Gilmar Mendes proíbe investigação contra Glenn Greenwald

Na decisão, ministro cita o direito à liberdade de expressão e o sigilo constitucional da fonte jornalística

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  • Da Redação

Publicado em 8 de agosto de 2019 às 11:09

- Atualizado há um ano

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O ministro Gilmar Mendes concedeu, na noite dessa quarta-feira, 7, uma liminar (decisão provisória) para impedir que Glenn Greenwald seja investigado ou responsabilizado por receber, obter ou publicar informações.  O jornalista norte-americano é responsável pelo site The Intercept Brasil.

O pedido de liminar havia sido feito pelo partido Rede Sustentabilidade. Desde junho, o Intercept tem publicado mensagens trocadas por autoridades da República. Glenn afirma ter obtido o material de uma fonte anônima.

Na decisão, Gilmar escreveu ser “corolário imediato da liberdade de expressão o direito de obter, produzir e divulgar fatos e notícias por quaisquer meios. O sigilo constitucional da fonte jornalística (art. 5º, inciso XIV, da CF) impossibilita que o Estado utilize medidas coercivas para constranger a atuação profissional e devassar a forma de recepção e transmissão daquilo que é trazido a conhecimento público”.

Para o ministro, apesar de a Polícia Federal e outros órgãos não terem confirmado a existência de investigações contra o jornalista, “nenhum desses órgãos descartou a possibilidade futura de abertura”, motivo pelo qual resolveu conceder a liminar.

“A própria maneira escamoteada e automatizada como vêm se desenvolvendo atos inquisitivos sobre a movimentação financeira dos cidadãos confirma que a demora na concessão da tutela pleiteada nesta ação traduz-se em perigo de dano irreparável às garantias individuais do jornalista”, escreveu Gilmar Mendes.

Gilmar e Deltan Gilmar Mendes, que já havia chamado a Operação Lava Jato de "organização criminosa", em entrevista publicada no final de semana, foi alvo de investida dos procuradores. Uma reportagem publicada pelo El País, em parceria com o site The Intercept Brasil, nesta terça-feira (6), mostra que os procuradores da Lava Jato em Curitiba fizeram um esforço de coleta de dados e informações sobre o ministro do STF com o objetivo de pedir sua suspeição e até seu impeachment.

Liderados por Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa, procuradores e assistentes se mobilizaram para apurar decisões e acórdãos do magistrado para embasar sua ofensiva, mas foram ainda além. A reportagem, baseada em mensagens supostamente obtidas por hackers que invadiram o Telegram de procuradores, mostra que eles planejaram acionar investigadores na Suíça para tentar reunir munição contra o ministro, ainda que buscar apurar fatos ligados a um integrante da Corte superior extrapolasse suas competências constitucionais, de acordo com especialistas ouvidos pela reportagem.

Na guerra aberta contra o ministro do Supremo, os procuradores se mostraram particularmente animados em 19 de fevereiro deste ano. "Gente essa história do Gilmar hoje!! (...) "Justo hoje!!! (...) "Que Paulo Preto foi preso", começa Dallagnol no chat grupo Filhos do Januário 4, que reúne procuradores da força-tarefa.

Operador do PSDB A conversa se desenrola e se revela a ideia de rastrear um possível elo entre o magistrado e Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, preso em Curitiba num desdobramento da Lava Jato e apontado como operador financeiro do PSDB. Uma aposta era que Gilmar, que já havia concedido dois habeas corpus em favor de Preto, aparecesse como beneficiário de contas e cartões que o operador mantinha na Suíça, um material que já estava sob escrutínio dos investigadores do país europeu.“Vai que tem um para o Gilmar…hehehe”, diz o procurador Roberson Pozzobon no grupo, em referência aos cartões do investigado ligado aos tucanos.Segundo a reportagem, a possibilidade de apurar dados a respeito de um ministro sem querer é tratada com ironia. “vc estara investigando ministro do supremo, robinho.. nao pode”, responde o procurador Athayde Ribeiro da Costa. “Ahhhaha”, escreve Pozzobon. “Não que estejamos procurando”, ironiza ele. “Mas vaaaai que”.

Dallagnol então reforça, na sequência, que o pedido à Suíça deveria ter um enfoque mais específico: “hummm acho que vale falar com os suíços sobre estratégia e eventualmente aditar pra pedir esse cartão em específico e outros vinculados à mesma conta”, escreve. “Talvez vejam lá como algo separado da conta e por isso não veio" (...) "Afinal diz respeito a OUTRA pessoa”.

Forças-tarefas negam A força-tarefa de Curitiba tem reafirmado que não reconhece as mensagens que têm sido atribuídas a seus integrantes e repetiu à reportagem do El País que o "material é oriundo de crime cibernético e tem sido usado, editado ou fora de contexto, para embasar acusações e distorções que não correspondem à realidade".

Nas mensagens, tudo começa porque Dallagnol comenta saber de "um boato" vindo da força-tarefa  de São Paulo (FT-SP) de que parte do dinheiro mantido por Paulo Preto em contas no exterior pertenceria a Mendes. "Mas esse boato existe mesmo?", pergunta o procurador Costa. "Pessoal da FT-SP disse que essa info chegou a eles", responde Julio Noronha em referência aos colegas paulistas.

Procurada, a assessoria de imprensa do FT-SP afirmou que “jamais recebeu qualquer informação sobre suposto envolvimento de Gilmar Mendes com as contas no exterior de Paulo Vieira de Souza”. E também que “se recebesse uma informação a respeito de ministro do STF, essa informação seria encaminhada à PGR [Procuradoria Geral da República]". E que “jamais passaria pela primeira instância para depois ir para a PGR”.