Fotógrafo baiano Christian Cravo lança exposição sobre a tragédia de Mariana

Exposição estará em cartaz até 21 de outubro na Caixa Cultural, em Salvador

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  • Carmen Vasconcelos

Publicado em 15 de agosto de 2018 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Christian Cravo

Em 2015, um mês depois que a barragem de Fundão rompeu lançando um oceano de lama e minério sobre a cidade mineira de Mariana, o fotógrafo baiano Christian Cravo esteve na região. Indignado com o descaso dos poderes públicos e das organizações privadas, ele decidiu captar as imagens daquela dor, seguindo o curso da devastação.

Os registros dessa história que chocou o país e provocou um dos maiores desastres ambientais no Brasil podem ser conferidos na exposição Mariana, que prosseguirá em cartaz até 21 de outubro na Caixa Cultural. Retratos das memórias humanas da maior tragédia ambiental do país: o rompimento da barragem de Fundão (Foto: Christian Cravo) Nas ruinas das residências, devastadas em segundos pela onda de mais de 2,5 metros de lama e rejeitos de minério, Christian Cravo registrou durante três dias os vestígios das vidas varridas nos distritos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo. 

Objetos, roupas e calçados enlameados, retratos cobertos pelo barro e casas destroçadas foram os grandes personagens dessa narrativa dolorosa. Com 28 imagens repletas de lirismo e denúncia, a iniciativa é baseada no livro de mesmo nome, que reúne 33 imagens.

“Quando fui a Minas não tinha a pretensão de construir livro ou exposição. Tinha em mim uma revolta como cidadão. Vivi três dias intensos na região. Voltei e fui viver a vida. Três meses depois revirei o trabalho e, expostas na parede, percebi que aquelas imagens tinham um valor”, conta o fotógrafo, que faz questão de ressaltar uma formação onde a definição da imagem é obtida não no visor da câmara fotográfica, mas depois que a imagem é impressa no papel. Para essa exposição, Christian trabalhou com duas expressões distintas do restante da sua obra: a imagem em cores e com títulos.”Era necessário não comprometer o realismo  do momento”, complementa o fotógrafo.  Beleza na tragédia  Para ele, da mesma forma que aconteceu com Pompéia (cidade italiana destruída durante a grande erupção do vulcão Vesúvio, no ano 79, que ficou escondida por lama e cinzas por 1600 anos até ser reencontrada por acaso em 1748), a tragédia ficou registrada nas camadas de detritos que cobriram a vida cotidiano que ocorria ali. “Fiz questão de não tocar em nada, pois cada um daqueles objetos deixados para trás assumiram um caráter sagrado de testemunhas oculares”, diz Christian, ressaltando que cada uma das fotografias presta uma grande homenagem às vítimas. 

“Minas Gerais – assim como a Bahia – tem uma religiosidade concreta, então cuidei de alçar esses registros à altura de objeto sacro, como se fossem ex-votos. Tratei cada um daqueles objetos deixados para trás como relicários”, conta, destacando que tentou trazer para o trabalho uma memória iconográfica que o tempo congelou.

Segundo o próprio Christian, a única mudança realizada durante a captura das imagens foi numa santa que precisou ser melhor acomodada para ser iluminada pelo sol do dia. “São objetos que pararam naquele instante em que a lama chegou. O momento eterno que representa o fim daquela sociedade”, resume. Vale salientar que a exposição é inteiramente acessível para pessoas com deficiência visual, com textos e legendas em braile, além de disponibilização de audiodescrição das fotos expostas. A arte de Christian Cravo Christian Cravo soma 27 anos de carreira e é atualmente um dos nomes mais respeitados da fotografia nacional. Tem seu trabalho reconhecido internacionalmente, com exposições próprias em espaços consagrados em todo o mundo. Entre seus trabalhos estão os livros Irredentos (2000), Roma Noire, Ville Métisse (2005), Nos Jardins do Éden (2010), Exú Iluminado (2012), Christian Cravo (2014) e Mariana (2016).  Filho do também fotógrafo Mario Cravo Filho e neto do artista plástico Mario Cravo Neto, Christian já recebeu prêmio do Museu de Arte Moderna da Bahia, do Mother Jones International Fund for Documentary Photography e da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) pela melhor exposição fotográfica de 2015.