca mercadoria e sem previsão de comprar mais para estoque. No entanto, em meio à crise, ele, que mora com a mãe e trabalha no local há 20 anos, garante que apesar de sair de casa todos os dias para trabalhar, tem tomado algumas medidas de segurança contra o coronavírus.

"A gente tem medo de vir, mas continua vindo para garantir o sustento. Não é fácil e não tem outro jeito, temos que seguir trabalhando. A banca está vazia, pois não posso comprar muita mercadoria sem ter a quem vender. Nós, que não temos um fundo de reserva, não temos a opção se ficar em casa. Mas eu peço todo dia para a minha mãe, que tem 80 anos, para ficar em casa, evitar sair. Estou tomando alguns cuidados, por estar na rua o dia todo, quando chego em casa tiro roda a roupa, lavo as mãos na área, me desinfeto todo para não trazer nenhum vírus da rua para a minha casa e minha mãe", contou.

Já Arnaldo Pereira, 53, outro comerciante da feira, aguardava a chegada de cliente em sua barraca de quiabos. Às 11h e ainda com o primeiro cesto cheio, algo que não era muito comum em dias normais, avalia que, se nos próximos dias a movimentação da feira continuar caindo, vai fechar a barraca e ir para casa.

"Condições financeiras para ficar em casa por muito tempo, eu não tenho. Dá para ficar até umas duas semanas. Eu sei que a saúde é importante nesse momento, mas a barriga também é. A gente fica querendo se cuidar, mas ao mesmo tempo querendo conseguir o sustento. Essa é a minha única forma de levar o pão para casa. Não sei o que eu vou fazer, as dívidas não esperam. Mas se for preciso, vou fechar tudo e ir para casa como muita gente já fez", afirmou o comerciante, que trabalha há 38 anos vendendo o mesmo produto. (Foto: Eduardo Dias/CORREIO) Quem também vive o mesmo dilema é o casal Jucileide Lima, 47, e Luiz Campos, 49. Ambos possuem um comércio de frios dentro da feira de São Joaquim há seis meses, mas também costumam comprar tudo que precisam no local. Os dois notaram que a circulação de pessoas pela feira diminuiu na última semana e esperam que tudo volte ao normal logo.

"No nosso estabelecimento, por exemplo, já deu para notar uma queda de 70% no movimento de clientes. Nós vendemos de tudo um pouco, doces, queijos e outros derivados do leite. Mas, com toda essa situação, se não tiver jeito, vamos fechar a loja por uns dias e aguardar tudo se normalizar”, disse Jucileide. (Foto: Eduardo Dia/CORREIO) Luiz afirmou que no momento não pensa em fechar a loja, pelo fato de estar acumulando contas para pagar e não ter de onde tirar recursos.

“As contas de aluguel, fornecedores para pagar, estão chegando. Hoje eu não tenho condições de fechar o estabelecimento por 15 dias, se isso for decretado futuramente. Não sei mesmo o que vai ser se isso acontecer. Foi tudo muito rápido, há duas semanas as pessoas andavam se batendo umas com as outras. Hoje isso não está sendo possível mais. Mas, se for pelo nosso bem, temos que fazer o que as autoridades pedem. Eles sabem o que estão fazendo, é a saúde de todos que está em jogo”, afirmou o rapaz, que garantiu que tem seguido as normas de higienização dos espaços com a limpeza dos locais de mais acesso aos clientes, como balcões e balanças. 

*Com supervisão da subeditora Clarissa Pacheco