Fórum debate estratégias para o uso de resíduos da mineração na Bahia

Representantes locais e nacionais discutiram como tornar a atividade mais sustentável

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  • Gil Santos

Publicado em 9 de junho de 2022 às 18:10

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Foto: Paula Fróes/ CORREIO

Toda vez que uma empresa de minério explora o solo, ela retira os minerais desejáveis e descarta o restante dos resíduos. Esses rejeitos contêm substâncias que, se forem extraídas e tratadas, podem ser transformadas em fertilizantes para a agricultura e insumos para a indústria. A importância dessa discussão e os impactos econômicos e sociais foram debatidos no II Fórum de Inovação e Sustentabilidade na Mineração, realizado pela Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM), nesta quinta-feira (9).

A quantidade de resíduos produzidos pela mineração baiana ainda está em estudo, mas já se sabe que o estado é o terceiro em produção mineral no Brasil, atrás apenas de Pará e Minas Gerais. Na Bahia, 235 municípios fizeram extrações minerais entre 2017 e 2022. O doutor em geologia e pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Eder Martins, explicou que o Brasil tem pesquisas avançadas sobre o assunto e, além disso, debates como o promovido pela CBPM estão acontecendo em outros locais do país.

“O Brasil é o país mais avançado nesse tema, o que mais estuda isso no mundo. Tem uma legislação própria que regula o tipo de insumo e como ele pode ser gerado, suas características químicas, físicas e granulométricas. Nós produzimos insumos, ciência e novos produtos. A legislação foi regulamentada em 2016 e hoje temos 33 produtos registrados no país derivados da mineração”, afirmou. Segundo ele, alguns dos efeitos positivos do aproveitamento dos rejeitos são: a redução da emissão de carbono no meio ambiente e de outros gases do efeito estufa, a melhoria do solo agrícola, desenvolvimento de cadeias produtivas regionais com impacto social direto e criação de novos empregos. O pesquisador afirmou que 90% das pequenas e médias mineradoras têm potencial de gerar algum tipo de produto para a agricultura.

“Precisa de investimentos, tanto do setor privado, como incentivos de políticas públicas para que esse processo acelere. Nós temos no Brasil cinco milhões de hectares onde são utilizados esses insumos vindos da mineração e temos condições de chegar a 75 milhões de hectares. Possuímos uma agricultura que hoje é dependente 85% dos fertilizantes importados, imagine que podemos gerar cadeias produtivas na mesma região onde a agricultura é feita. Isso é fantástico”, avaliou.

O pesquisador disse ainda estar otimista porque outros estados também estão realizando fóruns e mesas de debate. O diretor-presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM), Raul Jungmann, ratificou que essa tem sido uma preocupação de todos os territórios que exercem alguma atividade de mineração e contou que, atualmente, cerca de 2,4 mil municípios fazem algum tipo de extração de minério no Brasil.

“Esse debate é importantíssimo porque a Bahia está se tornando um dos estados de ponta em termos de mineração. Em 2020, era o quarto estado minerador e, hoje, é o terceiro. Tem crescido uma média de mais de 60% ano sobre ano e tem uma diversidade mineral rara. São mais de 40 substâncias com possibilidade de exploração. A Bahia tem crescido em termos de faturamento, produção e exportação”.

A Bahia lidera a arrecadação em 19 tipos de minérios e metais preciosos como quartzo, magnesita e diamante.  Além disso, é o único estado a produzir vanádio (Maracás) e urânio (Caetité). Jungmann não soube precisar quantas empresas baianas estão conseguindo reutilizar os rejeitos, mas frisou que essa é uma mudança em desenvolvimento e que é preciso criar novas linhas de financiamento para incentivar a aceleração desse processo. “Esse é o futuro da mineração, sustentável, verde e respeitando o meio ambiente e a sociedade”, deu o recado.

O evento aconteceu no auditório da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), no Stiep. O presidente da CBPM, Antonio Carlos Tramm, contou que o objetivo do encontro foi debater mineração, inovação e sustentabilidade, sobretudo discutir o que fazer com o resíduo.

“A mineração não pode se reduzir apenas a extração. O resíduo tem qualidades que precisam ser exploradas. Esse debate está acontecendo em todo o mundo e precisa ter mais ênfase. O resíduo tem qualidades químicas e produtos que permitem que ele seja utilizado na construção civil, que seja utilizado como fertilizante ou na indústria química”.

Já o coordenador de Projetos do Senai Cimatec (Campus Integrado de Manufatura e Tecnologia), Walter Pinheiro, discutiu sobre logística, ciência, novos negócios e Hidrogênio Verde, processo que usa exclusivamente energia de fontes renováveis. Ele alertou para a falta de políticas para o desenvolvimento do setor.

“Existe uma carência de logística para a mobilidade do processo de exportação e também para alimentar os novos vales de desenvolvimento. O conceito que temos trabalhado é territorializar essas ações, mas temos carência de estrutura de logística entre o centro de produção e o porto, e entre o centro de produção e a indústria, por isso esse debate é tão importante”.

Sustentabilidade

Os palestrantes do II Fórum de Inovação e Sustentabilidade na Mineração destacaram a importância de pensar os impactos econômicos, ambientais e sociais da mineração e lembraram que o desenvolvimento de uma cadeia de aproveitamento de resíduos vai gerar mais postos de trabalho e reduzir os impactos no meio ambiente. O pesquisador e diretor do Worldwatch Institute (WWI) no Brasil, Eduardo Athayde, revelou que a discussão já é uma realidade em diversos países.

“Não tem mais um tostão no mundo para investir fora da sustentabilidade. A mineração já adotou a visão ESG, que significa governança socioeconômica e ambiental. Quando é traduzida apenas para o socioambiental está errada, o econômico tem que estar embutido, senão derrubamos a sustentabilidade. Os capitais internacionais, que estão vindo para o Brasil em bolsas de valores e governanças de capital, estão exigindo a visão do social, do econômico e do ambiental”, declarou.

Ele frisou que a sustentabilidade precisa ser um comprometimento de todos e ela pode acontecer em pequenas ações no dia a dia. “A sustentabilidade não está nos fóruns da ONU, está dentro de casa, em cada peça de roupa que deixamos de usar e está parada há dois anos no guarda-roupa. Ali tem uma cadeia produtiva, foi usada água, energia, trabalho. Há impacto em tudo. Temos que entender que menos é mais”, avisou.

Já o representante da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), Jorge Fernando de Azevedo, destacou o comprometimento do setor com o futuro sustentável. “A partir da adoção de medidas visando o uso racional dos recursos materiais, há redução do consumo de água e energia e há redução de resíduos e de emissão de gases de efeito estufa”.

Na plateia, José Alberto Veloso, vice-prefeito de Jaguarari, cidade do Centro-Norte e área de extração de cobre, disse que o município assumiu um compromisso. “Estamos comprometidos com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU). No dia 29 deste mês, haverá um evento para marcar a adesão do município”.