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Gerônimo, o timoneiro da Bahia afrodescendente

Claudefranklin Monteiro é historiador e professor da Universidade Federal de Sergipe

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  • Da Redação

Publicado em 9 de janeiro de 2018 às 03:00

 - Atualizado há um ano

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Pelourinho, Largo Pedro Arcanjo, dia 19 de dezembro de 2017. Nos fundos do palco, ele me aguardava para uma entrevista. Como um soldado, pronto para a batalha, estava ornado de forma magnânima, revestido de seu sincretismo religioso, sereno e esbanjando simpatia.

A minha geração cresceu ouvindo seus sucessos. A canção É D´Oxum (1986), por exemplo, era um convite para mergulhar nos mistérios da baianidade, que ele, Gerônino, representa tão bem em sua musicalidade, sua performance e em sua trajetória de vida.

Gerônimo Santana Duarte é natural de uma ilha soteropolitana: Bom Jesus dos Passos, onde viveu boa parte da infância até se mudar para a capital. Nasceu no dia 26 de junho de 1953 e recebeu influência musical de seu pai, com quem aprendeu a cultura afrodescendente, sobretudo a religiosidade.

Sua primeira experiência instrumental foi o trompete. Também foi bailarino e, no Trio Elétrico Armandinho, Dodô e Osmar, foi percussionista e conviveu com a família Macedo entre as décadas de 70 e 80. Essa convivência com seu Osmar e com os irmãos Macedo foi muito valiosa para ele.

Antes da carreira de cantor, teve alguns de seus trabalhos gravados por outras pessoas e bandas, a exemplo da canção Dentro da Minha Cabeça, que ficou famosa com A Cor do Som. Nos anos 80, com a axé music, estourou para o Brasil, a exemplo de seu parceiro, nos tempos de Rio de Janeiro, Luiz Caldas. Seu repertório mereceu o reconhecimento de grandes nomes, tais como Jorge Amado e Dorival Caymmi. Em relação a esse último, Jorge Portugal entende que Gerônimo é seu sucessor.

Em 2016, na Série Memórias do Brasil, Gerônimo foi tema. Em O Marujo do Tempo, ele abre seu coração para falar de suas origens familiares, de sua carreira e de suas composições. O documentário conta com a participação de Armandinho, Caetano Veloso, Luiz Caldas, Jorge Portugal, entre outros.

Em 2017, um de seus grandes sucessos completou 30 anos. A música Eu Sou Negão virou uma marca registrada não só para a música baiana, como para a música popular brasileira. Segundo Caetano Veloso: “(...) mudou o modo de ser da população soteropolitana. Aquilo foi, historicamente, tão marcante quanto os Filhos de Gandhy, de Gil, no mínimo”.

No Carnaval de Salvador, Eu Sou Negão, antes de ser um brado contra o trio elétrico, como pareceu frisar uma parte da letra, se transformou num marco para definir um espaço carnavalesco de afirmação identitária da música afrodescendente na Bahia.

Atualmente, Gerônimo se apresenta no Projeto O Pagador de Promessas. Um espetáculo que ele realiza às terças-feiras, à noite, quando canta vários hits de seu repertório e recebe convidados.

Claudefranklin Monteiro é historiador e professor da Universidade Federal de Sergipe