Filme sobre Geovane, jovem morto por PMs, é exibido em festival na Grécia

Jurandhy, pai do jovem, foi aplaudido de pé após a exibição: 'Se emocionaram com minha luta'

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  • Thais Borges

Publicado em 13 de março de 2019 às 18:02

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Divulgação

Depois de emocionar o Brasil, a saga de Jurandhy Silva de Santana em busca de seu filho Geovane Mascarenhas de Santana ficou conhecida do outro lado do Atlântico. O documentário Sem Descanso, que mostra a dor e a persistência de Jurandhy para encontrar Geovane, desaparecido em 2014, foi apresentado no 21º Festival de Documentários de Thessaloniki, na Grécia, na última sexta-feira (8). 

O desaparecimento de Geovane foi revelado pelo CORREIO em 13 de agosto de 2014, em uma reportagem do jornalista Bruno Wendel. O rapaz, após uma violenta abordagem policial na Calçada, registrada em vídeo, foi colocado no fundo de uma viatura. O filme Sem Descanso mostra desde a abordagem até o enterro de Geovane, que foi encontrado carbonizado, decapitado e sem as mãos, dois dias após a publicação da primeira reportagem, e os desdobramentos do caso. 

Sem Descanso foi lançado em novembro do ano passado, durante o Panorama Internacional Coisa de Cinema, o mais importante festival de cinema da Bahia. Agora, no Festival de Thessaloniki, o filme fez sua estreia internacional. “Ficamos felizes de ter sido selecionados pelo Festival de Thessaloniki porque se trata de um dos mais antigos e conceituados da Europa”, afirmou o diretor do documentário, o cineasta francês Bernard Attal. 

Relembre: Onde está Geovane?

De acordo com o site do festival, após a exibição, o filme foi aplaudido de pé pelo público. Ao CORREIO, Attal contou que a sala estava lotada, e o debate após o filme demorou devido à boa recepção do público. Foi justamente durante a discussão com os espectadores que o cineasta descobriu que, na Grécia, também há uma forma de violência policial, que se manifesta contra os imigrantes. Por isso, avalia, o público foi sensível ao drama de Jurandhy, ainda que os contextos sejam diferentes. “Eu não esperava uma reação tão calorosa. Na verdade, estava um pouco preocupado que o assunto do filme fosse um pouco distante desse público e que a reação fosse um pouco fria. Mas o contrário aconteceu, apesar das diferenças de cultura, língua, história”, disse Attal, nesta quarta-feira (13). Co-roteirista e produtora-executiva do filme, Fabíola Aquino comemorou a reação dos participantes do festival. “O que a gente sabe é que foi realmente uma situação em que a plateia daquele canto do mundo, tão distante, se sentiu muito tocada e se manifestou nesses abraços a Jurandhy”, completou. 

'Gratificante' Jurandhy, de fato, não conseguiu conter a emoção. Nem durante a exibição, nem após o filme ter sido assistido por centenas de pessoas. Em sua primeira viagem à Europa (antes disso, a viagem mais distante que fizeram foi à Argentina), o pai de Geovane foi convidado por Bernard Attal para acompanhar o festival. 

Ao CORREIO, ele contou que chegou a ver alguns dos filmes que também foram apresentados no festival. Em todos, após o fim da sessão, a maioria dos participantes deixava a sala de cinema. Não ficavam para o debate que acontece após cada filme. Mas não foi assim com Sem Descanso. 

Ao final, o locutor do evento chamou o diretor Attal, que, por sua vez, convocou Jurandhy ao palco.“Quando ele me chamou, tinha muita gente saindo e o pessoal voltou. Muita gente me abraçou, muita gente chorou, me beijou como se fosse meu pai, minha família. O pessoal sentou e não saiu mais, até o fim do debate. E, aí, a lágrima caiu, porque é gente que você não conhece, né? Eu não falo a língua deles, mas eles se emocionaram com a minha luta”, contou Jurandhy, por telefone. Para ele, depois de tanto sofrimento, veio a alegria de receber esse reconhecimento. A palavra que definiria o momento, diz ele, seria “gratificante”. “Por ser um filme do Brasil na Grécia, ficamos na expectativa: será que vão assistir? Mas, graças a Deus, foi bem gratificante, teve fila depois”, disse Jurandhy. 

Ele ainda não sabe quando volta ao Brasil. Por enquanto, está à disposição do cineasta, acompanhando a programação de Attal, que tem casa em Paris. Nesta quarta-feira (13), está em Gênova, na Itália, para a exibição de outro filme do francês, em um cinema local. “Está sendo ótimo, estou amando. Não vou pedir para voltar. Quando ele definir, eu volto”, disse, referindo-se ao cineasta. 

Júri popular O Ministério Público do Estado da Bahia chegou a denunciar 11 policiais militares por homicídio, sequestro e ocultação de cadáver. No entanto, em março de 2018, a Justiça determinou que sete dos 11 policiais envolvidos irão a júri popular: o subtenente Cláudio Bonfim Borges, o sargento Daniel Pereira de Souza Santos e os soldados Jesimiel da Silva Resende, Roberto Santos de Oliveira, Alan Moraes Galiza dos Santos e Alex Santos Caetano. O soldado Jailson Gomes Oliveira irá ao júri popular pelos mesmos crimes, com exceção de ocultação de cadáver. Quatro PMs foram retirados do júri por não existirem provas contra eles.

Em nota, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) informou que a juíza do 1º Juízo da 1ª Vara do Tribunal do Júri proferiu sentença de pronúncia no dia 10 de abril do ano passado.

"Os réus inconformados com a decisão de 1º grau, através dos seus advogados, interpuseram Recurso no Sentido Estrito para apreciação e modificação da sentença do 1º grau. Se for mantida a decisão do 1º grau, será agendada data para o julgamento pelo Tribunal do Júri", diz o TJ-BA.

Atualmente, o processo encontra-se no 2º grau. Deve ser incluído em pauta após cumprimento de diligências solicitadas ao juízo de 1º grau.